Vacina experimental pode atrasar retorno do câncer de pâncreas e colorretal
Pesquisadores desenvolveram imunizante com potencial de prolongar o tempo de sobrevivência de pacientes oncológicos; entenda

Wagner Lauria Jr.
Uma nova vacina experimental, desenvolvida para treinar o sistema imunológico a reconhecer e atacar células tumorais, apresentou resultados animadores contra dois dos tipos mais letais de câncer: o de pâncreas e o colorretal.
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Os dados, publicados nesta segunda-feira (11) na revista Nature Medicine, mostram que a vacina foi capaz de prolongar o tempo de sobrevivência e atrasar a volta do tumor em parte dos casos.
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O imunizante, chamado ELI-002 2P, foi testado em um estudo clínico inicial (fase 1) com 25 pacientes que já haviam passado pela cirurgia e quimioterapia padrão, mas ainda tinham vestígios da doença detectáveis no sangue.
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Como a vacina atua
O alvo principal da ELI-002 2P é o gene KRAS, cuja mutação está presente em grande parte dos tumores de pâncreas e em muitos casos de câncer colorretal. Essa alteração genética estimula o crescimento descontrolado das células, tornando o câncer mais agressivo.
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Ao ser aplicada, a vacina leva fragmentos dessas mutações — chamados peptídeos — diretamente para os linfonodos, estruturas onde as células de defesa se organizam. Lá, o sistema imunológico “aprende” a reconhecer as células tumorais que carregam o KRAS alterado, preparando-se para combatê-las caso voltem a aparecer.
O diferencial é que a vacina não é personalizada, o que significa que pode ser fabricada em larga escala e armazenada, sem depender de um processo sob medida para cada paciente.
O que foi descoberto?
Entre os participantes, 68% desenvolveram uma resposta imune robusta contra o KRAS. Aqueles com as respostas mais fortes das células T, um tipo de célula de defesa, tiveram maior sobrevida e mais tempo livre da doença.
Os números chamam atenção especialmente no grupo com câncer de pâncreas, conhecido pela alta mortalidade:
- Sobrevida média total: 29 meses
- Tempo livre de recorrência: mais de 15 meses
Para comparação, dados históricos mostram que, com o tratamento convencional, esses índices costumam ser mais baixos.
Curiosamente, alguns pacientes também desenvolveram resposta contra mutações do KRAS que não estavam incluídas na formulação da vacina, sugerindo que o imunizante pode ampliar sua atuação indiretamente.
Quais são os próximos passos?
O câncer de pâncreas, em particular, é diagnosticado tardiamente na maioria dos casos e apresenta elevadas taxas de recidiva.
“Essa vacina pode ajudar a treinar o sistema imune a reconhecer mutações específicas do tumor e prevenir recaídas”, afirma o oncologista Zev Wainberg, da Universidade da Califórnia, que liderou a pesquisa.
O próximo passo é confirmar esses achados em um estudo de fase 2, com mais pacientes e um desenho mais rigoroso, comparando o uso da vacina com outras abordagens.
Se os resultados se mantiverem positivos, a ELI-002 2P poderá se tornar parte de um arsenal de terapias complementares, ajudando a manter a doença sob controle por mais tempo e melhorando a perspectiva de pacientes que, hoje, têm poucas opções após o tratamento inicial.
Por que o câncer pode voltar?
O termo recidiva é usado pela literatura médica para definir o retorno de uma doença. No caso do câncer, ainda que em um primeiro momento ocorra a remissão completa, ele pode retornar quando pequenas áreas tumorais ficam no corpo, as "micro metástases", que não são detectáveis em exames de imagem, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO).
"Mesmo com o tratamento que tinha intenção de curar o câncer, ele pode voltar", ressalta Clarissa Baldotto, oncologista clínica e membro do Comitê de Tumores do Sistema Nervoso Central da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC).
De acordo com a SBCO, o retorno da doença pode acontecer no mesmo local onde foi diagnosticado inicialmente (recidiva local) ou em outras regiões do corpo, podendo ser uma área próxima a do diagnóstico inicial (regional) ou em outra parte do corpo, geralmente distante de onde ocorreu pela primeira vez (metastática distante ou à distância).
Por exemplo, seria o caso de um paciente inicialmente com câncer de mama, mas que na recidiva desenvolve a doença nos ossos.
Geralmente, segundo Clarissa, a recidiva é detectada em consultas de retorno, que devem ser realizadas de três em três meses no início, depois o tempo vai aumentando. Nessas consultas, os médicos costumam indicar exames como tomografia e pet-scan.