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Chineses não estão construindo estrada de ferro para ligar Mato Grosso ao Maranhão

Não existe nenhuma ferrovia sendo construída, nem projeto, que ligue o estado do Maranhão ao município de Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, passando por Marabá, no Pará

Chineses não estão construindo estrada de ferro para ligar Mato Grosso ao Maranhão
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Um vídeo da construção de uma estrada de ferro na Suécia foi tirado de contexto e usado em postagens no Twitter, no Facebook e no Whatsapp associado a uma informação falsa. O post afirma que o vídeo mostra “o maquinário que os chineses estão usando para fazer a estrada de ferro que vai da região de Lucas do Rio Verde”, no Mato Grosso, até o Maranhão, passando por Marabá, no Pará.

Não existe nenhuma ferrovia sendo construída nesse trajeto, como mostra o mapa ferroviário do Ministério da Infraestrutura. Tampouco, na parte do site do Ministério em que são informadas as ferrovias que estão em obras, consta a realização de obras que ligariam os municípios citados nas postagens.

Também não existe planejamento por parte do governo federal de construir uma estrada de ferro que ligue o Maranhão a Lucas do Rio Verde passando por Marabá.

De acordo com nota do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), os municípios de Marabá e Lucas do Rio Verde fazem parte do trajeto de ferrovias diferentes. Marabá integra o percurso da Estrada de Ferro Carajás, já o município de Lucas do Rio Verde está no trajeto previsto da Ferrovia de Integração do Centro Oeste (Fico), ferrovia que ainda não saiu do papel.

O Comprova encontrou o vídeo no perfil @EliOliv98248502 do Twitter. O texto usado na publicação enganosa circula nas redes, com algumas variações, desde pelo menos junho de 2018. Nas postagens mais recentes, publicadas em agosto deste ano, o vídeo que acompanha o texto sequer foi filmado no Brasil. Segundo apuração do Comprova, ele mostra uma obra em uma ferrovia na Suécia.

As demais postagens utilizando versões similares ou idênticas do texto, e encontradas pelo Comprova, foram publicadas em maio de 2019 e junho de 2018. Elas utilizavam vídeo da expansão da Estrada de Ferro Carajás, executada pela Vale, como foi checado pelo Estadão Verifica.

O selo Falso é usado pelo Comprova para conteúdos divulgados de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Já o selo de Contexto errado é utilizado quando o conteúdo é retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado original.

Como verificamos

Para analisar o conteúdo que viralizou, o Comprova buscou informações com a empresa sueca CEAB, nome que aparece numa máquina que é mostrada no vídeo.

Também entrou em contato com o DNIT e buscou dados do governo federal sobre obras de ferrovias no Brasil, tanto no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) quanto no site da Valec (empresa pública vinculada ao Ministério da Infraestrutura).

O Comprova também entrou em contato com fontes ligadas às concessionárias do setor ferroviário no país e com a Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China (CCDIBC).

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O vídeo que viralizou

O Comprova não conseguiu chegar ao autor do vídeo que aparece no post enganoso. No entanto, como as imagens mostram uma máquina com o logotipo da empresa sueca CEAB, foi possível entrar em contato com a companhia, que deu informações sobre a obra exibida na gravação.

No vídeo viralizado também é possível ler no maquinário o nome da marca Volvo, empresa também sueca e mais conhecida por seus automóveis.

Por e-mail, a CEAB informou que o vídeo em questão foi feito em uma de suas obras no sul da Suécia, entre as cidades de Lund e Arlov. A máquina do vídeo é do modelo Volvo EWR150E Rail. Um vídeo publicado na página da empresa em agosto de 2018 mostra o mesmo maquinário.

De acordo com o representante da empresa Tony Andersson, o vídeo mostra uma nova tecnologia que está sendo desenvolvida pela CEAB em conjunto com um de seus fornecedores, a RF-System, para colocação mais rápida do trilhos.

A empresa afirmou que o vídeo foi feito em agosto deste ano, mas que não é capaz de informar quem teria filmado. “Não acredito que tenha sido um de nossos funcionários ou um passante – visto que é uma área restrita. Poderia ser uma empresa terceirizada ou até nosso cliente”, afirmou Andersson em nota.

Ferrovias e projetos nas cidades citadas

A legenda da postagem falsa cita uma suposta obra ferroviária ligando três estados brasileiros: Maranhão, Pará (Marabá) e Mato Grosso (Lucas do Rio Verde).

No entanto, não existe nem obra nem planejamento pelo governo federal de construir uma ferrovia ligando as localidades citadas pela postagem.

A cidade de Marabá (PA) é ligada ao Maranhão pela Estrada de Ferro Carajás (EFC), que foi inaugurada há mais de 30 anos.

Em relação a Lucas do Rio Verde, há dois projetos que ainda não saíram do papel e que envolvem a cidade. Um deles é a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico) e o outro, a Ferrogrão (EF-170).

O projeto da Fico prevê ligar Porto Velho, capital de Rondônia, a Mara Rosa, em Goiás. Essa ferrovia ligaria o município de Lucas do Rio Verde ao Maranhão por meio de uma conexão com a Ferrovia Norte-Sul (FNS) na cidade de Mara Rosa.

Com isso, também seria possível a ligação com Marabá (PA), devido à conexão da FNS com a EFC em Açailândia, no Maranhão. Nesse caso, portanto, uma futura ligação entre Lucas do Rio Verde e Marabá só seria possível por meio do uso de três ferrovias distintas.

O projeto da Fico, que ainda está em fase de estudos, passou por mudanças no começo deste ano e deverá entrar em fase de consulta pública.

Já a Ferrogrão poderia ligar o município de Lucas do Rio Verde ao estado do Pará. Seu projeto inicial prevê a ligação de Sinop (MT) ao porto de Miritituba (PA), no rio Tapajós. Segundo o governo, é possível que a ferrovia seja estendida de Sinop até Lucas do Rio Verde.

Por este projeto, a estrada de ferro passaria bem longe de Marabá. O porto de Miritituba fica a mais de 700 km ao leste da cidade, em linha reta.

De acordo com o site do PPI, o edital de licitação da Ferrogrão deve sair no próximo trimestre – mas indígenas, caminhoneiros e políticos do Pará querem barrar o projeto, como noticiou o jornal Folha de S.Paulo no dia 21 deste mês.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A publicação sobre a suposta obra ferroviária em Marabá foi feita no dia 21 de agosto no Facebook e teve, até o dia 28, mais de 19 mil compartilhamentos e 7,7 mil curtidas. Outra postagem no Twitter teve 2,1 mil retweets e mais de 4 mil curtidas. Leitores também enviaram ao Comprova o vídeo pelo Whatsapp, no número (11) 97795-0022, por meio do qual recebemos denúncias de conteúdo duvidoso.

O mesmo vídeo, acompanhado do mesmo texto, também foi encontrado em dois posts no YouTube publicados em 21 e 23 de agosto. Somados, os dois vídeos não tinham mais de 120 visualizações até o dia 27.

Outros veículos já fizeram checagem envolvendo construção de ferrovias e suposto uso de maquinários chineses: Estadão Verifica, e-farsas e Agência Lupa. O Boatos.org fez duas, uma em 2018 e outra em 2019.

O interesse chinês por ferrovias no Brasil

Questionada se empresas chinesas participam da construção de ferrovias no Brasil, a Câmara de Comércio Brasil China (CCBI) informou apenas que “existem sim empresas chinesas interessadas em construir ferrovias no Brasil”. No entanto, ela não soube confirmar se existe alguma companhia chinesa envolvida em obras do setor.

Já o DNIT não soube informar. O órgão afirmou, em nota, que “não constrói ferrovias” e sugeriu que fossem contatadas a Valec (empresa pública vinculada ao Ministério da Infraestrutura) ou as empresas que operam os trechos.

A Valec informou, em nota, que “não há empresas chinesas executando obras de responsabilidade da Valec”.Textos de veículos da imprensa, como da Folha de S.Paulo em 2017, do Jornal do Commercio em 2019 e da Exame em 2019, noticiaram o interesse do país asiático em entrar no setor ferroviário brasileiro, no entanto, não há notícia de qualquer obra iniciada ou leilão vencido por grupos e empresas chinesas para a construção de ferrovias no país.

Entre as obras ferroviárias citadas na matéria da Folha como de interesse de grupos chineses estão a Ferrogrão e a Fico, que ainda estão em fase de estudos.

Outra obra citada é a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL). Os trechos atualmente em execução, no entanto, estão sendo realizados pela Valec, conforme consta no portal Avançar do governo federal.

A FIOL tem um terceiro trecho cuja execução ainda não começou.

A matéria da Exame, mais recente, também menciona como interesse dos chineses tanto a FIOL quanto a Ferrogrão.

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Investigação e verificação

Folha, UOL e revista piauí participaram desta investigação e a sua verificação, pelo processo de crosscheck, foi realizada pelos veículos Estadão, Band, AFP e Sistema Jornal do Commércio.

Projeto Comprova

Esta reportagem foi elaborada por jornalistas do Projeto Comprova, grupo formado por 24 veículos de imprensa brasileiros, para combater a desinformação. Em 2018, o Comprova monitorou e desmentiu boatos e rumores relacionados à eleição presidencial. A edição deste ano está dedicado a combater a desinformação sobre políticas públicas. O SBT faz parte dessa aliança.

Desconfiou da informação recebida? Envie sua denúncia, dúvida ou boato pelo WhatsApp 11 97795 0022.

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