Como um rim de porco pode ser transplantado para uma pessoa? Entenda
Conhecido como xenotransplante, procedimento envolvendo um paciente vivo foi realizado pela primeira vez e já chegou a ser proibido pela OMS
Como é possível um rim de porco ser utilizado em uma pessoa? Pela primeira vez na história um transplante envolvendo o órgão foi realizado para um paciente vivo. A cirurgia foi comandada pelo cirurgião brasileiro Leonardo Riella, no General Hospital (MGH), em Boston, nos Estados Unidos, no último sábado (16).
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Conhecido como xenotransplante, o procedimento consiste em transplantar órgãos ou células de uma espécie diferente da humana para humanos. Para o órgão ser transplantando precisa ser geneticamente modificado. Nesse caso, os rins estão sendo avaliados para tentar amenizar a significativa escassez de órgãos humanos disponíveis para transplante renal.
De acordo com a Rede Unida para Compartilhamento de Órgãos (UNOS), mais de 100 mil pessoas nos EUA aguardam um órgão para transplante e 17 pessoas morrem todos os dias à espera de um órgão. No Brasil, a lista de espera por um rim é a maior do país, segundo Ministério da Saúde, com quase 40 mil pessoas.
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Em 2008, o xenotransplante chegou a ser proibido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), até ser provado que a transmissão do citomegalovírus, presente em porcos, não é transmitido aos humanos.
Quem é o paciente que recebeu o órgão?
Identificado como Richard Slayman, de 62 anos, o paciente desenvolveu insuficiência renal devido a diabetes tipo 2 e hipertensão. Ele já havia recebido o órgão de um paciente falecido, em dezembro de 2018, mas o rim apresentou falhas cinco anos depois. Segundo o hospital, Slayman está se recuperando bem e deve receber alta em breve.
Como funciona o xenotransplante?
Porcos geneticamente modificados foram desenvolvidos para aumentar sua compatibilidade com os humanos. Os porcos destinados a doadores de órgãos para humanos são criados isoladamente, sob condições especiais, para evitar que sejam expostos a infecções que possam prejudicar o receptor humano dos órgãos desse porco. Esses porcos especiais têm órgãos de tamanho e função semelhantes aos órgãos humanos. As modificações genéticas destes porcos também os tornaram mais compatíveis com os humanos.
Como será definido o sucesso deste transplante?
O sucesso será definido pela ausência de necessidade de diálise para o paciente, que terá sua função renal monitorada por meio de exames de sangue e urina, além de exames físicos regulares.
Qual é o risco de rejeição?
A rejeição é sempre uma possibilidade em qualquer transplante de órgão, pois o sistema imunológico é capaz de reconhecer o órgão como uma ameaça. Como esta é a primeira vez que um xeno-rim é transplantado em humanos, não se sabe ainda qual é o risco de rejeição, mas espera-se que com o uso de uma combinação de medicamentos para enfraquecer o sistema imunológico, o risco seja significativamente reduzido.
Existem incompatibilidades entre o corpo humano e o rim do porco?
Sim. O porco normal da 'fazenda' carrega algumas incompatibilidades que o impedem de funcionar normalmente no corpo humano. No entanto, os recentes avanços da engenharia genética ajudaram os cientistas a tornar os órgãos dos porcos mais “compatíveis” com os seres humanos.
Em termos de função renal, o rim de porco geneticamente modificado é capaz de realizar todas as funções essenciais de um rim humano normal, como manter o equilíbrio hídrico e mineral e excretar resíduos. Além disso, outras modificações genéticas nos porcos especiais foram feitas para minimizar o risco de coagulação sanguínea inadequada no rim do porco e para diminuir a inflamação no rim do porco.
É possível que os pacientes que recebem um xeno-rim sejam obrigados a tomar um hormônio chamado eritropoietina para apoiar a produção de glóbulos vermelhos e prevenir a anemia.
Qual é o risco de infecção para o paciente após o xenotransplante?
As infecções são comuns após o transplante devido à necessidade de medicamentos anti-rejeição que enfraquecem todo o sistema imunológico. Este risco aumenta em todos os pacientes transplantados, independentemente da origem do órgão doador (humano ou suíno).
O procedimento já pode ser feito em qualquer paciente?
Não. O procedimento foi realizado sob um único Protocolo de Acesso Expandido (EAP) – conhecido como uso compassivo – da Food and Drug Administration (FDA), agência federal dos EUA equivalente a Anvisa, concedido a um único paciente ou grupo de pacientes com doenças ou condições graves e potencialmente fatais para obter acesso a tratamentos experimentais ou ensaios quando não houver tratamento comparável, ou quando não existir outras opções ou terapias.
Não há uma pesquisa parecida sendo desenvolvida no Brasil.