Charlotte Peet tem o direito de desaparecer? Entenda quando sumir não é crime
Caso da jornalista britânica que passou mais de 30 dias sem contato com a família levanta debate sobre os limites legais do afastamento voluntário

SBT News
Charlotte Peet, 33 anos, jornalista britânica, foi dada como desaparecida pela família em fevereiro deste ano. Durante mais de um mês, amigos e parentes tentaram, sem sucesso, contato com ela. O silêncio preocupante levou à abertura de um inquérito policial, instaurado após uma amiga registrar boletim de ocorrência no Brasil a pedido dos pais da jovem.
A investigação envolveu as polícias paulista e carioca, que trabalharam para localizar Charlotte. Após pouco mais de 30 dias desde o último contato, a jornalista foi encontrada. Segundo os oficiais paulistas, ela optou por não manter contato com a família.
O caso ilustra um tema pouco discutido, mas importante no âmbito jurídico: o chamado "direito ao desaparecimento". Segundo a advogada Beatriz Alaia Colin, especialista em Direito Penal e Processo Penal Nacional e Europeu, "uma pessoa adulta tem o direito de simplesmente desaparecer, sem obrigação legal de informar seu paradeiro ou manter contato com familiares, salvo nos casos em que isso configure abandono de incapaz".
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A advogada explica ainda que não existe lei para forçar judicialmente uma pessoa a dar notícias ou prestar contas sobre seu afastamento, desde que não haja crime envolvido.
Contudo, o cenário é diferente para menores de idade, que são considerados dependentes legais. "No caso de adolescentes, o desaparecimento é tratado como situação de risco e mobiliza protocolos imediatos de busca e proteção pela polícia e pelo Conselho Tutelar", afirma Beatriz.
Quanto à atuação da polícia, a especialista esclarece que, ao receber um boletim de ocorrência por desaparecimento, as autoridades têm o dever de iniciar diligências para localizar a pessoa, que podem incluir investigação, entrevistas com familiares e amigos e análise de imagens de segurança. Caso não haja crime e a pessoa tenha apenas escolhido se isolar, o boletim de ocorrência é considerado um ato legítimo de quem age de boa-fé para proteger alguém.
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Sobre a obrigação de prestar esclarecimentos, a advogada afirma que um adulto localizado não é obrigado a justificar sua ausência, salvo se houver indícios de crime ou outras situações específicas, como mandados judiciais ou processos em curso.
O "direito ao desaparecimento" pode, entretanto, se transformar em crimes se houver violação de deveres legais, como abandono de dependentes ou tentativa de fraude a processos judiciais. Além disso, o desaparecimento pode gerar consequências civis sérias, como rescisão de contratos, dívidas, ações judiciais e penhora de bens, principalmente se a pessoa deixar compromissos financeiros ou familiares pendentes.
O caso de Charlotte Peet evidencia que o afastamento voluntário é permitido, desde que não cause prejuízo a terceiros ou envolva ilícitos, delineando um equilíbrio entre o direito à privacidade e as responsabilidades legais.