De volta ao Brasil: o recomeço de repatriados após a saída da Ucrânia
"Ouvimos som de sirene e avião, já no Brasil, e entramos em pânico", diz brasileiro que deixou Ucrânia
Mariana Alonso
Se livrar do sentimento de desespero é uma tarefa desafiadora para muitos brasileiros que estavam na Ucrânia nas últimas semanas. Já no Brasil, alguns relataram que ainda revivem sensações de pânico mesmo longe dos bombardeios. É o que conta Gilmar Tadeu da Silva, técnico de futebol que morou no leste europeu por 12 anos e, nesta 5ª feira (10 mar.), chegou à Brasília, juntamente à esposa ucraniana e ao filho Efraim (5 anos) em um voo da Força Aérea Brasileira (FAB) com 68 pessoas que vivenciaram a guerra de perto. Barulhos que antes do conflito não causavam medo, hoje, são torturantes para Gilmar.
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"Assim que ouvimos uma sirene, mesmo já estando no Brasil, meu filho começou a gritar: 'emergência, emergência' e precisei acalmá-lo, apesar de também estar assustado", relembra. "Ainda estamos processando todas as imagens que vimos, todas as sensações que tivemos, porque isso leva tempo. Ficamos 21 horas viajando de trem até conseguir sair da fronteira e presenciamos muitas cenas tristes, que nos causaram traumas e cicatrizes", desabafou.
Gilmar recorda que assim que pisou em solo brasileiro foi recebido com um prato que, para ele, foi como um "abraço". "Uma amiga fez um jantar que mais parecia um baquete, pois tinha arroz e feijão, que é tudo o que mais gosto", diz o técnico, que está hospedado na casa da mãe, em São Paulo. O filho de Gilmar nunca tinha vindo ao país e estava ansioso para provar as frutas daqui. "Ele comeu goiaba pela primeira vez e achou o máximo", se alegra o técnico. Ele e a esposa não sabem ainda quanto tempo vão permanecer no país, mas acreditam que o retorno à Ucrânia vai demorar para acontecer. "Infelizmente, essa guerra ainda deve durar mais tempo. Eu quero trabalhar como técnico de futebol. É uma área que nos surpreende quanto ao destino, pois posso atuar em qualquer estado, em qualquer país. Por isso, não consigo afirmar onde estarei no próximo mês", comenta.
Na Ucrânia, Gilmar dividia a casa com os sogros, que optaram por ficar e esperar pelo fim da guerra. "Conversei com meu sogro por telefone e ele disse que estava bem, assim como eu costumava falar para os meus parentes do Brasil, mas depois eu desligava o telefone, fechava a porta e dobrava os joelhos em oração", recorda o brasileiro. Quando o técnico, a esposa e o filho saíram rumo à fronteira com a Polônia, levaram apenas uma mala cada um e o desejo imenso de não ver mais as cenas que tiraram o sossego por tantos dias. "A viagem para o Brasil foi desgastante, mas também um grande alívio", relata.
Efraim não fala português, mas essa não foi uma barreira para se comunicar com os familiares e especialmente com o primo, da mesma faixa etária. "Eles se entendem mesmo sem falar uma palavra. As crianças se adaptam muito rápido", se emociona o técnico. Neste fim de semana, a programação será focada na família. Gilmar tem outros três filhos, que são do primeiro casamento, e que não conheciam pessoalmente o irmão caçula. "Quero promover esse encontro do Efraim com os irmãos e desfrutar de passeios que lá não tínhamos oportunidade de fazer", finaliza.