Expulsão de embaixador do Brasil na Nicarágua deve acontecer "em breve", mas não foi formalizada
O governo de Daniel Ortega, no poder desde 2007, enviou uma "sinalização" "cogitando" a expulsão do diplomata brasileiro no país; Itamaraty aguarda
O governo da Nicarágua, comandado pelo presidente Daniel Ortega desde 2007, teria "sinalizado" a expulsão do embaixador brasileiro no país, Breno Souza da Costa. Segundo o portal centro-americano Divergentes, a primeira-dama Rosario Murillo também tem forte participação na política e teria se ressentido da falta do diplomata brasileiro no 45º aniversário da Revolução Sandinista, comemorado em 19 de julho, em praça pública de Manágua. Fontes ouvidas pelo SBT News confirmaram a versão do ressentimento, mas não de que ele teria vindo de Murillo. Como consequência, o governo nicaraguense teria dado prazo de 15 dias para o embaixador deixar o país.
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Na apuração da reportagem, as Relações Exteriores vêm a ação como desnecessária, que esta "não é a melhor forma de lidar com a questão". Entretanto, ao que tudo indica, o congelamento da relações ainda "não foi formalizado", mas deve acontecer "em breve". "Deram a ele 15 dias para partir. Brasília quer evitar escândalo e afastá-los. Mas quando um embaixador é retirado, levam dois meses para sair. É preciso fazer uma licitação para conseguir uma empresa de mudanças e uma montanha de coisas", teria dito uma fonte diplomática ao jornalista local.
O que aconteceu?
- Nem o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nem o governo da Nicarágua oficializaram a expulsão;
- A reportagem entrou em contato com o Itamaraty, mas a pasta deve se pronunciar apenas quando for formalizado o pedido. Não obteve nenhuma resposta até o momento. O espaço segue aberto e a nota será atualizada em caso de resposta.
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E o que pode acontecer?
Um diplomata deve sair de um país a qual está em missão quando o país hospedeiro da embaixada determina, a custo, se recusar, de criar uma crise entre as duas nações por violar tratados internacionais. Entretanto, o próprio ato de expulsão já configura uma relação desgastada (veja mais abaixo sobre as relações Brasil e Nicarágua).
Enviados a outros países possuem imunidade assegurada, ou seja, não podem ser processados no local onde cumprem a missão. No entanto, seu direito de permanecer hospedado é uma espécie de concessão dada pelo “anfitrião”, que não precisa, necessariamente, ter uma justificativa muito plausível para retirar tal posição.
A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas estabelece como os Estados devem interagir. Seu artigo 9 estabelece que o Estado hospedeiro pode "a qualquer momento, e sem ser obrigado a justificar sua decisão", notificar que diplomatas no território são "persona non grata" — ou seja, que não são bem-vindos.
Brasil e Nicarágua
Com base nos dados de 2023, levantados pelo ComexVis (uma plataforma gerenciada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), a Nicarágua é o 96° mercado mais importante para o Brasil (exportações), e 109º de onde mais compramos (importações). Respectivamente, vendemos cerca de US$ 173,9 milhões e compramos US$ 4,9 milhões — uma balança comercial positiva ao Brasil em US$ 169 milhões.
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Entretanto, apesar de representar 0,05% do nosso comércio/indústria de exportação, a relação com o país da América Central é um ponto importante à figura de Lula. Os homólogos tinham uma relação de longa data. Em 2010, recebeu Daniel Ortega em Brasília, ocasião em que o chamou de “amigo” e “companheiro”.
O que causou o "esfriamento" da relação do petista com o nicaraguense, como foi apurado pelo SBT News, foi uma ofensiva contra a Igreja Católica no país, confiscando imóveis, dissolvendo ordens jesuítas e prendendo padres e bispos que denunciavam a guinada autoritária do líder. Sobretudo com relação ao bispo Ronaldo José Álvarez. Preso por mais de 500 dias, foi expulso do país em janeiro deste ano.
Um pedido de intermediação foi feito pelo próprio papa Francisco à Lula, em encontro em junho de 2023 — Ortega sequer atendeu ao pedido de telefonema. "O dado concreto é que o Daniel Ortega não atendeu o telefonema e não quis falar comigo. Então, nunca mais eu falei com ele, nunca mais. Ou seja, eu acho que é uma bobagem", disse o presidente da República para jornalistas à época.
"Eu participei do primeiro aniversário daquela revolução. Era um bando de meninas e meninas armados com metralhadoras que derrotaram o Somoza. Mas você faz uma revolução para quê? Faz uma revolução por que você quer o poder ou você faz uma revolução por que você quer melhorar a vida do povo do seu país? É isso que está em jogo", questionou Lula.
Desde então, os, outrora, amigos (Lula chegou a visitar o país em outros mandatos e esteve nas comemorações de um ano da revolução feita no país) não têm tido contato. Ainda em junho, o Brasil subscreveu uma resolução da OEA (Organização dos Estados Americanos) que pedia democracia na Nicarágua.