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Saúde

Saudade que cura: como memórias afetivas podem ajudar a aliviar a depressão?

Sentimento pode ser caminho de cura e resgate emocional, revelam estudos e reflexões da psicologia; entenda

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Saudade pode ser um caminho de cura e resgate emocional | Freepik
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Quando pensei em escrever sobre este importante tema, veio à mente como se formam em nosso mundo interno (aparelho psicológico) as nossas mais antigas relações afetivas — boas ou não — que serão determinantes de muitos de nossos problemas e dificuldades nos vínculos afetivos que vamos desenvolver.

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Ou seja, os nossos amores serão determinados por muito do que ocorreu nesses primórdios do desenvolvimento da criança. E isso nos capacita a novas possibilidades de nos relacionarmos e aprendermos a gostar de outras pessoas, pois houve uma matriz no cérebro e nas emoções dessa criança que poderá e desejará repetir experiências de calor, cuidado e prazer.

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Quando o bebê nasce, ele está completamente desprotegido e não sobreviveria sem os cuidados maternos ou de alguém que se encarregasse de nutri-lo, aquecê-lo e atender às suas necessidades nos momentos de desconforto, solidão e angústia.

O grande pediatra e, posteriormente, psicanalista, Donald Winnicott, chamou isso de “holding” — a capacidade da mãe de conter as aflições do bebê, dando um sentido e um formato a esses momentos. Mesmo quando tudo ocorre da melhor forma possível, falhas nesse processo podem levar a problemas no desenvolvimento emocional.

O luto, a melancolia e a saudade

A criança passa a criar um apego necessário e se desenvolve em um mundo de afetos e privações, aprendendo a lidar com frustrações e perdas. Na vida adulta, as pessoas que foram importantes em sua construção psíquica permanecem como vivências — boas ou difíceis — que fazem parte de sua história. Essas lembranças ajudam no resgate e na elaboração do luto e também a entender o significado da saudade, compreendida como a presença de uma falta.

Freud dizia que existe uma grande diferença entre luto e melancolia. O luto seria a capacidade de internalizarmos e guardarmos o que de bom tivemos com aquela pessoa que partiu (morreu ou viajou). A pessoa em luto vive um tempo de grande tristeza, mas que pode ser pensada e elaborada com a recuperação das memórias da pessoa amada, com tudo de bom que se aprendeu com ela. Embora exista dor, há também a possibilidade de impulso para retomar a vida e reencontrar a alegria.

Na melancolia, ou luto patológico, há uma dificuldade de se desapegar de quem partiu. Existe uma identificação tão intensa com essa pessoa que se foi (ou com quem houve um rompimento) que é como se o enlutado perdesse também parte de si. Nesses casos, é necessário um longo trabalho terapêutico e, muitas vezes, acompanhamento psiquiátrico. Aspectos como culpa, raiva e negação precisam ser acolhidos e ressignificados para que essa melancolia possa ser transformada em um luto saudável.

A saudade como ponte de pertencimento

A saudade nem sempre tem a ver com a perda de alguém. Podemos sentir saudade de um país, da nossa infância, de um doce feito pela avó, das festas do passado, das lembranças cheias de cor e afeto. Amigos distantes continuam a fazer parte do nosso repertório emocional, e as lembranças nos conectam com um tempo, um lugar, uma comunidade.

As memórias que surgem nos trabalhos terapêuticos ajudam a ressignificar experiências e dar forma ao que o tempo distorceu. Os amores vividos, as histórias contadas por nossos pais e avós, com seus cheiros, cores e lugares, talvez sejam exatamente o que mais precisamos para manter a saúde emocional.

Talvez seja preciso reaprender a sentir saudades — a recordar e elaborar nossas lembranças como parte fundamental da nossa saúde mental, psíquica, social e emocional.

*Dorli Kamkhagi é doutora em psicologia clínica, mestre em Gerontologia e colaboradora do IPqFMUSP credenciada pelo CRP 15511

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