PSDB corre risco de perder hegemonia em SP, avaliam cientistas políticos
Pré-candidato tucano ao governo do estado aparece com 3% das intenções de voto na pesquisa mais recente
A decisão do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) de lançar o governador de São Paulo, João Doria, como pré-candidato a presidente da República e o vice-governador do estado, Rodrigo Garcia, como pré-candidato a chefe do Executivo paulista vem acompanhada de um risco expressivo de a sigla deixar o governo do estado mais populoso do país após 27 anos no posto, de acordo com cientistas políticos. Na corrida eleitoral estadual, no próximo ano, outros dois nomes já confirmaram presença: o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos (PSol), e o deputado federal Vinicius Poit (Novo-SP).
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O ex-governador de São Paulo Márcio França, terceiro colocado no pleito para eleger o prefeito da capital em 2020 -- com 13,64% dos votos válidos --, também já afirmou em diferentes ocasiões que se propõe a disputar o governo novamente. A eleição pode vir ainda a contar, pelo menos, com as candidaturas do ex-governador paulista Geraldo Alckmin, que deixará o PSDB e deu início à sua pré-campanha política para 2022 em setembro; do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, seguindo desejo do presidente Jair Bolsonaro (PL); do ex-ministro da Educação Abraham Weintraub; e do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT), que, conforme apurou o SBT News, é visto no partido como pré-candidato natural ao Executivo de São Paulo com a decisão de Lula de disputar a Presidência da República, além de ter sido, até o momento, o único petista a manifestar a vontade.
Em pesquisa Ipespe/Valor Econômico de intenção de voto divulgada na 5ª feira (2.dez), num cenário sem França e Poit, Alckmin lidera com 23% e é seguido por Haddad (19%), Boulos (11%), Tarcísio (8%), Garcia (3%) e Weintraub (0%). Já em outro, sem Alckmin, Haddad, Weintraub e Poit, Boulos lidera com 23% e França fica em segundo lugar (19%), enquanto Tarcísio (10%) e Rodrigo Garcia (5%) vêm na sequência. O ministro da Infraestrutura empata na segunda colocação com o líder do MTST, com 13% das intenções, num cenário sem Alckmin, França, Weintraub e Poit, no qual Haddad lidera (27%). Foram ouvidas mil pessoas, por telefone, entre 29 de novembro e 1º de dezembro, sendo que a margem de erro é de 3,2 pontos percentuais.
Para o doutor em sociologia política e professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Rodrigo Horochovski, a escolha de Garcia para concorrer ao governo de São Paulo, para o PSDB, representa um "elemento de risco [de derrota] muito forte, muito grande". Por outro lado, afirma, trata-se também de "um risco calculado". "Nunca devemos esquecer principalmente da articulação e da força do PSDB no interior do estado. Se nós pensarmos bem, o próprio João Doria foi um nome que foi galgando muito rapidamente as diferentes posições, mas quem garantiu a eleição dele [em 2018], curiosamente ele era prefeito da capital, mas quem garantiu foi o interior", completou.
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No segundo turno do pleito em São Paulo, há três anos, França obteve 58,1% dos votos, e Doria, 41,9%, na capital paulista. Na visão de Horochovski, um governador do PSDB, na campanha eleitoral, "sai com uma vantagem tremenda, recursos de poder muito superiores aos demais candidatos". O professor Wagner Romão, do Departamento de Ciência Política do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/Unicamp), concorda com a análise. Em sua palavras, "há uma grande possibilidade de o PSDB vir a perder essas eleições". Segundo Romão, a "hegemonia" do partido em São Paulo está em crise, por causa de um racha existente entre os filiados sobre apoiar Doria ou não, atuação de políticos de extrema-direita bolsonaristas no estado e renovação da esquerda por meio de Haddad e Boulos.
Entretanto, acredita que a candidatura de Rodrigo Garcia continua sendo "importante". O motivo, explica, é que "Doria tem utilizado muito fortemente a máquina do governo estadual, inclusive pra trazer prefeitos para o PSDB". "Isso aí foi uma estratégia que ele [Doria] utilizou também para a disputa das prévias internas do PSDB para a Presidência da República, então ele [Garcia] é um candidato que não é desprezível. Muito pelo contrário. Quando a máquina das prefeituras, a máquina do governo do estado começa a funcionar, a gente vê esses candidatos se tornarem fortes", acrescentou o professor.
Em sua análise ainda, o governador paulista decidiu participar do pleito nacional devido à rejeição que tem em São Paulo: "É uma estratégia de que o Doria se mantenha como um personagem político ativo. Perder as eleições para presidente da República não é algo que vai acabar com uma carreira política. Agora, se ele fosse derrotado aqui na reeleição, isso, sim, acabaria com a carreira política dele ou prejudicaria muito".
Principais candidatos
Romão avalia que não existe a possibilidade de a eleição para o governo de São Paulo no ano que vem terminar no primeiro turno. Para ele, Alckmin, Haddad, França, Boulos e Garcia "têm muitas chances de chegar ao segundo". Horochovski, por sua vez, relembra, porém, que Alckmin está sendo cotado para ser vice de Lula numa corrida ao Palácio do Planalto. "E o que nós vemos é o seguinte: sem o Alckmin na campanha, quer dizer, candidato a governador, aí sobressai o Fernando Haddad", pontua o doutor em sociologia política.
Ele considera que o ex-prefeito da capital paulista e ex-ministro da Educação, que perdeu para Jair Bolsonaro (PL) a disputa pelo cargo de presidente em 2018, "é um dos candidatos mais competitivos, se não o mais competitivo, da esquerda, em muitos anos". Contudo, diz que PSol e PT enfrentarão um dilema no próximo ano: se lançarem candidaturas próprias (Boulos e Haddad), correm risco significativo de não chegarem a um eventual segundo turno, mas se o Psol optar por apoiar o candidato do PT, pode prejudicar seu próprio crescimento.
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Para o professor da Unicamp, como já há uma unidade desenhada entre as duas siglas pela candidatura de Lula, concessões de ambas as partes serão feitas pelo país e, portanto, em São Paulo, "é possível que haja algum entendimento". Ao SBT News, o diretório estadual do PT disse que "o processo de escolha das candidaturas majoritárias (governador e senador) e proporcionais (deputados estaduais e federais) se dará apenas no ano que vem". "O fechamento dos nomes dependerá das alianças", informou a sigla.
Em relação à eventual participação do ministro Tarcísio de Freitas, Horochovski diz que seria um candidato competitivo, enquanto Romão enxerga como "um nome difícil para colar em São Paulo". Porém, os especialistas concordam que o apoio do presidente Bolsonaro daria fôlego à candidatura. "Pode fazer com que ele tenha acima de 10% dos votos, o que não é pouca coisa", afirma o docente Departamento de Ciência Política do IFHC. Por enquanto, Tarcísio não está filiado a qualquer partido; a tendência é que se junte ao PL.
Principais temas
Por causa da pandemia, emprego, saúde e educação, todos afetados devido ao avanço da covid-19, deverão ser os principais temas presentes nos debates e nas propostas do pleito de São Paulo no ano que vem. "Aquela tendência de ter um discurso mais radicalizado, inclusive em torno de pautas como costumes e assim por diante, vai sofrer uma certa inflexão. Isso já se viu na edição de 2020, na eleição municipal, e eu creio que as pessoas vão novamente se voltar às questões do cotidiano", pontuou Rodrigo Horochovski. Dessa forma, um dos focos de Tarcísio seria mostrar resultados na área da infraestrutura no governo Bolsonaro, visando a convencer que houve alto índice de eficiência.
Candidatos deverão destacar ainda as alianças com outros nomes para convencer o cidadão. Nas palavras de Wagner Romão, "vai haver também uma relação muito forte com a candidatura presidencial, então a candidatura de Bolsonaro, de Lula, eventualmente de Moro, eventualmente de outros aí, eu acho que vai ser um ponto de tensão, um ponto de visão entre o eleitorado".