Sites de e-commerce são "verdadeiros camelódromos", diz Fernando Capez
Ex-diretor do Procon-SP travou uma guerra contra Shopee por causa de pirataria
Emanuelle Menezes
A discussão sobre a legalidade do comércio em plataformas online -- que tomou conta das redes sociais essa semana, com o anúncio do Ministério da Fazenda de acabar com a isenção de impostos das remessas internacionais de pessoa física com valor inferior a US$ 50 -- não começou hoje.
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Fernando Capez, que foi diretor-executivo do Procon de São Paulo por dois anos (2019-2021), travou uma guerra contra a Shopee, neste período, devido à venda de produtos falsificados. Em entrevista ao SBT News, Capez afirmou que essas plataformas, muitas vezes, são "verdadeiros camelódromos online".
"O Procon já viu plataformas digitais vendendo produtos falsificados, produtos sem nota fiscal, ganhando percentual sobre essa venda e dizendo que não tem nenhuma responsabilidade, sequer pelo atraso na entrega do produto", afirmou ele.
A Shopee chegou a ser multada em mais de R$ 10 milhões, em 2021, pelo órgão de Proteção e Defesa do Consumidor, por oferecer produtos sem nota fiscal. Em dezembro do mesmo ano, a e-commerce de Singapura firmou um termo de compromisso com o Procon-SP, para assegurar os direitos dos consumidores que utilizassem os serviços da plataforma de compras.
"O Procon-SP não vai admitir que nenhuma plataforma digital venha ao nosso país e desrespeite as regras. Já firmamos termos de acordo com a Shopee, Mercado Livre e Facily e as demais plataformas também estão convidadas a assinar", disse Capez na época.
Entre os problemas destacados pelo ex-diretor do órgão, em entrevista para o SBT News, está justamente o uso irregular da isenção de impostos para pessoas físicas, em compras de até US$ 50 (cerca de R$ 250 na cotação atual do dólar).
"Há pessoas físicas que anunciam, às vezes, 15 mil produtos para serem vendidos, por intermédio da plataforma digital, e vendem como se fosse um particular vendendo para o outro. Ora, claramente é uma empresa praticando atividade mercantil", argumenta Capez.
Para ele, as plataformas devem ser responsabilizadas, assim como os anunciantes, "inclusive pelo recolhimento de tributos quando ocorre uma operação tipicamente mercantil, uma venda de uma empresa disfarçada de pessoa física".
Capez explica que, pelo Código de Defesa do Consumidor, elas são consideradas responsáveis solidárias por qualquer irregularidade cometida no ato da venda.
Concorrência desleal
Em entrevista a jornalistas que acompanham o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e sua comitiva na viagem que faz à China, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que algumas empresas internacionais de comércio online praticam concorrência desleal com os empresários brasileiros.
"É preciso que tenhamos como garantir igualdade de concorrência entre empresários brasileiros e estrangeiros, ela não pode ser desleal, beneficiando um em detrimento do outro. Isso não é bom para nossa economia", destacou Haddad.
André Felix, doutor e mestre em Direito Tributário pela PUC-SP e membro da Comissão de Direito Tributário e Constitucional da OAB-SP, concorda que o uso irregular da isenção do imposto de importação gera concorrência desleal com os comerciantes brasileiros.
Isso porque, segundo ele, "independente do preço da venda da mercadoria aqui no Brasil, os comerciantes brasileiros têm que arcar com ICMS, PIS e COFINS [impostos], enquanto o produto importado advindo das plataformas de compra online do exterior não pagam tributos nenhum sobre a venda para o Brasil".
Quais são as mudanças previstas pelo Ministério da Fazenda?
De acordo com o Ministério da Fazenda, empresas de e-commerce estariam fracionando as compras e se fazendo passar por pessoas físicas, para usar de forma irregular o benefício da isenção de imposto para remessas internacionais de até US$ 50 -- praticado quando uma entrega é feita por uma pessoa física com o destinatário sendo, também, uma pessoa física.
A ideia da pasta é editar uma medida provisória que, entre outras coisas, acabe com essa isenção. O imposto para qualquer item vindo do exterior, de qualquer valor, passaria a ser de 60%.
O exportador teria que prestar uma declaração antecipada com dados dele, do comprador e do produto, para que esse imposto seja calculado. Segundo o Ministério da Fazenda, isso agilizaria a entrega das compras, já que os produtos seriam liberados de forma mais rápida pela alfândega.
O Ministério da Fazenda e a Receita Federal não deixou claro, ainda, como o pagamento desse imposto ocorrerá. Não se sabe se o valor será embutido no preço da mercadoria ou se o pagamento será feito a parte.
Felix destaca que as plataformas são responsáveis pelo recolhimento do imposto de importação até a entrada do produto no Brasil. "Se a plataforma estrangeira não recolher o imposto, o adquirente brasileiro tem 90 dias para pagar o imposto de importação, sob pena de abandono da mercadoria importada", diz ele.
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