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Com discurso populista e soluções simplistas, Javier Milei é mais do mesmo

Candidato de extrema-direita à presidência da Argentina não deve solucionar crise

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Javier Milei, candidato à presidência da Argentina e a mais nova figura da extrema-direita
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Imersa em uma crise econômica com altos índices de inflação, juros e pobreza, a Argentina votou no candidato que melhor capturou a raiva acumulada por anos de deterioração socioeconômica: Javier Milei.

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Nas primárias do último domingo (13.ago), o economista de extrema-direita e deputado do partido La Libertad Avanza (A Liberdade Avança), que se autodenomina um libertário e "anarcocapitalista", recebeu o maior número de votos, se estabelecendo como opção ao lado de Patricia Bullrich, ex-ministra da Segurança de Mauricio Macri e representante da coalizão de centro-direita Juntos por el Cambio (Juntos pela Mudança) e Sérgio Massa, atual ministro da Economia e representante da coalizão peronista Unión de la Patria (União Pela Pátria).

Para entender a ascensão de Milei é necessário olhar para o contexto socioeconômico e político da Argentina, mas também para a onda global de ultradireita que ganhou força a partir de 2008 e é responsável por levar ao poder nas grandes democracias do mundo uma direita radical e com traços populistas, como Donald Trump nos Estados Unidos, Modi na Índia, Bolsonaro no Brasil e Viktor Orbán na Hungria. É o que explica o professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e coordenador do observatório de extrema-direita, David Magalhães.

"Há elementos de caráter global que explicam uma ascensão ultradireitistas e nesse sentido transcendente à experiência Argentina. E isso está vinculado à crise de 2008, está vinculado a um refluxo que vem da globalização e que produz um problema de identidade e está vinculado também com uma crise da democracia liberal mundo afora, uma crise de representatividade", avalia.

"E tem as especificidades argentinas e elas estão vinculadas, sem dúvida nenhuma, a um contexto de crise econômica; de escalabro da política monetária, levando a essa pressão inflacionária astronômica; a um sentimento de insegurança pública; somado a um cansaço com as elites tradicionais que se alternam no poder, seja uma de centro-direita liberal, seja o velho e bom peronismo", pontua.

Promessas populistas

Assim como outras figuras políticas de extrema-direita que despontaram nos últimos anos, Javier Milei também ganhou notoriedade por seu discurso antissistema e populista. Ao saber do resultado das urnas, o político comemorou a vitória contra a "casta política" da Argentina. 

"Conseguimos construir uma alternativa competitiva que não só vai acabar com o kirchnerismo, mas também com a ladra casta política parasita, corrupta e inútil que existe neste país", disse.

Entre as principais propostas econômicas de Milei estão a dolarização da economia, o fechamento do Banco Central, abolir o limite da quantidade de dólares que cidadãos argentinos podem adquirir por mês e a redução nos gastos públicos.

Já no campo ideológico, Milei prometeu cortar relações com a China ao afirmar em um programa de televisão que não faz negócio com "comunistas". Ele quer a liberação da venda de armas e de órgãos humanos e se opõe à legalização do aborto e à educação sobre questões de gênero.

Suas ideias encontraram campo fértil na juventude argentina, a mais afetada pela desorganização da vida econômica social no país, que vê com esperança a proposta de dolarizar a economia e conter a hiperinflação. Eles também se sentem representados por Milei, que conseguiu capturar e encarnar a ideia de revolta que assola essa parcela da população.  

"Quem tem 18 ou 19 anos na Argentina nunca viu grande alternativa ao poder além dessa alternância entre peronistas e uma direita liberal. O Milei aparece como uma alternativa possível para alguém que tem 18 anos, e não viu, por exemplo, o Menem nos anos 90. Para essa juventude, essas soluções ultra-liberais parecem uma novidade, quando, na verdade, na história Argentina, não é. Outro ponto é que o Milei encarna a ideia da revolta e existe uma revolta contra o establishment político, existe uma revolta contra, digamos, a incompetência das elites políticas em resolver o problema da inflação, e por isso ele encontra mais ressonância nesses grupos", explica David. 

E pouco prováveis 

Contudo, a mestre em Economia Política e professora da PUC-SP Camila Ugino explica que a proposta de dolarização de Milei, além de simplista e pouco plausível, não é inédita no país e é, inclusive, a principal causa da Argentina não conseguir se reestruturar economicamente. 

Em 1991, no governo de Carlos Menem, a Argentina colocou em marcha a Lei da Conversibilidade, que também tinha como objetivo principal o combate à inflação e a dolarização da economia ao fixar a taxa de câmbio em 1:1 em relação ao dólar. Essa experiência durou até 2001, quando estourou a crise no país devido ao esgotamento das reservas em dólar e insustentabilidade desse câmbio.

"Nos anos 70 e 80, a economia da Argentina era uma economia gigantesca, que teve um modelo de desenvolvimento muito parecido com o do Brasil em termos industriais, mas, desde 91, a Argentina só foi perdendo. Esse processo de dolarização, na verdade, tira a autonomia monetária do país para pensar as políticas econômicas", destaca Ugino.

"A dolarização está longe de ser uma resposta econômica para a atual crise do país. Eu tenho impressão de que isso pioraria ainda mais, porque para o Estado conseguir ter acesso a esses dólares, ele teria que usar de tudo, privatizar, usar o fundo das aposentadorias, por exemplo. Imagina todo o risco social que isso acarretaria. Não é dessa maneira que a dolarização se propõe como uma saída, isso é simplesmente um populismo simples. Mas que vimos que tem um apreço social.", conclui

Inclinação à direita

Além da ascensão de Milei, há um movimento na sociedade argentina em direção à direita política. Nas primárias, Patricia Bullrich, com um posicionamento mais duro e à direita, venceu Horacio Larreta, um concorrente mais moderado, na coalizão de centro-direita Juntos por el Cambio. Enquanto a coalizão kirchnerista-peronista que hoje governa a Argentina sob o comando de Alberto Fernández, liderada pelo atual ministro da Economia, Sergio Massa, também conseguiu se manter competitiva nas pesquisas.

Os argentinos se preparam agora para o 1º turno das eleições gerais, marcado para 22 de outubro. O pleito definirá o novo presidente do país, vice-presidente, deputados e senadores. Para vencer em 1º turno, os candidatos precisam obter ao menos 45% dos votos ou 40% com uma diferença mínima de 10 pontos percentuais em relação ao segundo colocado. Caso isso não ocorra, um segundo turno será realizado em 19 de novembro.

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