Venda ilegal de chumbinho na Ceagesp expõe riscos à saúde e revela mercado clandestino em SP
Dados obtidos pelo SBT mostram que mais de 3.600 boletins de ocorrência envolvendo chumbinho foram registrados em São Paulo, nos últimos 20 anos
Majô Gondim
Derick Toda
Marco Pagetti
Cristian Mendes
Marcia Barros
Um flagrante registrado com câmera escondida revelou o comércio ilegal de chumbinho dentro da Ceagesp, na zona oeste de São Paulo, onde circulam cerca de 50 mil pessoas todos os dias. O produto, vendido em pequenos frascos de vidro, é oferecido por ambulantes que atuam livremente no local. Apesar de proibido no Brasil desde 2012, o veneno continua a ser comercializado sem qualquer controle sanitário.
+ Envenenamento com "chumbinho": relembre casos trágicos pelo país
Em uma das imagens obtidas pela equipe de reportagem do SBT, um vendedor, em cima de uma bicicleta, oferece dois frascos do veneno por R$ 30. Questionado sobre a eficácia, garante: "Se não matar, traz de volta e eu devolvo seu dinheiro." Quando o produtor pergunta se poderia levar dez unidades, o vendedor promete falar com "o cara lá" — referência ao fornecedor.
Nosso produtor chegou a comprar três frascos por R$ 15 cada. O produto foi descartado logo depois. O chamado "chumbinho" é um raticida clandestino que não possui qualquer registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Seu uso, produção e venda são proibidos há mais de uma década, mas ele continua circulando em feiras e mercados do país.
Casos trágicos de envenenamento
Dados obtidos pela produção do SBT via Lei de Acesso à Informação mostram que mais de 3.600 boletins de ocorrência envolvendo chumbinho foram registrados apenas no estado de São Paulo nos últimos 20 anos. Em muitos casos, o veneno foi usado como arma para crimes premeditados.
Em março deste ano, por exemplo, Larissa Rodrigues foi morta em Ribeirão Preto, no interior paulista, após ser envenenada com o produto. Segundo a investigação, o autor do crime foi o próprio marido, o médico Antonio Garnica, com a ajuda da mãe dele, Elizabete Arrabaça. Larissa havia descoberto uma traição e pediu a separação. Marido e mãe estão presos.
Outro caso que chocou o país aconteceu no Piauí. No primeiro dia do ano, quatro pessoas da mesma família morreram em Parnaíba depois de ingerirem alimentos contaminados com o composto químico presente no chumbinho. Entre as vítimas, duas crianças — uma delas tinha apenas 1 ano e 8 meses.
Veneno letal
O biomédico e doutor em toxicologia da USP Henrique Bombana explica que os sintomas podem surgir em até cinco minutos após o consumo. "Basta uma pequena quantidade para provocar efeitos tóxicos graves. Entre os sintomas estão excesso de salivação, vômitos, diarreia e contrações involuntárias dos músculos. A evolução pode levar à morte rapidamente”, afirmou.
Fiscalização e risco público
Mesmo proibido, o chumbinho continua sendo vendido em feiras livres, mercados e locais de grande circulação, como mostrou o flagrante na Ceagesp. O risco à saúde pública é alto, já que o produto pode ser facilmente misturado em alimentos para crimes de envenenamento.
A reportagem procurou a Ceagesp, que informou que colabora com as autoridades e disse que intensificou a fiscalização dentro do entreposto. A reportagem do SBT também acionou a Anvisa, que reiterou a proibição do veneno e ressaltou a importância da denúncia às autoridades em casos de comércio clandestino.