Keir Starmer, o moderado que faltava na sala de reuniões
Mas nem o britânico tem respostas para as perguntas difíceis sobre a guerra da Ucrânia
Duas semanas depois de ser eleito, o premiê britânico Keir Starmer já se consolida como um dos principais líderes da Europa. E não é apenas por méritos do trabalhista. É pela carência da Europa em figuras moderadas.
O calendário também ajudou. Na semana passada, ele tinha uma Conferência da Otan, em Washington e, nesta quinta (18), foi o anfitrião da Comunidade Política Europeia, cujo encontro aconteceu no Palácio de Blenheim, no interior da Inglaterra.
O novo premiê repetiu a líderes de mais de 40 países do continente que quer "reiniciar" a relação com a Europa, especialmente com a União Europeia, abalada depois do Brexit. Ele não cogita voltar para o bloco, mas quer melhorar a maneira como os dois lados se relacionam hoje.
Com uma ampla maioria no parlamento, Sir Keir não tem os mesmos problemas do alemão Olaf Scholz, do francês Emmanuel Macron ou do espanhol Pedro Sanchez, que enfrentam resistência interna maior da opinião pública e dos parlamentos em seus respectivos países. O britânico tem, portanto, um mandato mais seguro pra fazer um "reset" nas relações.
Imigração
Starmer colocou o fluxo de imigrantes para a Europa e a guerra na Ucrânia como assuntos prioritários. Controlar o número de pessoas que chegam ao Reino Unido em pequenos barcos pelo canal da Mancha é uma das prioridades de seu governo, que abandonou os planos de enviar pra Ruanda – com quem os Conservadores fizeram um acordo – aqueles que pedem asilo político para os britânicos.
Neste sentido, o trabalhista garantiu que, enquanto estiver no poder, o Reino Unido não deixará a Corte Europeia de Direitos Humanos. Apesar de ter saído do bloco europeu, os britânicos ainda fazem parte do tribunal que julga causas comuns a todos os países do continente e poderia bloquear o plano Ruanda. O ex-premiê Rishi Sunak tinha ameaçado abandonar a Corte pra seguir com o plano.
Imigração é palavra-chave nas eleições de todos os países europeus. No Reino Unido, não é diferente. Keir Starmer sabe que vai precisar apresentar resultados.
Ucrânia
No plano internacional, no entanto, o premiê segue os passos de seus antecessores do Partido Conservador e promete alinhamento total com a Ucrânia. Ao presidente Zelensky, convidado de honra no Palácio de Blenheim, prometeu agilizar o envio de armas para a Ucrânia.
Mas, se quiser sair da defensiva e pensar em recuperar territórios perdidos, incluindo a Crimeia, Zelensky sabe e avisou aqui na Inglaterra que precisa de mais, muito mais.
Ao grupo de líderes europeus, o ucraniano repetiu uma ideia que citou pela primeira vez numa pergunta que fiz a ele em Kyiv, 5 dia após jatos de vários países, como Estados Unidos, Reino Unido, Jordânia e França, terem derrubado mísseis disparados contra Israel pelo Irã.
O ucraniano quer que a mesma estratégia seja usada pra defender a Ucrânia dos mísseis russos. A ideia é que esses jatos sequer entrem em espaço aéreo ucraniano, mas que façam os disparos defensivos a partir dos limites da União Europeia.
Zelensky não tem apoio para isso, nem para usar os mísseis que recebe dos aliados para acertar bases militares dentro do território russo. A única concessão que conseguiu é para fazer isso na região de fronteira.
O ucraniano sabe que, com a atual engenharia de guerra, o máximo que conseguirá será conter os russos. Recuperar os territórios que perdeu é outra história.
Por isso, ele rejeita qualquer negociação que tenha como base ceder definitivamente as áreas da Ucrânia que hoje estão sob controle dos russos. É isso que propõe aqueles que não estão alinhados com Kyiv ou com a União Europeia.
O húngaro Viktor Orban chegou à Inglaterra disposto a dizer o que achava. Contrariando os outros colegas do bloco, ele esteve em Moscou recentemente e diz ter uma nova proposta de paz, mas reclama que não é compreendido.
"Porque há mais países pró-guerra (na Europa). Eles acreditam que podem destruir os russos militarmente, do que eu discordo. Eu acho que a solução para esse conflito não está no campo de batalha".
O discurso de um dos líderes da ultradireita europeia não é muito diferente daquele que o presidente brasileiro fez tantas vezes sobre o mesmo assunto. Mas Orban e Lula têm alguns pontos: até quando será viável sustentar essa guerra? É possível vencer Putin? A que custo? São perguntas difíceis para as quais a Europa e os Estados Unidos ainda não têm uma resposta.