Rentabilidade e segurança digital atraem investimentos em arte
Aporte inicial é de R$ 5 mil; retorno sobre capital pode chegar a 24% em dois anos
Guto Abranches
O valor de uma obra de arte diante dos olhos é quase sempre tão expressivo quanto difícil de quantificar: depende da sensibilidade, do envolvimento pessoal de quem olha, da inspiração que a tela provoca. Todos critérios válidos e cumulativos: quanto mais você olha pra arte, mais aprende sobre ela, mais tende a gostar mais de arte. Numa sociedade acelerada e em busca de resultados instantâneos pra tudo, a simples parada para contemplar uma produção artística já é uma tomada de decisão.
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Além do sucesso e da ótima reputação no mundo das artes, os trabalhos de Di Cavalcanti, Volpi, Tomie Ohtake e de nomes da criação contemporânea como Judith Lauand e Jandyra Waters são protagonistas de uma grande mudança no mundo dos investimentos.
Em tempos de tecnologia, não demorou muito para que o gosto pela arte e por fazer dinheiro convergissem. "O mercado financeiro é um dos grandes afetados pela era da transformação digital, principalmente no que trata de investimento", aponta o CEO e sócio da Hurst Capital, Arthur Farace.
A Hurst é uma plataforma de investimentos alternativos que desde 2021 negocia "pedaços" de obras de arte no mercado digital. O aporte inicial parte de R$ 5 mil a R$ 10 mil reais. "É uma forma de democratizar o acesso a este mercado, originalmente integrado por ultrarricos, e permitir que mais gente diversifique seus investimentos", avalia Farache.
Quanto e quando
O lançamento da primeira operação da fintech envolveu três telas do expoente da arte cinética -- que une a expressão das cores e formas à ideia do movimento -- o brasileiro Abraham Palatnik. As telas, juntas, valiam R$ 650 mil aproximadamente. Mas investidores com R$ 10 mil reais ou mais puderam se apropriar de um ativo valioso e altamente rentável: a proposta de rendimento era de 17,36% ao ano em prazo de 24 a 36 meses.
Treze meses depois, no entanto, os 46 investidores puseram no bolso o resultado de uma valorização de 27,5%, dez pontos percentuais acima do previsto. "O mercado apresenta uma previsão de valor, de ganhos para a operação. Mas nada impede que o resultado final seja bem maior", explica a diretora de operações da plataforma, Ana Maria Carvalho.
De fato, no caso dos Palatniks, houve uma procura intensa por trabalhos do artista, que morreu vítima de covid em 2020. "Após o falecimento do artista, a procura pelos trabalhos dele aumentou muito. Essa procura nunca é imediata, leva mais ou menos 1 ou 2 anos para maturar. Foi exatamente o que ocorreu", completa Ana Maria.
Ponto de fuga
Ainda que estruturado sobre um lastro que é a própria obra, como todo investimento o mercado de arte também está sujeito a oscilações desfavoráveis. O diretor de negócios da ComDinheiro/Nelogica, plataforma de dados e educação financeira, Filipe Ferreira, explica que estas flutuações podem gerar retornos negativos. Na avaliação dele, em boa medida a compra e venda de arte pode se assemelhar ao mercado imobiliário, onde é possível comprar um imóvel e anos depois vendê-lo por um valor menor.
"Existe o lastro (uma referência), mas esse lastro pode oscilar seu valor de mercado. Em se tratando de obras de arte, essa oscilação pode ser ainda mais sensível, pois seu valor é bastante vinculado ao intangível" - Filipe Ferreira, ComDinheiro/Nelogica
Ainda que a subjetividade tenha participação primordial no universo artístico, o mercado também dispõe de elementos bastante concretos para definir valores de referência das obras. No episódio dos ataques golpistas ao Palácio do Planalto, no dia 08 de janeiro, obras de artistas consagrados foram vandalizadas ou até destruídas. O quadro Mulatas, de Di Cavalcanti, danificado nos ataques, tem valor estimado em R$ 8 milhões.
"Vale mais. O m2 de obras desta fase do artista (anos 1920/1930) com aquela qualidade de cor e de composição, tem valor de R$ 4 milhões. A obra tem mais de 4 metros quadrados, então vale mais de R$ 16 milhões", sentencia Ana Maria Carvalho.
Ao contrário do que muita gente pode pensar, medir o "tamanho da obra" pode ter significado também literal. Abaixo, estimativas das valorizações das obras de grandes artistas brasileiros no mercado atualmente. A fonte é a Hurst Capital, baseada nas pesquisas que a fintech faz em leilões e casas de arte no mercado nacional e internacional.
- Volpi: média de valorização das obras foi de 2.500% nos últimos 16 anos
- Hélio Oiticica: obra Metaesquema, leiloado na Christie's duas vezes em 10 anos, com valorização de 700% entre uma e outra
- Judith Lauand: conjunto da obra valorizou 598% em 8 anos
Segurança digital e real
Nem toda obra de arte se encaixa nessa modalidade de investimento. No caso da plataforma Hurst, os especialistas fazem pesquisas da movimentação das obras do artista, presenças em leilões e galerias, retrospecto de aceitação pelo público antes de ser feita uma aquisição para o trabalho ser oferecido aos investidores.
A nova operação com trabalhos de Alfredo Volpi, lançada no mês passado, só saiu depois da análise de 120 transações de suas obras nos últimos 16 anos em leilões nas principais bases de dados do mercado de arte nacional e internacional. E apenas os trabalhos produzidos entre os anos 1960 e 1980 foram selecionados, por apresentarem valorização satisfatória ao longo de todo o período.
Outro aspecto que deve ser observado é o risco da operação no universo digital: de um lado, toda ação fica em muito facilitada pela tecnologia, o que permite maior fluidez dos negócios. De outro, é preciso apresentar garantias aos investidores de que se está oferecendo um produto oficial dentro de um processo legalizado e que não pode ser adulterado.
Daí a adoção da tecnologia blockchain, um banco de dados avançado que armazena informações em blocos interligados: ninguém altera nenhum documento ou procedimento sem o consenso de toda a rede. Dessa forma, a operação fica "oficializada" no mundo digital. É graças ao sistema que os ativos podem ser transformados em Tokens, "pedaços" digitais garantidos pelo processo da tecnologia, que são mais acessíveis a investidores diversos.
Resultado
Em 2022, a Hurst distribuiu R$ 821 mil em ganhos entre os investidores de obras de arte, quase o dobro do retorno das operações com criptomoedas, que entregaram R$ 440 mil em ganhos. No período foram lançadas sete novas operações que envolveram nomes como Tomie Ohtake e as artistas centenárias Judith Lauand e Jandyra Waters. No total, o volume de investimentos somou R$ 3,588 milhões.
No mais, como de hábito, a opção pelo investimento obedece ao critério pessoal de cada interessado. Risco sempre existe. E a boa informação sobre o cenário e o mercado em si é ativo indispensável -- e a maior garantia. Saiba mais sobre investimentos em arte no site da Hurst.