Inteligência artificial: Congresso brasileiro estuda lei contra deepfake eleitoral
Para presidente da Comissão de Ciência da Câmara, Luísa Canziani, a regulação da inteligência artificial é um tema fundamental para a discussão neste semestre
Em meio a um cenário em que o uso da inteligência artificial (IA) vem ficando cada vez mais frequente e abrangente no Brasil e no mundo, o Congresso Nacional se prepara para votar regras para essa tecnologia, com o objetivo de evitar malefícios à sociedade - como notícias falsas mais sofisticadas.
No território brasileiro, a preocupação com o uso da IA ganha força ainda por causa da proximidade das eleições municipais, neste ano, período em que aumenta a produção e circulação de fake news.
Para a presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação da Câmara dos Deputados, Luísa Canziani (PSD-PR), a regulação da IA é um tema fundamental para a discussão neste semestre no Congresso.
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"A gente precisa de alguma forma garantir que o uso e aplicação da inteligência artificial preservem a integridade física e moral dos nossos cidadãos, mas de outro lado não podemos inibir o desenvolvimento da tecnologia relacionada à inteligência artificial, até porque nós somos um país em desenvolvimento e precisamos mais do que nunca de inovação para prosperar", acrescentou a parlamentar, em entrevista ao SBT News.
Segundo ela, é por isso que esse é um tema "sensível, importante". "Nós estaremos passando também por eleições municipais, e a gente acompanha, em eleições espalhadas pelo mundo, casos maléficos em relação ao uso da inteligência artificial para fins eleitorais".
Dessa forma, ressaltou, a comissão, a Câmara e o Congresso Nacional vão se debruçar, nos próximos meses, sobre as questões relacionadas à regulação da IA.
Um uso eleitoral da tecnologia ocorreu recentemente na Indonésia. Morto há 16 anos, Hadji Mohamed Suharto, o ditador mais brutal do país, que o governou por 32 anos, "ressuscitou" em uma campanha eleitoral pedindo votos para os eleitores, por meio de um vídeo deepfake. As eleições para presidente na Indonésia serão nesta quarta-feira (14).
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Casos -- bons ou ruins -- envolvendo o uso da IA já são registrados em vários países. Uma empresa multinacional, por exemplo, perdeu US$ 25,6 milhões (o equivalente a R$ 127 milhões) após funcionários de sua filial em Hong Kong serem enganados por tecnologia deepfake, com um incidente envolvendo uma versão recriada digitalmente de seu diretor financeiro, e ordenando transferências de dinheiro durante uma reunião de videoconferência. A cantora americana Taylor Swift, por sua vez, foi vítima de falsos "nudes" criados pela tecnologia.
Os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já disseram publicamente que a regulamentação da inteligência artificial é uma das prioridades do Congresso neste ano.
Segundo Luísa Canziani, existem mais de 90 projetos em relação à IA tramitando. "A nossa ideia é no sentido de fazermos uma união de esforços entre as duas Casas", pontuou. O esforço do momento é elaborar um projeto específico e um rito de tramitação acelerado.
"Até porque se formos de algum lado aprovar um projeto relacionado à inteligência artificial para fins eleitorais, esse projeto precisa ser aprovado logo, pois as eleições municipais já estão chegando. É um ano que obviamente passa muito rápido e, mais do que nunca, nós enquanto legisladores precisaremos estar atentos para essa questão e, portanto, alinhar o entendimento entre as duas Casas".
Em 2021, a Câmara aprovou um Projeto de Lei (PL) do Marco Legal da Inteligência Artificial. O substitutivo elaborado pela relatora, deputada Luísa Canziani, recebeu 413 votos a favor e 15 contrários. Atualmente, o PL está na Comissão Temporária Interna sobre Inteligência Artificial no Brasil, do Senado, aguardando parecer do relator (senador Eduardo Gomes, do PL do Tocantins) e tramitando em conjunto com outras matérias - incluindo um Projeto de Lei apresentado por Rodrigo Pacheco no ano passado e que também institui um Marco Legal para o uso da IA no Brasil.
Redes sociais
Uma possível regulação das redes sociais no país é outro tema do campo da tecnologia que ganha força no Congresso e na sociedade com a proximidade das eleições municipais, tendo em vista que são o principal meio para a disseminação de notícias falsas. No início de janeiro, o Tribunal Superior Eleitoral divulgou rascunhos de regras para uso de inteligência artificial e redes sociais nas eleições.
Luísa Canziani acredita que o tema da regulação das redes deve caminhar com o da regulação da IA.
"É importante que o Congresso, de alguma forma, coloque como prioridade e discussão a questão da inovação, da tecnologia. Porque cada vez mais a nossa vida, o nosso cotidiano, as nossas relações de trabalho, nós seremos alimentados, portanto, por meio de dados. Então é muito importante que essa discussão acerca das plataformas, da tecnologia, esteja presente aqui na nossa discussão legislativa, inclusive como forma de implementação das políticas públicas", acrescentou.
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Para a parlamentar, é preciso cada vez mais unificar a discussão sobre educação com a de ciência, tecnologia e inovação. "A gente precisa preparar os nossos jovens, nós precisamos letrar digitalmente os nossos jovens. Até porque eles precisam cada vez mais se adequar às competências e habilidades tão necessárias para esse mundo inovador".
Graças a uma lei aprovada no Congresso e sancionada, no início de 2023, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o país já possui uma Política Nacional de Educação Digital, ressaltou a deputada.
Em relação especificamente à regulação das redes sociais, há ao menos um Projeto de Lei sobre o tema pronto para ser votado no plenário da Câmara: o chamado PL das Fake News. A Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação da Casa, segundo Luísa, acompanhou a discussão do texto "com muita preocupação".
"Porque de fato foi uma discussão contaminada por muitos fatores e, na verdade, quando a gente fala de regulação das plataformas, a gente precisa ter uma série de cuidados para que a gente possa, sim, assegurar a integridade física e moral das nossas crianças, adolescentes, das mulheres. Enfim, de todos nós que fazemos o uso delas, mas, ao mesmo tempo, também não podemos de alguma forma inibir a liberdade de expressão".
Este, pontua a parlamentar, é um valor muito caro para a população, da democracia brasileira. "É uma discussão sensível que precisa de diálogo, que precisa de debate, que precisa, inclusive, de experiências internacionais. A gente precisa se debruçar no que outros países estão fazendo. União Europeia, Estados Unidos. Nós precisamos buscar as melhores experiências internacionais regulatórias também para poder aprovar um modelo adequado e que, de alguma forma, suprirá as nossas necessidades regulatórias enquanto país".