Fidelidade, federações e fundão: entenda mudanças nas eleições de 2022
Especialistas explicam alterações aprovadas no Congresso e analisam cenários para a disputa presidencial
Camila Stucaluc
A pouco menos de um ano para as eleições de 2022, os partidos já se movimentam e estudam estratégias para as futuras campanhas. Toda essa movimentação, contudo, precisará levar em conta as novas regras eleitorais promulgadas pelo Congresso Nacional no fim de setembro e que, portanto, serão aplicadas no próximo pleito.
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Uma das grandes novidades é a possibilidade das federações partidárias. Por meio do mecanismo, os partidos poderão se unir como uma só legenda para concorrer à disputa eleitoral, devendo permanecer com a colaboração ativa pelo período mínimo de quatro anos. As siglas que integram o grupo mantêm identidade e autonomia, mas aquele que for eleito deve respeitar a fidelidade ao estatuto da federação.
Para o cientista político e consultor de relações governamentais Lucas Fernandes, essa manutenção pode ser positiva para o governo. "Ainda é cedo para avaliar, mas já dá para afirmar que as federações são instrumentos melhores que as coligações, pois elas não têm a finalidade exclusiva do período eleitoral e são nacionalizadas", explica. "Isso é muito positivo e pode fortalecer o papel dos partidos políticos e trazer uma previsibilidade maior para o eleitor. No longo prazo, se as normas forem mantidas, podemos esperar uma menor fragmentação no Congresso, o que é muito positivo do ponto de vista da governabilidade", completa.
A emenda constitucional também incluiu a previsão para a realização de consultas populares sobre questões locais junto às eleições municipais -- os plebiscitos. Segundo o texto, essas consultas deverão ser aprovadas pelas câmaras municipais e encaminhadas à Justiça Eleitoral em até 90 dias antes da data das eleições. A norma estipula ainda que os candidatos não poderão se manifestar sobre as questões durante propagandas gratuitas no rádio ou na televisão.
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A fidelidade partidária também foi alterada. Agora, os parlamentares que ocupam cargos de deputado federal, estadual e distrital ou de vereador poderão deixar o partido pelo qual foram eleitos sem perder o mandato, caso recebam o aval da legenda. O texto permite ainda que partidos que incorporem outras siglas não sejam responsabilizados pelas punições aplicadas aos órgãos partidários regionais e municipais incorporados e aos antigos dirigentes do partido incorporado, inclusive as relativas à prestação de contas.
Outro ponto importante da emenda é a contagem em dobro de votos dados a mulheres e pessoas negras na Câmara dos Deputados, para fins de distribuição dos recursos públicos -- fundo eleitoral. "Esse ponto pode acabar com aquele fenômeno muito triste que vimos nas eleições passadas de candidaturas fantasmas ou laranjas, que serviam apenas para arrecadar verbas", avalia Fernandes. "Agora, os partidos terão um incentivo real não só para lançar candidaturas femininas e de pessoas negras, mas para investir nessas candidaturas e fazer com que a gente tenha uma base mais diversa."
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Além das mudanças já estabelecidas, Fernandes chama a atenção para um elemento que ainda deve ser analisado pelos parlamentares: as fake news: "Mesmo sendo regras mais genéricas, as mudanças na maneira de fiscalização e punição de fake news podem ter um impacto eleitoral muito grande, e a tendência é que a gente veja o congresso discutindo esse tema nos próximos meses".
Expectativas pré-eleitorais: Presidência
O quadro pré-eleitoral no Brasil vem se mostrando polarizado no quesito presidencial. Segundo pesquisa quantitativa de outubro realizada pelas empresas Genial Investimentos e Quaest, o ex-presidente Lula (PT) tem 55% das intenções de voto, enquanto o atual presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem 22%.
"Se nós considerarmos esses números, estamos falando de quase 80% das intenções de votos já fechadas com apenas duas candidaturas", analisa o cientista político e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Geraldo Tadeu. "Isso deixa uma margem de cerca de 20% de votos livres. Considerando ainda os votos brancos e nulos, estamos falando de um índice de 10% a 12% de votos disponíveis."
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No entanto, segundo Tadeu, há um número crescente de eleitores que não pretendem votar em nenhum dos dois candidatos, o que pode ser um indicativo de que há uma busca do eleitorado por uma terceira via. "Hoje, essa possível terceira via está dividida, fundamentalmente, entre as candidaturas de Ciro Gomes (PDT) e Sérgio Moro (possível filiado do Podemos)", diz Tadeu. "Há também a possibilidade do Datena (pré-candidato pelo PSL) como opção de terceira via, mas ainda há uma insegurança quanto à campanha ou candidatura dele", acrescenta.
Assim como Tadeu, Fernandes também vê essa polarização de tendência de votos, mas avalia que a estimativa pode mudar ao longo do período eleitoral. "O Bolsonaro chega às eleições muito fragilizado, com uma alta rejeição e uma tendência muito grande de perder para qualquer outro candidato que concorra com ele no segundo turno", pontua.
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Ao mesmo tempo, "o Lula pode ter uma diminuição na estimativa que aparece hoje nas pesquisas, já que o sentimento antipetista está, de certa forma, adormecido na população", afirma Fernandes. "Quando tivermos campanhas, talvez com os candidatos colocando imagens do Lula sendo preso, sobre os escândalos do Mensalão, Petrolão, é possível que esse sentimento antipetista seja meio que ativado e que o ex-presidente não consiga manter o mesmo patamar de votos que ele tem hoje em dia", completa.
Para os especialistas, o cenário da disputa presidencial se mostra incerto, uma vez que os partidos ainda estão começando suas movimentação para se posicionar para o pleito. O primeiro turno das votações ocorre em 2 de outubro de 2022, enquanto o segundo turno será realizado no dia 30 do mesmo mês.