Avanço da Ômicron e surto de gripe frustram expectativas do comércio
Categoria se esforça para repor funcionários afastados devido a quadro de covid-19 ou de gripe
Setor fortemente impactado no Brasil pelas medidas restritivas de circulação adotadas nos últimos anos para conter a pandemia, o comércio começou 2022 com surpresas negativas no território nacional devido aos avanços da gripe e da variante Ômicron do coronavírus. Entidades representativas afirmam que esse cenário de disseminação das doenças tem prejudicado a receita das empresas, seja pelo afastamento de funcionários seja pelo temor de consumidores em irem aos espaços físicos.
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Nas palavras do presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Comércio (CNTC), Luiz Carlos Motta, "a covid-19 com essa gripe H3N2 está quebrando as expectativas do incremento das vendas em estabelecimentos comerciais em todo o Brasil e que atuam nos mais variados segmentos da categoria". Ainda de acordo com ele, a expectativa do setor para este início de ano era "muito grande" -- tendo em vista que os números de novos casos e óbitos por covid pareciam ter estacionado em patamares bem mais baixos --, mas o avanço da nova variante, agora, gera preocupação.
"Deixou a gente muito preocupado. Eu estou andando um pouquinho aí no estado [de São Paulo] e estou vendo como as cidades estão preocupadas, os prefeitos fazendo decretos, não fechando ainda o comércio, mas as outras atividades estão praticamente sendo fechadas, eventos, algumas peças, algumas reuniões", pontuou Motta. A crise sanitária no país vem gerando apreensão nos comerciários e profissionais da área de bens e serviços também, relembra, porque a maneira como os negócios funcionam "favorece muito as contaminações por essa variante Ômicron ou também pela [gripe] H3N2, porque os trabalhadores estão muito próximos dos clientes, manuseiam mercadoria, manuseiam dinheiro e também cartões de crédito".
Motta diz esperar, porém, que as autoridades, empregados e empregadores se reúnam para conversarem sobre medidas a serem tomadas diante da piora no cenário epidemiológico e chegarem a um consenso, para que nenhum lado seja prejudicado. A Associação Nacional dos Lojistas Satélites (Ablos) discute internamente pedir aos shoppings redução do horário de funcionamento, por causa de crescimento no número de funcionários de lojas de atestado médico devido a contágio por covid ou gripe; um posicionamento oficial deverá ser divulgado nesta semana. Ao SBT News, o Sindicato dos Comerciários de São Paulo (SECSP) disse que, por causa da fase atual da pandemia, pedirá também a redução de período de atividade dos shoppings e, a empresas, escalonamento dos funcionários, para evitar aglomeração no transporte público.
Levantamento da Associação Nacional de Restaurantes (ANR) mostra que cerca de um em cada cinco profissionais tem se afastado do trabalho por suspeita de covid-19 ou influenza, e que 20% da força de trabalho de locais como bares, restaurantes, supermercados e shoppings está afastada.
Segundo Fabio Bentes, economista sênior da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), estabelecimentos do comércio têm sofrido nos últimos dias para manter o quadro de funcionários, em decorrência de afastamentos por covid ou gripe, e empregadores têm um gasto adicional para repor os empregados. Porém, a principal forma como a disseminação das doenças vem impactando negativamente o funcionamento do setor é o medo de circular provocado nos clientes. Na primeira semana do ano, explica, a circulação de consumidores em estabelecimentos comerciais costuma diminuir, pois cresce no final de dezembro em decorrência do Natal, mas neste ano a queda foi mais acentuada: 7,1%, ante 6,3% da primeira semana de 2021. No varejo essencial, formado, por exemplo, por supermercados e farmácias, queda de 10,9%, ante 8,9%.
O economista analisa, então, que o atual momento de contaminações pelo coronavírus está provocando "efeitos mais nocivos" no comércio do que os observados na primeira semana de 2021, quando o país passava pela segunda onda da pandemia. No Brasil, 77% do faturamento do varejo vem das lojas físicas.
Bares e restaurantes
O presidente-executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci, explica que, no segmento, houve um crescimento no número de funcionários afastados por problemas de saúde pouco antes do Revéillon, mas principalmente por gripe, e que, agora, a covid-19 é o maior motivo de haver uma quantidade significativa de licenças médicas. Segundo ele, bares e restaurantes estão "vivendo uma situação complicada que, ligado ao afastamento, é porque não está tendo teste e você tem quatro doenças simultâneas acontecendo no Brasil, e uma outra circunstância que complica tudo: os sintomas são muito parecidos".
As enfermidades às quais se refere são a covid, a gripe causada pela influenza H1N1, a gripe provocada pela influenza H3N2 e a dengue. "Muitas dessas doenças têm sintomas semelhantes. Então, qual tem sido a nossa recomendação desde o início da pandemia, em que a gente acha que foi muito exitosa? Com qualquer sintoma, não sai de casa, não vá trabalhar. Só que quando você tem um ambiente tão variado de possibilidades, com prazos de afastamento diferentes, se você não consegue testar todo mundo, fica um problemaço. E é um pouco disso que a gente está vivendo", completa Solmucci.
Ainda segundo o presidente da Abrasel, funcionários que têm ido realizar testes em postos de saúde têm ficado de seis a oito horas na fila de espera e, em unidades particulares, o agendamento é feito para quatro ou cinco dias depois, quando a doença pode inclusive já ter acabado. "Então, o que está acontecendo com a gente? Nós estamos afastando mais gente do que precisa. Porque quando faz o teste, de três a quatro que faz o teste, estão dando positivo para covid, que é o número alto em relação ao passado, mas ainda não é todo mundo que a gente está afastando. De 30% a 40%. Então nós estamos vivendo com esse ambiente, ômicron crescendo, misturado com outras doenças, dificuldade enorme de saber exatamente o que o colaborador tem, o que as pessoas têm, pela dificuldade de testar. Isso está nos trazendo um aperto operacional relevante."
Ele relembra que como muitos bares e restaurantes possuem equipes pequenas, afastar um funcionário já traz um obstáculo significativo. Como o setor vinha em processo de contratação no segundo semestre do ano passado, explica Solmucci, foi gerado um banco de dados de profissionais e, portanto, empregadores tinham contatos para repor, "mas o troço está pesado, está pesado e o custo dobrado"; a maioria dos colaboradores afastados ficam sete dias em casa, período não coberto pelo INSS.
Para o presidente da Abrasel, dezembro foi um mês "espetacular de vendas" e a categoria não imaginava "que fosse chegar em janeiro com tanto transtorno com essa ômicron crescendo do jeito que está crescendo". Por outro lado, ele acrescenta que a demanda por bares e restaurantes está normal e, assim, as vendas neste início de janeiro também. A Associação vem discutindo com as autoridades a adoção de medidas para conter a pandemia e se posiciona à favor, por exemplo, da suspensão de blocos de Carnaval. Segundo Solmucci, tudo que a entidade "tem conversado no Brasil afora tem ido mais na direção de ser mais cautelosos com os eventos numerosos, não com o comércio, serviços, bares e restaurantes". Ou seja, ao menos em grande parte do Brasil, não acredita que possa ser determinado novo fechamento dos bares e restaurantes pelo poder público.
A Abrasel aposta ainda em reforçar as campanhas de vacinação e nas medidas não farmacológicas, como o uso de máscara e álcool em gel, para frear a crise sanitária. De acordo com o presidente da Associação, os protocolos sanitários nos estabelecimentos têm sido eficazes e a maioria da contaminação dos funcionários por covid ou gripe não tem ocorrido no trabalho, mas, sim, no ambiente familiar.