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"Criança precisa de acolhimento", diz especialista sobre uso de tecnologias

Pesquisa mostra aumento na exposição de menores de idade a dispositivos eletrônicos

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Sombra de criança lendo
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Choros, gritos, ansiedade e depressão são alguns dos efeitos colaterais que as crianças apresentam devido ao uso contínuo dos eletrônicos. Segundo a Universidade Federal de Minas Gerais, (UFMG), houve um crescimento preocupante do uso das telas, como celulares, tablets e computadores, por menores de idade. A conclusão é de uma nova pesquisa coordenada pela instituição, anunciada no início de dezembro. 

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Foram entrevistados mais de 6 mil pais e, segundo 51% deles, o tempo dos filhos diante de telas passa de quatro horas diárias; outros 24% disseram ficar de três a quatro horas. Ou seja, 75% dos pais reconhecem que os filhos passam mais de três horas por dia expostos as telas.

Com a pandemia, que manteve crianças e adolescentes a maior parte do tempo em casa, o uso dos eletrônicos intensificou, revelando que o abuso diante das telas, provoca, além de doenças mentais, segundo o pediatra, psicólogo e secretario do departamento de Saúde Mental da Sociedade de Pediatria de São Paulo, Eduardo Goldenstein, uma dependência do dispositivo.

Para o médico, o problema começa com a incoerência dos pais que reclamam sobre o abuso das telas, mas continuam dando os dispositivos aos filhos.

"Uma criança ou um adolescente não entra em uma loja e compra um celular, um computador ou qualquer que seja a tela", ressalta Goldenstein. "Isso é algo que me impacta muito. Vemos bebês, crianças, jovens e adultos presos numa tela pequena, como algo comum", afirma. 

O problema é que, mesmo com o fim do isolamento social e retorno das escolas às atividades presenciais, crianças e adolescentes continuam fazendo uso excessivo das telas e das redes sociais, o que tem causado uma alienação e distorção da realidade, além de agravar e disparar problemas comportamentais. 

"No geral, o impacto do uso dos dispositivos eletrônicos por crianças são: ataques de choro, gritos, mau comportamento e descontrole emocional. É algo terrível que acontece com o comportamento deles", conta a fotógrafa e corretora de imóveis Julia Possebon, mãe de três filhos. 

Radicada em Malta -- arquipélago situado na região central do Mediterrâneo, entre a Sicília, na Itália, e a costa do Norte da África -- há 7 anos, a brasileira conta que os três filhos, "sofrem" essa exposição por quatro horas, no máximo, semanais.

Como a dinâmica com os três filhos é corrida, ela e o marido, deixam as crianças usarem apenas quando estão "esperando os irmãos em alguma atividade extracurricular, como natação, dança ou aula de lego". 

"Eu prefiro dar menos. As crianças perdem a noção da realidade e a capacidade de interação com o outro", ressalta a brasileira. 

Segundo o estudo da UFMG, quando estamos diante da tela, o cérebro libera uma substância química chamada dopamina, a mesma liberada pelo uso de álcool e drogas. O problema é quando a exposição começa a acontecer com frequência.

O cérebro das crianças ainda não está totalmente maduro, estando suscetível às experiências a que elas estão expostas no cotidiano.  

A designer de joias e fundadora da Sou Sou, Satya Spindel, 43, mãe de dois meninos, de oito e 16 anos, conta que o período de quarentena, durante as primeiras ondas da pandemia, foi "horrível". "Dar limite no eletrônico, porque não tinha como sair de casa. O dispositivo virou escola, lazer e babá", relembra. 

"Agora que as atividades escolares estão retornando, consegui diminuir o tempo de exposição as telas", afirma Satya. Para a designer, seus filhos ficam mais nervosos, principalmente o pequeno: "O mais velho, sinto que fica 'abduzido'".

Relações

Já a psicóloga e educadora da escola Waldorf de São Paulo Simone Aligieri, 48 anos, teme que o abuso das telas possa afetar funções relacionadas ao planejamento e o raciocínio da criança.

"No eletrônico é tudo artificial, a imagem, a voz, não tem calor, não tem presença", destaca a educadora de crianças de quatro a seis anos. 

Segundo Simone, o que importa para a criança nessa fase, da primeira infância, é o brincar. "A criança não precisa de muito para brincar, são elementos lúdicos que levam a criança a viver experiências únicas e formar suas próprias imagens por meio de vivencias".  

Para a pedagoga, "é preciso que a criança tenha a possibilidade de ir conhecendo o mundo e se relacionando com ele de forma viva". 

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) tem suas recomendações sobre o tempo e a idade que as crianças devem ser expostas as telas: até uma hora por dia para crianças com idade entre dois e cinco anos, e duas horas, como o limite máximo, para crianças com idade entre seis e dez anos.

Já para os adolescentes, com idades entre 11 e 18 anos, a indicação é de, no máximo, três horas por dia, incluindo o uso de videogames.

"Na minha opinião, o problema não são as horas em si que a criança passa em frente ao dispositivo, mas a qualidade do tempo e a frequência", diz o Eduardo Goldenstein. Para o médico, os pais precisam estar atentos ao tipo de conteúdo que as crianças estão vendo e aos aplicativos que estão sendo acessados. 

Ainda de acordo com o pediatra, as funções do cérebro e possibilidades de amadurecimento saudável ficam comprometidas com a exposição. O ideal são atividades em que a criança possa se movimentar e imaginar, como "leituras, atividades manuais, atividades lúdicas e prática de esportes".

Tais atividades, junto com um fator importante que é o "acolhimento, amor e carinho dos pais", permitem que a criança ou jovem reverta um quadro de tristeza profunda ou depressão. 

Para o fotógrafo e cineasta, Anderson Zaca, 45 anos, pai de Ocean, sete anos, radicado em Nova York há 26 anos, o tempo é precioso.

"Quando estou com meu filho procuro aproveitar o máximo o tempo com ele. Praticamos surf, BMX, parkout, wakesurf, tênis, futebol, leitura e muitas brincadeiras", conta Zaca. "Ele fica tão cansado e nem tem tempo ou interesse nos dispositivos".

Questionado sobre o tempo para trabalhar e realizar outras tarefas, Zaca é direto: "Estar com meu filho é prioridade, para mim. Eu trabalho sim, mas não nos dias que estamos juntos", conclui o cineasta que tem guarda compartilhada com o filho de 15 em 15 dias e em fins de semana alternados.

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