Reforma tributária: médicos defendem taxação maior de alimentos ultraprocessados
Alto consumo das chamadas 'calorias vazias' representa perigo para saúde; taxação também é pedida para tabaco
Camila Stucaluc
Associações e organizações médicas lançaram um manifesto em defesa da maior taxação de produtos nocivos à saúde, como bebidas açucaradas e alimentos ultraprocessados, na reforma tributária. Isso porque, de acordo com eles, em 2022, os preços dos itens passaram a ser menores que os da chamada "comida de verdade", o que acabou incentivando o consumo no país. As entidades médicas pedem, então, um posicionamento dos senadores, que devem votar o texto nas próximas semanas, em favor da saúde pública.
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Os alimentos ultraprocessados são conhecidos por serem atraentes, práticos e de baixo custo. Tais produtos, no entanto, são desbalanceados nutricionalmente e, geralmente, são ricos em gorduras, açúcares ou sódio. Em São Paulo, por exemplo, as associações já denunciam que a salsicha é um item presente na cesta básica, tendo a mesma alíquota de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do arroz e do feijão - calculada em 7%. O mesmo acontece com o macarrão instantâneo na Bahia.
"Hoje, o IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados] é isento para produtos como macarrão instantâneo e nuggets. Outra distorção é o fato de que o suco de uva integral orgânico chega a pagar quase quatro vezes mais tributos que um néctar de uva que é ultraprocessado", explica a diretora da ACT Promoção da Saúde, Paula Johns. "Não existe uma política tributária que favoreça os alimentos orgânicos ou agroecológicos", acrescenta.
Paula comenta sobre o IPI porque a ideia da reforma tributária é substituir cinco impostos sobre consumo, sendo IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS, por apenas um Imposto sobre Bens e Serviços. Apesar do texto prever a criação de uma cesta básica nacional, com alíquota zero, as associações médicas temem que produtos ultraprocessados, nocivos à saúde, sejam incluídos na lista de alimentos essenciais, o que aumentaria o consumo e, consequentemente, o risco de doenças crônicas associadas aos produtos.
Entre elas estão a obesidade, diabetes tipo 2, hipertensão, cirrose hepática e doenças renais crônicas, que respondem, segundo dados do Ministério da Saúde, por 57 mil mortes precoces por ano no Brasil, além de milhares de tratamentos. Para os especialistas, portanto, o alto consumo das chamadas 'calorias vazias' representa, além de perigo para a saúde, um dos fatores para o aumento de custos no Sistema Único de Saúde (SUS).
"A ciência tem nos demonstrado que a alimentação com maior percentual de alimentos não processados, in natura, ou de preparo caseiro, está relacionada à manutenção de melhores índices de saúde. A reforma tributária nos parece uma boa oportunidade para trazer esse debate, uma vez que a taxação dos ultraprocessados, aliada à redução da taxação dos alimentos mais saudáveis, historicamente em outros países tem se demonstrado eficaz para promover uma mudança de hábitos alimentares", avalia o presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), Paulo Augusto Miranda.
Tabaco
A maior taxação também é pedida no caso do tabaco. Segundo a representante da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, Letícia Cardoso, houve uma redução até 2020 e depois o consumo parou de cair. Hoje, o fumo é responsável por 161 mil mortes por ano no Brasil, o equivalente a 13% do total de óbitos. "Essas mortes vêm caindo ao longo do tempo. Mas não porque a gente vem reduzindo os seus fatores de risco, mas porque a gente vem implementando tecnologias para aumentar a sobrevida destas pessoas", afirma.
O mesmo é dito pela representante do Instituto Nacional do Câncer (Inca), Ana Paula Teixeira. Ela explica que os preços dos cigarros estão estagnados desde 2016, o que é preocupante. Isso porque o aumento do valor cobrado pelo produto seria necessário para evitar a iniciação de jovens no hábito de fumar, o que pode resultar em doenças cardiovasculares e respiratórias graves, incluindo doenças coronárias e câncer de pulmão. No Brasil, o Inca estima mais de 28 mil novos casos de tumores pulmonares ao ano.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o como tabagismo é a principal causa de morte evitável no planeta, sendo responsável por 63% dos óbitos relacionados às doenças crônicas não transmissíveis. A entidade afirma que a epidemia de tabaco é uma das maiores ameaças à saúde pública que o mundo já enfrentou, uma vez que resulta na morte de mais de 8 milhões de pessoas por ano. Dos óbitos, 7 milhões são resultados do uso direto do tabaco, enquanto 1,2 milhão são provocados em não-fumantes expostos ao fumo passivo.
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