75% das doenças infecciosas humanas têm origem em animais, diz estudo
Pesquisadores da UFRGS fazem recomendações para evitar "salto" de microrganismos entre espécies
Guilherme Resck
Entre 60% e 75% das doenças infecciosas humanas são derivadas de microrganismos que circulavam primeiramente em espécies de animais selvagens e acabaram "saltando" para as pessoas, segundo um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O trabalho -- publicado nesta 6ª feira (4.jun) na revista científica Genetics and Molecular Biology -- pontua, por outro lado, que a proliferação das enfermidades nos humanos é facilitada pela própria ação destes.
Os pesquisadores chegaram às conclusões após revisarem outros estudos em inglês, disponíveis nas principais bases de dados de medicina e biologia nas plataformas PubMed/MEDLINE, SciELO e Google Scholar. Para encontrá-los, utilizaram termos como spillover (transbordamento, em tradução literal), zoonotic spillover (transbordamento zoonótico), pathogen spillover (transbordamento de patógeno), host jump (salto de hospedeiro), cross-species transmission (transmissão entre espécies) e zoonotic transfer (transferência zoonótica).
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O estudo mostra que o salto de microrganismos geralmente envolve um hospedeiro de origem, um hospedeiro receptor e um hospedeiro intermediário - que pode ser vertebrado ou invertebrado. Entretando, "muitos patógenos sobrevivem fora do hospedeiro sem perder a viabilidade e transmissibilidade, e, portanto, o meio ambiente pode atuar como um intermediário na transmissão de patógenos entre diferentes espécies".
Além disso, dizem os autores do trabalho, "a interação dos humanos com as espécies selvagens desempenha um papel proeminente no surgimento de novas doenças humanas". Como exemplo, citam o HIV, que apareceu na espécie humana a partir da interação com carne/sangue de primatas selvagens.
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A caça, o comércio e o consumo de carnes silvestres, entre outros fatores socioculturais, alerta o estudo, facilitam a ocorrência de saltos zoonóticos, "porque colocam os humanos em contato próximo com a carne fresca, miudezas e sangue de animais que podem hospedar diferentes patógenos". O trabalho relembra que umas das possíveis origens do novo coronavírus, responsável pela pandemia ainda em curso, diz respeito aos morcegos, mas que os pangolins teriam agido como "ponte" para a infecção na espécie humana. Nas palavras de José Artur Chies, co-autor do estudo, "a carne dos pangolins é comumente consumida na China e pode ter havido contaminação ao manusear ou se alimentar deste mamífero".
Dessa forma, por fim, o artigo científico faz uma série de recomendações para prevenir saltos de microrganismos entre espécies e, em vários casos, prevenir o controle de doenças humanas já existentes. São elas:
- Melhorar o controle sanitário da pecuária;
- Aumentar a vigilância de patógenos em interfaces homem-animal;
- Cotrolar a caça e o comércio de animais selvagens;
- Reduzir o desmatamento e a perda de biodiversidade;
- Melhorar a infraestrutura de saneamento básico/ambiental;
- Evitar a construção de habtação humana em áreas florestais;
- Controlar vetores e animais selvagens;
- Aumentar os investimentos em treinamento de humanos e laboratórios voltatos à identificação de novos patógenos e doenças emergentes, além de desenvolvimento de vacinas;
- Identificar fatores biológicos e sociais de suscetibilidade às infecções;
- Criar fundos financeiros para financiar a mitigação do surgimento de surtos de doenças infecciosas assim que saltos ocorrerem;
- E regular os protocolos de bissegurança para profissioanais trabalhando com vida selvagem e pecuária.