Anistia do 8 de janeiro: o que esperar da reunião na Câmara com Hugo Motta?
Reunião é o primeiro compromisso do Presidente da Câmara dos Deputados na volta a Brasília após missão com Lula (PT) na Ásia

Rafael Porfírio
Paola Cuenca
A reunião na Câmara dos Deputados promete ser um “divisor de águas” para o futuro do projeto de anistia aos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro de 2023. O Partido Liberal (PL) vai pressionar o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), a colocar o projeto em regime de urgência diretamente no plenário. A decisão de Motta, que deve se reunir com líderes partidários nesta terça-feira (1º), poderá determinar o rumo das discussões e mudar o cenário político nas próximas semanas.
Estratégias com base em promessas antigas?
O PL, sem perder tempo, já traçou suas estratégias. O partido se recusa a aceitar a proposta de Motta de criar uma comissão especial para tratar do PL da anistia, preferindo pressionar pela votação direta no plenário.
O vice-líder da oposição, deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS), espera um desfecho favorável. Segundo o parlamentar, as penas aplicadas pelo STF a condenados pelos ataques de 8 de janeiro são excessivas e injustas.
“Estamos bastante otimistas de que o projeto de anistia, se não for analisado nesta semana, será na próxima. Ele será discutido, deliberado e colocado para votação no plenário da Câmara. Quando conversamos lá atrás com o então candidato à presidência da Câmara, Hugo Motta, ele nos garantiu, com suas palavras, que colocaria em votação qualquer projeto de interesse nacional, incluindo o da anistia, sem comprometer os votos, apenas colocando-o em pauta. [...] Aceitar penas de 15, 16, 17 anos, multas milionárias, como no caso da cabeleireira — 14 anos de prisão e 30 milhões de multa — isso é algo absolutamente inaceitável", diz Sanderson.
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Mas não basta otimismo. O PL já prepara um plano B. Se Motta não colocar a anistia para votação, os trabalhos na Câmara podem simplesmente parar.
“Com certeza, vamos estabelecer uma trava regimental. E não são apenas deputados do PL e do Novo. Temos parlamentares do MDB, PP, Podemos, PSD e Republicanos que não aceitarão essa quebra de compromisso do presidente Hugo Motta, caso ele não queira pautar um projeto apoiado por dezenas de parlamentares", reforça.
O líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ) afirmou que já fez as contas e tem apoio suficiente para ir a plenário: 309 votos certos.
Segundo o parlamentar, o PL (92 deputados) e o Novo (4 parlamentares) estão totalmente fechados na defesa da anistia. O PP pode entregar 44 votos (90%), Republicanos, 42 (95%), e o PSD, 35 (80%). Já o MDB deve oferecer só 17 votos (40%). Mas nem tudo são flores: partidos como PT, PCdoB, PV, PSOL e PDT não querem nem ouvir falar desse projeto.
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Governo critica estratégia e promete reagir
O governo, claro, não engoliu a ameaça. O vice-líder do governo, deputado Alencar Santana (PT-SP) criticou duramente a estratégia da oposição e disse que perdoar os envolvidos no 8 de janeiro seria um ataque à democracia.
“Não creio que o presidente Hugo Motta vá ceder a qualquer tipo de chantagem e pressão, ainda mais para alterar algo que beneficia algumas pessoas que cometeram crimes, tentaram o golpe, atentaram contra a democracia brasileira. Se o parlamento se sujeitar a esse tipo de pressão, lamento. Significa que aqueles que perpetraram o golpe continuam atacando a democracia e tendo conquistado alguns objetivos”, afirmou o petista.
Santana também lembrou que essa pressão da oposição pode acabar atrapalhando pautas que realmente fazem diferença para o povo, como a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.
“Se eles obstruírem, vamos ter que enfrentar a obstrução. Pode dar mais trabalho e demorar mais tempo, mas vamos superar. E o povo saberá quais pautas eles estão obstruindo. Eles querem obstruir a isenção de R$ 5 mil do Imposto de Renda? Querem obstruir a aprovação do crédito consignado com juros mais baixos? Vai ser um bom momento para as pessoas saberem quem está preocupado com a vida delas no dia a dia e quem está preocupado em salvar o Bolsonaro”, completou.
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Projeto quer proibir anistia para golpistas
Se de um lado o PL se empenha para garantir a anistia, do outro, a deputada Duda Salabert (PDT-MG) corre para impedir qualquer possibilidade de perdão. Seu projeto de lei, protocolado na segunda-feira (31) — data que lembra os 61 anos do golpe militar de 1964 —, prevê que nenhuma anistia poderá ser concedida a quem tentou abolir o Estado Democrático de Direito.
“Este Projeto de Lei busca fortalecer o compromisso do Brasil com a democracia, assegurando que atos que a ameacem sejam tratados com a devida seriedade e que seus responsáveis não sejam beneficiados por medidas que possam incentivar a reincidência ou a impunidade”, diz o texto.
A proposta ainda não tem data para ser votada, mas já serve como um contraponto direto ao projeto do PL.
Enquanto isso… tem projeto ambiental na fila
No meio desse embate político, a Câmara ainda tem outros temas para resolver. Nesta terça-feira (1º), os deputados podem votar o projeto da Lei do Mar, que estabelece diretrizes para a conservação da costa brasileira.
Outra proposta em análise prevê penas mais duras para crimes ambientais e proíbe empresas que causarem incêndios em áreas naturais de contratar com o poder público.
Agora, a questão é: a oposição vai deixar a Câmara funcionar ou vai transformar o Congresso em refém da anistia?