STF: autoridades podem pedir dados diretamente a provedores no exterior
Medida deve acelerar acesso a dados de provedores e redes sociais para abastecer investigações criminais
Rafaela Vivas
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu no início da noite desta 5º feira (23.fev) que autoridades nacionais podem pedir dados diretamente a provedores de internet com sede no exterior. A medida deve acelerar o acesso a dados de provedores de internet e redes sociais que podem abastecer investigações criminais.
A decisão foi durante julgamento de uma Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) apresenada pela Federação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional) que buscava definir se o acesso judicial de dados de usuários da internet por provedores sediados no exterior deveria, necessariamente, seguir o procedimento do acordo celebrado entre o Brasil e os Estados Unidos. O Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal (MLAT, na sigla em inglês) entre os governos brasileiro e norte-americano foi promulgado pelo Decreto Federal 3.810/2001 e trata da obtenção de conteúdo de comunicação privada sob controle de provedores de aplicativos de internet sediados fora do país.
O julgamento foi retomado com o voto vista do ministro Alexandre de Moraes, que é o relator dos inquéritos das Fake News e dos Atos Antidemocráticos que tramitam no STF e apuram, entre outros casos, as responsabilidades pelas invasões à sede dos Três Poderes, em Brasília no dia 8 de janeiro. O ministro chamou atenção para a responsabilização das plataformas que veiculam conteúdo falso.
"Elas [plataformas] acabaram, por omissão, colaborando com os atos [de 8 de janeiro]. Se tivesse um filtro mínimo, teriam não só avisado às autoridades competentes como também cessado essa provocação. Se percebeu, e elas perceberam, que chegou a agora de uma regulamentação. E é sempre melhor uma autorregulação, acompanhada do que uma regulação de cima para baixo", avaliou Moraes.
Moraes ainda falou da "indústria de desinformação e crimes" no Brasil, e que a produção de provas é extremamente difícil nesses casos. Lembrou que se não houver o bloqueio e a preservação da prova, a prova some. O ministro defendeu a regulação pois as penalizações a provedores e plataformas que não atendem ordem judicial são multas muito brandas, ou medidas extremas, como a suspensão do funcionamento. "Não há meio termo", ressaltou.
Para o magistrado, não importa de onde vem a informação, mas onde está acontecendo e citou as eleições brasileiras como exemplo. "O Telegram é de Dubai, mas a divulgação de discursos de ódio e fascistas estavam acontecendo no Brasil, utilizando as antenas brasileiras, tentando afetar as eleições do Brasil. Atos praticados no Brasil, responsabilidade no Brasil, jurisdição brasileira".
Moraes acompanhou o voto do relator, ministro Gilmar Mendes, que votou pela constitucionalidade de normas previstas no MLAT e nos dispositivos dos Códigos Processuais Civil e Penal brasileiros.
Gilmar Mendes já tinha se pronunciado que o único instrumento cabível para a solicitação de dados eletrônicos é o da cooperação prevista pelo tratado bilateral e as cartas rogatórias. O magistrado considerou possível que as autoridades brasileiras solicitem essas informações diretamente às empresas localizadas no exterior para as atividades de coleta e tratamento de dados que estejam sob a posse ou o controle de empresa com representação no Brasil e para os crimes cometidos por pessoas localizadas em território nacional. Segundo o relator, essas hipóteses estão contidas no artigo 11 do Marco Civil da Internet, que encontra respaldo no artigo 18 da Convenção de Budapeste.
Os ministros André Mendonça e Nunes Marques considerararm que a Assespro não tem legitimidade para propor a ação no Supremo, que a ação não apresenta controvérsia judicial relevante e que a ADC não é o instrumento jurídico adequado para questionar a matéria. A maioria, no entanto, seguiu o voto do relator Gilmar Mendes.