ANÁLISE: Temos uma chance, por Carlos Nascimento
Leia a análise sobre as eleições municipais deste ano e o que virá pela frente
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A eleição que passou desperta uma esperança que parecia morta no Brasil : tudo indica que a maioria do eleitorado ainda é formada por pessoas equilibradas, responsáveis e de bom senso. Só uma visão assim permitirá recolocar o País nos trilhos em 2022.
As urnas repudiaram, em vários casos, o radicalismo, o populismo, a corrupção, a incultura, a ignorância e a grosseria. E não foram tão boazinhas com os discípulos de "igrejas" criadas para explorar a boa fé das pessoas. Nem com os que insistem em uma solução policial ou militar para os problemas nacionais.
Há uma ligação dessas práticas com as "redes sociais", mas esse instrumento teve menos êxito do que na eleição presidencial. Parte dos eleitores se deu conta de que os ataques pessoais e a violência não são a melhor fonte para escolher governantes.
As câmaras municipais e prefeituras, quando ocupadas sem critérios tornam-se a porta de entrada de pessoas mal-intencionadas na vida pública. Basta ver as imagens com os apelidos e fantasias grotescas de candidatos que se submetem ao ridículo para atrair votos.
Mais grave é o alerta de que organizações criminosas inscrevem seus paus mandados para disputar eleições. Ou dão suporte para os maus políticos defenderem interesses comuns.
Em 1976, quando o governo militar instituiu o salário dos vereadores, meu preceptor no Jornalismo, Clineu Alves de Lima, também secretário da Câmara Municipal disse:
- O Geisel acabou com a política no Brasil. Hoje temos onze vereadores que se reúnem uma vez por semana, de graça e foram eleitos porque são idealistas e gostam do que fazem. A partir de agora haverá uma fila de interessados. Não nos problemas da cidade, mas no dinheiro.
Não serei tão taxativo porque há vereadores sérios que defendem ideias e eleitores. Mas há desacertos econômicos, como os cabides de empregos e déficits fiscais e orçamentários que poderiam ser domados a partir das contas municipais.
Os eleitores e os partidos de cidades grandes ou pequenas deveriam selecionar os candidatos com mais pudor e acuidade do que, quando for o caso, por uma troca de favores.
A maioria dos brasileiros abandonou a política e terceirizou a administração do País. Ter um pai, um filho ou um neto candidatos tornou-se indesejável. Trocamos a responsabilidade social pelas metas pessoais e pelo argumento de que "a política é suja".
Não confundam o que escreverei a seguir com preferências ideológicas ou eleitorais e menos ainda com atestados de idoneidade política ou pessoal. Vou citar, como observador, alguns eleitos que sinalizam uma política mais promissora.
O primeiro é Rafael Greca, reeleito pelos curitibanos no 1.o turno com quase 60% dos votos. Além de urbanista, engenheiro e economista ama a sua cidade e ocupa o cargo com sensibilidade e entusiasmo. É um prefeito por vocação, não por conveniência. Conseguiu unir alguns pontos fundamentais na administração municipal : as necessidades urbanas, o bom gosto, a mobilidade e a cultura.
O segundo é Bruno Covas. Nada a ver com suas ligações partidárias ou com os méritos do avô, Mário Covas. Paciente de um câncer grave, o prefeito de São Paulo se manteve no cargo durante o tratamento e transmitiu coragem e perseverança em uma campanha difícil. Foi um candidato que se aproximou bastante da figura de um estadista.
O terceiro é João Henrique Campos, eleito prefeito do Recife aos vinte e sete anos. Não pelo que foi, mas pelo que poderá ser. Aqui não vai qualquer reverência ao bisavô, Miguel Arraes e nem menosprezo pela prima derrotada, Marilia. Cabe lembrar o pai, Eduardo Campos, morto na campanha presidencial de 2014. Claro que o histórico familiar conta na ascensão política, mas os méritos de João Henrique Campos são dele pois poderia ter escolhido outro caminho.
Que esses prefeitos e os demais eleitos pautem seus mandatos pela dignidade - aí incluídos a honestidade, a competência, a responsabilidade e o respeito pelo Brasil.
É o típico caso de uma inversão de valores positiva. Na política brasileira de hoje a esperança é de que o exemplo venha de baixo, não de cima.
*O jornalista Carlos Nascimento é âncora do SBT Brasil
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