Governo acredita que, mesmo sem solução imediata, decreto deve inibir violência policial
Ação da PRF contra pai e filha no Rio descumpriu decreto de Lula publicado no dia anterior. Policiais foram afastados
Leonardo Cavalcanti
Depois da ação de policiais rodoviários federais contra pai e filha - ela, Juliana Rangel, baleada na cabeça -, o governo Lula insiste na defesa a publicação de um decreto para regular a força de agentes de segurança. O documento foi publicado um dia antes da operação da PRF na Rodovia Washington Luís (BR-040), em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.
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O decreto nº 12.341 é criticado por especialistas ouvidos pelo SBT News por não avançar no combate à cultura violenta de policiais, como no caso da ação contra o carro da família de Juliana, 26 anos, que está internada em estado grave. O veículo foi alvejado por agentes da PRF, que feriram o pai da jovem, Alexandre Rangel, na mão. Para integrantes do Ministério da Justiça, porém, o documento tem pontos positivos.
O documento foi elaborado para tentar regular o uso da força policial e estabelece que a arma de fogo de um policial só poderá ser usada como último recurso. E não deverá ser utilizada contra pessoas desarmadas, em fuga ou um veículo que desrespeite o bloqueio.
O decreto está em vigor desde a segunda-feira (23), mas ainda precisa de normas complementares a serem editadas pelo Ministério da Justiça.
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A intenção é que, portarias internas estabeleçam critérios mais claros para punir policiais. “Não existe uma norma específica, hoje é tudo baseado na doutrina do bom senso”, disse um integrante da pasta ao SBT News.
A expectativa é que, com uma melhor definição de responsabilidades, as chances de impunidade possam diminuir. O governo acredita que o afatastamento imediato dos policiais envolvidos no caso é uma resposta inicial.
O decreto define responsabilidade para cada um dos órgão de segurança federal, com a PRF, a Polícia Federal, a Força Nacional, além de vincular repasses de recursos para adoção das medidas pelas policias militares, civis e guardas municipais.
O documento proíbe uso de arma contra pessoas desarmadas ou contra veículos. Em nota, a polícia diz lamentar episódio. Uma apuração interna foi aberta.
A ação violenta de polícias rodoviárias federais na noite de Natal (24) baleou na cabeça Juliana. Ela e família estavam a caminho de uma festa de Natal na casa de parentes em Itaipu, em Niterói. Segundo as primeiras informações, Alexandre Rangel, pai de Juliana, diminuiu a velocidade do carro e ligou o seta ao ouvir a sirene da viatura. Os agentes da PRF, entretanto, teriam saído do veículo atirando.
O artigo 1º do decreto disciplina o uso da força policial com vistas a promover o respeito aos direitos humanos, considerando eficiência e transparência. Na sequência, o artigo 2º estabelece que os princípios para o uso da força devem levar em conta a legalidade, a proporcionalidade do ato, a razoabilidade, a não discriminação e a responsabilização.
No mesmo artigo, o parágrafo único detalha que as operações devem ser planejadas para estabelecer limites de gravidade para qualquer dano direto ou indireto que possa ser causado a quaisquer pessoas. "O nível da força utilizado deve ser compatível com a gravidade da ameaça apresentada pela conduta das pessoas envolvidas e os objetivos legítimos da ação do profissional de segurança pública."
O texto estabelece que a força policial deve ser "empregada com bom senso, prudência e equilíbrio, de acordo com as circunstâncias do caso concreto, com vistas a atingir um objetivo legítimo da aplicação da lei". Além disso diz que os órgãos e os profissionais de segurança pública devem assumir a responsabilidade pelo uso inadequado da força, após a conclusão de processo de investigação, respeitado o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório.
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O decreto também estabelece que os policiais devem atuar de forma não discriminatória, sem preconceitos de raça, etnia, cor, gênero, orientação sexual, idioma, religião, nacionalidade, origem social, deficiência, situação econômica, opinião política ou de outra natureza.
O artigo 3º por sua vez determina que o "emprego de arma de fogo será medida de último recurso". E estabelece como ilegítimo o uso de arma de fogo contra: "I - pessoa em fuga que esteja desarmada ou que não represente risco imediato de morte ou de lesão aos profissionais de segurança pública ou a terceiros; e II - veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, exceto quando o ato represente risco de morte ou lesão aos profissionais de segurança pública ou a terceiros".
Por fim, o decreto do governo federal diz que "sempre que o uso da força resultar em ferimento ou morte, deverá ser elaborado relatório circunstanciado, segundo os parâmetros estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública".