Tribunal de Contas da União abre investigação sobre uso de software espião pela PRF
TCU acatou pedido da CPMI do 8/1; dados obtidos pela PF mostram que PRF omitiu informações de inteligência sobre bloqueios em estradas após eleições de 2022
O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu acatar pedido da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Atos de 8 de Janeiro para abrir investigação sobre contratos da Polícia Rodoviária Federal (PRF) com a empresa israelense Cognyte, sobretudo no suposto uso de softwares espiões.
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Para o relator da ação, ministro Vital do Rêgo, os dados apresentados pela PRF à CPMI foram "insuficientes para que seja possível responder integralmente à demanda" de esclarecimentos. "As análises de contratos, planejamento de aquisições, extratos de pagamento, entre outras, a meu ver, são insuficientes para descrever como as capacidades de monitoramento desse tipo de software são utilizadas, na prática, em ações de policiamento, fiscalização, combate à criminalidade e à corrupção", escreveu o magistrado.
"Ademais, entendo que somente análise mais detida das funcionalidades existentes nesse tipo de software, inclusive em sua nova versão (sistema Orbis), seria capaz de revelar eventuais riscos decorrentes de sua utilização, de forma a permitir aferir se a recomendação proposta pelo parecer técnico é suficiente para sua mitigação", disse Vital do Rêgo.
Em ofício ao TCU, a senadora e relatora da CPMI, Eliziane Gama (PSD-MA), questionou: "Considerando que houve pagamentos à empresa por meio da Ação Orçamentária Policiamento Ostensivo Nas Rodovias e Estradas Federais, como os sistemas são utilizados nas ações de policiamento ostensivo das rodovias federais?". A congressista fez referência aos bloqueios da PRF na região Nordeste no segundo turno das eleições presidenciais de 2022.
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Também foram identificados, por meio de consulta ao Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), pagamentos direcionados como "Policiamento, Fiscalização, Combate à Criminalidade e Corrupção". O pedido da CPMI também quer esclarecimento sobre especificações de onde são aplicadas essas ações orçamentárias.
Segundo a senadora, "causa estranheza a utilização de sistemas de rastreamento de aparelhos telefônicos e de monitoramento de redes sociais pela Polícia Rodoviária Federal". A CPMI apurou que a empresa de software de segurança e análise de dados recebeu, em 2018, cerca de R$ 4 milhões.
Qual foi o pedido da CPMI do 8/1?
Congressistas pediram ao TCU um parecer sobre cinco questionamentos acerca dos contratos da PRF com a empresa israelense:
+ "O objeto de algum contrato refere-se à aquisição de softwares de rastreamento, identificação e interceptação de números de aparelhos celulares de qualquer espécie ou de software de solução de monitoramento de redes sociais? Se sim, quais foram os softwares adquiridos?";
+ "Qual finalidade da utilização de tecnologias de interceptação de aparelhos telefônicos e de monitoramento de redes sociais, considerando que a PRF não detém competência legal para realizar investigações como a polícia judiciária?";
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+ "Considerando que houve pagamentos à empresa por meio da Ação Orçamentária Policiamento Ostensivo Nas Rodovias E Estradas Federais, como os sistemas da Cognyte são utilizados nas ações de policiamento ostensivo das rodovias federais?";
+ "Considerando que houve pagamentos à referida empresa por meio da Ação Orçamentária Policiamento, Fiscalização, Combate À Criminalidade E Corrupção, como os sistemas da Cognyte são usados nas ações de policiamento fiscalização, combate à criminalidade e à corrupção?";
+ "Haveria desvio de finalidade nas contratações da Cognyte pela PRF?".
O que observou o TCU?
Rêgo também analisou em sua relatoria que o software, "embora seja inegável tratar-se de recurso relevante para a atuação dos órgãos e forças integrantes do sistema de inteligência nacional no combate à criminalidade", "somente a realização da fiscalização requerida pela CPMI é capaz de detalhar com a profundidade necessária às apurações [...] permitindo melhor identificar os riscos de desvio de finalidade decorrentes ao uso desse tipo de solução e eventuais controles que possam vir a ser recomendados à PRF para sua mitigação".
"Considerando que a análise detida das funcionalidades do software e de seus controles internos requer expertise técnica na área, proponho a realização de inspeção pela unidade especializada em tecnologia da informação, se necessário, com apoio da unidade especializada em segurança pública, com vistas a esclarecer como tem se dado o efetivo uso da ferramenta", afirmou o magistrado.
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Em plenário, o TCU seguiu Vital do Rêgo e decidiu acatar a solicitação de investigação (Processo nº 023.173/2023-8), por meio da "unidade de auditoria especializada em tecnologia da informação que, se necessário, com apoio da unidade de auditoria especializada em governança, realize inspeção".
Bloqueio de estradas
Dados obtidos pela Polícia Federal (PF) em celulares apreendidos mostram que a PRF omitiu informações de inteligência sobre os bloqueios nas estradas após o resultado das eleições de 2022.
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Em depoimento, Silvinei Vasques, ex-diretor geral da PRF, negou ter previsto os protestos de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em estradas. Ele está preso desde 9 de agosto de 2023 por suspeitas de orquestrar ações que impediram eleitores de chegarem a locais de votação no Nordeste, no domingo do segundo turno das eleições de 2022.
De acordo com as investigações, é possível verificar que a PRF tinha prospecção de cenários em caso de vitória tanto de Bolsonaro (PL) quanto de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).