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Policiais de SP vão escolher quando ligar as câmeras corporais; entidades criticam

Novo edital do governo de São Paulo prevê que as imagens registradas pelas câmeras fiquem salvas por 30 dias; antes eram 90

Policiais de SP vão escolher quando ligar as câmeras corporais; entidades criticam
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O governo de São Paulo vai permitir que os policiais que utilizam as câmeras corporais escolham deixá-las ligadas ou desligadas durante suas ações. A informação está no edital lançado na quinta-feira (23), que prometia a ampliação do uso do dispositivo pelo governo de Tarcísio de Freitas.

O edital prevê a contratação da empresa que prestará o serviço das câmeras em junho e, na sequência, o início da implementação dos equipamentos. Serão substituídas dez mil Câmeras Corporais Portáteis (COP) antigas e adicionadas mais 2 mil para o efetivo da Polícia Militar (PM).

Atualmente, as câmeras acopladas nos coletes à prova de tiros funcionam sem interrupções durante todo o turno de serviço de 12h, nomeadas como gravações rotineiras, sem que os policiais possam escolher o momento do funcionamento. A imagem fica salva por 90 dias no Centro de Operações da Polícia Militar (Copom).

Em momentos em que o policial acredita que é necessária uma filmagem com melhor captação de áudio e resolução, como durante abordagens, o militar ou seus chefes conseguem escolher a gravação intencional. Nesse modo de uso, as imagens ficam salvas durante um ano no Copom.

Edital do governo de SP

Com as mudanças previstas no edital, o modo de uso das gravações rotineiras deixará de existir, permanecendo apenas a gravação intencional, ou seja, somente quando acionada pelo policial. As imagens ficarão salvas por apenas 30 dias.

"Qualquer pessoa que conhece o sistema Judiciário no Brasil sabe que 30 dias não são nada. Qualquer investigação no país dura mais. Então, estamos em um risco real de que evidências na apuração dos fatos sejam destruídas. É pouco tempo", afirma César Munoz, diretor da Human Rights no Brasil, organização internacional de defesa dos direitos humanos.

Além disso, na visão de Daniel Edler, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, a retirada das filmagens sem interrupção ocasionará uma redução dos registros das operações policiais e, por consequência, uma diminuição da transparência das ações, potencialmente ampliando a letalidade policial.

O NEV é uma das 18 entidades que subscrevem uma nota que afirma que, "sob o discurso da ampliação e integração dos equipamentos a outras plataformas operacionais, o edital altera radicalmente o bem-sucedido programa iniciado quatro anos atrás e coloca em risco, exatamente, o que fez do programa uma das experiências mais bem-sucedidas de compliance da atividade policial e com maior impacto no mundo todo".

O documento também questiona a redução das exigências para a empresa se habilitar à concorrência. O texto preparado pelo governo exige que o fornecedor seja capaz de prover só 4% dos equipamentos previstos na licitação. Na visão das entidades, "ao reduzir a exigência de comprovação de capacidade técnica, o edital aumenta o risco de empresas com produtos de menor qualidade técnica na área e/ou recém ingressantes oferecem condições irreais, que depois poderão comprometer o serviço prestado caso vençam o certame."

Entre as entidades que criticam o edital estão Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Instituto Sou da Paz, Instituto Igarapé, Conectas, Comissão Arns, Fogo Cruzado, entre outras.

Dia a dia do policial

Um estudo da Fundação Getúlio Vargas mostrou que o uso das câmeras reduziu em 57% o número de mortes decorrentes da intervenção policial, em relação à quantidade de óbitos sem o uso tecnologia. Na prática, 104 mortes deixaram de acontecer em 14 meses com as câmeras acopladas aos uniformes.

Com as mudanças propostas pelo edital, os próprios policiais militares correm risco maior de vida, visto os resultados positivos do uso das câmeras também para os agentes.

Segundo estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do Unicef, da ONU, o uso das COPs reduziu o número de PMs vítimas de homicídio de 18, em 2020, para 4, em 2021, e 6, em 2022.

O diretor da Humans Rights aponta que não há como prever uma situação de perigo no dia a dia do policial e colocar uma nova tarefa - ativar a câmera - pode representar mais um desafio que uma proteção.

"Você não consegue prever uma situação de perigo, que necessite de uma ação especial da polícia. O criminoso não vai avisar quando vai dar o disparo para o policial ligar a câmera. Se o controle é manual, ele não vai ligar. É óbvio. É um retrocesso do estado de São Paulo", diz César Munoz.

Justificativas do governo de SP

O governo de São Paulo alega que as mudanças ocorrem por uma redução de custos e estudos técnicos.

Segundo a Secretaria de Segurança Pública, as despesas causadas pelo uso das baterias das câmeras e a quantidade de armazenamento necessário para as gravações não estavam sendo bem aproveitadas. A pasta afirma que a nova licitação deve render uma economia entre 30% a 50% para os cofres estaduais.

No contrato anterior, cada câmera custava cerca de R$ 1 mil, o novo edital prevê o custo da unidade por volta dos R$ 500.

Um instituto de economia em Chicago, nos Estados Unidos, concluiu que a cada $1 investido nas câmeras, $5 voltavam para os cofres públicos.

"Por exemplo, uma abordagem de um policial que antes da câmera agia de forma rude, quebrando o braço de uma pessoa, a vítima precisaria do Sistema de Sáude, medicamentos, exames, um custo gigante. Simplesmente pelo fato de não ter essa força policial, em diversos casos, o custo é zero. É uma economia do governo que não faz sentido", diz Daniel Edler.

Aviso

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo, enviou um ofício no último dia 19 ao ministro Luís Roberto Barrosso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), alertando desvio de próposito das câmeras policiais por parte do estado de São Paulo, e pedindo a suspensão do edital.

Barroso decidiu que São Paulo estava comprometido com a segurança pública e descartou o pedido da Defensoria.

O ofício foi anexado com uma nota técnica sobre o uso de câmeras corporais elaborada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, pelo Grupo de Estudos de Novos Ilegalíssimos (Geni/UFF) e pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP).

"A gente não estava esperando essas novas mudanças. O governo, de fato, escondeu as ações", afirma Daniel Edler, pesquisador do NEV.

O SBT News pediu o posicionamento do Ministério Público e da Defensoria Pública, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto.

O que diz a Secretaria de Segurança Pública:

"O edital lançado nesta quarta-feira (22) foi estruturado a partir de estudos técnicos e da análise da experiência do uso da tecnologia por forças de segurança em outros países. As avaliações apontaram a maior incidência de problemas de autonomia de bateria nos equipamentos de gravação ininterrupta, bem como a elevação dos custos de armazenamento, vez que parte expressiva do material captado não é aproveitada. Tais condições inviabilizavam a expansão do sistema. Deste modo, a Polícia Militar optou por um modelo de câmera com acionamento intencional, seja pelo próprio policial ou por sua supervisão, o que amplia as funcionalidades em relação ao equipamento anterior.

Ao despachar uma ocorrência ou ser notificado por uma equipe, o Copom será obrigado a verificar se o equipamento foi acionado ou não pelo policial. Caso negativo, o dispositivo é acionado remotamente pela central de operações da PM. O acionamento seguirá rígidas regras estabelecidas pela corporação a fim de garantir a gestão operacional e a eficiência do sistema. O policial que não cumprir o protocolo será responsabilizado. A câmera terá um sistema de 'buffer', para armazenar imagens 90 segundos antes de ser acionada, para que seja possível registrar toda a ocorrência desde o início.

Nos estudos para a adoção da tecnologia, feitos com o apoio de uma consultoria especializada, foi possível verificar que na gravação ininterrupta há indícios de violação de privacidade do agente policial, que tem seus momentos íntimos tratados como de interesse público, o o que fere a LGPD e prejudica a LAI.

Todas as imagens captadas por meio dos equipamentos poderão ser acessadas de forma imediata e também ficarão armazenadas em um data center da Polícia Militar por tempo indeterminado. Atualmente, 10.125 câmeras corporais estão disponíveis, as quais permitem cobrir 52% do trabalho operacional no Estado. Com o novo edital, além de manter a cobertura atual e aperfeiçoar a tecnologia, haverá uma expansão de 18%, permitindo atender também outros comandos de policiamento", disse em nota a SSP.

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