Desastre de Mariana: e-mail comprova envolvimento operacional da BHP
Mensagem apresentada à justiça inglesa contraria alegações da mineradora de que era uma “mera acionista”
Durante audiência na Corte inglesa que julga o desastre de Mariana (MG), na quinta (18), em Londres, um e-mail enviado por um ex-executivo da BHP para diretores da empresa um dia após o desastre citando "revisões da barragem". O conteúdo contraria as alegações da empresa de que era uma “mera acionista” da Samarco.
A mensagem do ex-executivo demonstra que a empresa havia requisitado, anos antes do rompimento da barragem, um relatório independente sobre a segurança da mina. O e-mail sugere envolvimento operacional da mineradora e petrolífera na gestão da barragem e sua ciência do risco de colapso.
Por que a ação ocorre na Inglaterra?
O processo corre na justiça britânica porque a Broken Hill Proprietary Company Limited Billiton (BHP), que, juntamente com a Vale, é dona da Samarco, é anglo-australiana. O julgamento de responsabilidade está marcado para outubro de 2024.
Advogados que representam cerca de 700 mil atingidos argumentam a favor da responsabilização da BHP. Argumentam que a empresa tinha controle sobre a Samarco e envolvimento em sua gestão.
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O que diz o e-mail?
Durante a audiência, várias evidências apresentadas pelos advogados das vítimas contradizem as alegações da BHP. Uma delas é o e-mail enviado por Marcus Randolph, membro do conselho da Samarco, ao então diretores da BHP Andrew Mackenzie e Jimmy Wilson, no dia seguinte ao desastre.
Nele, Randolph detalha seu envolvimento na Samarco e sua preocupação com os riscos da barragem no passado.
"Eu era uma grande parte da Samarco na época, e nós nos empenhamos muito na segurança da barragem. Depois de uma visita ao local, enviei uma nota à Samarco que continha comentários extensos sobre o risco da barragem. Se eu puder ajudar de alguma forma, entre em contato comigo. Enviei várias cartas ao MD (Managing Director) solicitando revisões da barragem e me lembro muito bem dos acontecimentos. Acredito que também havia alguns documentos no registro de riscos da BHP e nosso conselho/comitês tiveram discussões sobre o risco", narra Marcus Randolph no e-mail em trecho divulgado pelo escritório da causa, Pogust Goodhead.
A mensagem foi incorporada ao processo por meio de um dispositivo previsto no direito processual inglês, que permitiu ao Pogust Goodhead acessar documentos internos da BHP Billiton. Entre esses documentos, encontrava-se a correspondência de Randolph.
Consequência: o Tribunal Superior de Londres determinou que a BHP entregue o contrato de trabalho da barragem de mineração de Mariana à época do colapso. A decisão pode definir a mineradora como uma das responsabilizáveis pela tragédia.
O desastre de Mariana
Em 5 de novembro de 2015 um tsunami de lama atingiu o antigo vilarejo da cidade de Bento Rodrigues e Mariana, em Minas Gerais, após o rompimento da barragem do Fundão, causando a morte de 19 pessoas.
Mais de 700 pessoas foram atingidas. É ainda hoje o maior desastre ambiental da história da mineração do país.
Há processos de responsabilização das empresas tanto em vara nacional quanto internacional. O caso é considerado a maior ação coletiva ambiental do mundo, com pedido de indenização de R$ 230 bilhões, incluindo juros e todos os danos.
Em 2022, a corte inglesa confirmou que o caso poderia ser julgado na Inglaterra. A BHP pediu para que a Vale também responda no mesmo processo.
No Brasil: houve a abertura de dois processos. O primeiro dos governos estaduais de Minas e Espírito Santo (que também teve regiões atingidas pela onda de dejetos), gerando um acordo. O outro foi movido pelo Ministério Público e a Justiça Federal condenou as empresas a um pagamento de R$ 47,6 bilhões em indenização coletiva, valor a ser corrigidos por juros.