Conselho de Ética da Câmara aprova cassação de mandato do deputado Chiquinho Brazão
Parlamentar acusado de ser um dos mandantes do atentado que resultou na morte da vereadora Marielle Franco deve recorrer da decisão à CCJ
O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (28), o parecer de Jack Rocha (PT-ES) favorável à cassação do mandato do deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido-RJ). Na análise de representação do Psol contra o congressista, a relatora votou pela aplicação da pena de perda do mandato, por quebra do decoro parlamentar por supostamente ser um dos mandantes do atentado que resultou na morte da vereadora Marielle Franco (Psol), do Rio de Janeiro, e do motorista Anderson Gomes, em 2018, e ter cometido outras irregularidades.
Foram 15 votos a favor do parecer, um contrário e uma abstenção. O único voto contrário é do deputado Gutemberg Reis (MDB-RJ), e Paulo Magalhães (PSD-BA) se absteve.
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Brazão terá prazo de cinco dias úteis para recorrer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) contra procedimento que julgue inconstitucional ou antirregimental no processo no Conselho. A CCJ votará o recurso em cinco dias úteis também. Se a comissão decidir pela improcedência do recurso, a decisão do Conselho de Ética segue para votação no plenário da Câmara. Pelo menos 257 deputados precisam votar a favor do parecer de Jack para que a cassação do mandato de fato ocorra.
Em entrevista a jornalistas após a votação no Conselho de Ética, questionada se considera que haverá uma decisão final da Câmara ainda neste semestre, a deputada disse acreditar que "a Casa tem funcionado bem, as comissões, as sessões". "Claro que a gente está no período eleitoral, isso pode trazer [obstáculo], mas o plenário tem funcionado mesmo com um pouco das sessões no modelo híbrido, e eu acredito que ele [o parecer] pode ser apreciado ainda neste semestre", acrescentou.
Sem perseguição
Na sessão do Conselho de Ética, Jack Rocha disse que seu voto pela cassação não é um "voto de retaliação" nem sobre aspecto de "perseguição a um parlamentar". "Não se trata, absolutamente, de nada disso. Ao contrário, durante todo o processo, de todas as oitivas, nós permanecemos de maneira para que esse relatório pudesse trazer a imparcialidade e a visão do Parlamento sobre esse processo", acrescentou.
No voto, a relatora afirma que que a análise dos fatos e evidências sugere que Chiquinho "mantinha uma relação com as milícias do Rio de Janeiro". Segundo ela, a oposição de Marielle às atividades ilegais das milícias e suas propostas de políticas públicas contrárias aos interesses de Domingos e Chiquinho Brazão "fornecem uma motivação clara para o assassinato".
"Portanto, a imputação de que o representado é um dos mandantes da morte de Marielle Franco é verossímil e sustentada por evidências significativas", acrescenta.
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Um dos advogados de Chiquinho, Cleber Lopes, criticou o parecer de Jack na sessão. Segunda ele, o documento "ignora todos os depoimentos favoráveis à defesa".
Ele ressaltou que testemunhas que foram ao Conselho de Ética dizem "expressamente" que Chiquinho não tinha relação com milícia.
"O deputado não tem ligação nenhuma com milícia, conquanto ele conviva politicamente porque é uma necessidade do político que vive naquela comunidade, que nasceu ali, que cresceu ali. Ele leva melhorias para a população, para as pessoas de bem que ali residem", pontuou.
Alegações da defesa
Brazão disse ser "totalmente inocente" no caso da morte de Marielle e Anderson, durante a sessão.
Cleber Lopes pontuou ainda que várias testemunhas não foram ouvidas no processo no Conselho para esclarecer adequadamente o caso.
"E não foram ouvidas porque receberam apenas um convite. Nós fizemos um requerimento à presidência, à relatora, para que vossas excelências buscassem internamente na Câmara, ainda que pela presidência da Casa, mecanismos que pudessem autorizar a convocação", acrescentou. O Conselho de Ética não pode convocar testemunhas, apenas convidar.
Cleber Lopes afirmou que "autoridades, delegado de polícia, agentes públicos, não podem se dar ao luxo de simplesmente dizer que não têm interesse em depor no Conselho de Ética". Segundo ele, como várias testemunhas não compareceram, por apenas terem sido convidadas, houve "um prejuízo substancial na defesa" de Chiquinho.
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Além disso, o advogado ressaltou que a morte de Marielle ocorreu em 2018, antes de Chiquinho assumir o cargo de deputado federal, e, segundo ele, a jurisprudência da Câmara aponta que não se pode falar em quebra de decoro parlamentar por fato anterior ao mandato. O argumento foi rebatido por Jack Rocha.
Cleber Lopes afirmou que Chiquinho é acusado no caso Marielle apenas pelo delator Ronnie Lessa, réu confesso do assassinato da vereadora. De acordo com ele, o segundo executor da morte, Élcio Queiroz, em sua delação, "não aponta Chiquinho Brazão como mandante desse homicídio", mas essa linha de investigação "não é aprofundada".
"A PF não se debruça, não vai atrás disso, e não vai atrás disso porque encontra uma segunda deleção e aí, pela lei do menor esforço, a PF prefere acreditar na delação de Ronnie".
Nas palavras do advogado, "fala-se genericamente que Chiquinho tem ligações com a milícia". "Uma espécie de lenda urbana".
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Ele salientou que o deputado tem voto em região de tráfico e de milícia. "E quem conhece a realidade do Rio de Janeiro sabe que se o sujeito tem o carimbo da milícia, se ele é miliciano, ele não entra em área dominada pelo tráfico".
O advogado falou que Chiquinho e a vereadora tinham "uma relação harmoniosa" e que a votação de ambos na Câmara Municipal do Rio "era absolutamente convergente, com um índice de 90% de coincidência, de convergência".
Ele chamou ainda a delação de Lessa de "criação mental, fantasiosa, irresponsável". Cleber Lopes pediu que o processo no Conselho de Ética fosse suspenso por seis meses, até que o Judiciário pudesse investigar as acusações contra Chiquinho.
Ele está preso desde março pelo suposto envolvimento no caso Marielle.