A necessidade de regulação para coibir a corrupção privada no Brasil
Apesar da evolução, ainda não há subsídios legais sancionadores eficientes na legislação atual
*Integridade e Desenvolvimento é uma coluna do Centro de Estudos em Integridade e Desenvolvimento (CEID), do Instituto Não Aceito Corrupção (INAC). Os artigos têm publicação semanal.
Em 29 de janeiro deste ano, a Lei Anticorrupção brasileira (12.846/2013) completou 10 anos de vigência com números que suscitam, a princípio, questionamentos sobre sua aplicabilidade no ordenamento jurídico brasileiro.
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Segundo a CGU - Controladoria Geral da União, nesse período foram conduzidos 1.573 Processos Administrativos de Responsabilização (PARs) em decorrência da Lei 12.846/13, gerando a aplicação de multas que já ultrapassaram R$ 1 bilhão.
O texto legal faz seu aniversário de vigência no mesmo ano em que o Brasil perdeu 10 posições no Índice de Percepção da Corrupção da Transparência Internacional, registrando apenas 36 pontos em uma escala de 0 a 100, sendo que, quanto maior a nota, maior a percepção de integridade no país.
São inegáveis os avanços que a legislação anticorrupção trouxe para o país, promovendo mudanças e cuidados principalmente para as empresas que se relacionam com órgãos públicos.
Nessa esteira também se torna louvável outra iniciativa do Estado, ao exigir por meio da Nova Lei de Licitações (14.133/2021) a necessidade de Programas de Integridade para as pessoas jurídicas que participam de licitações de grande vulto.
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Tais avanços, ainda que possam ser considerados tímidos, não deixam de ser notáveis para um país que discute o tema de maneira estruturada há apenas dez anos.
Evoluímos no combate à corrupção pública não apenas no arcabouço legal, mas também para um olhar da sociedade e da mídia em relação ao tema.
Porém, esse mesmo avanço não encontra velocidade quando nos referimos ao setor privado e mais precisamente à prática da chamada: corrupção privada.
A corrupção privada, em uma definição simplista, seria o ato de receber vantagem indevida, como empregado ou representante de empresa ou instituição privada, favorecendo a si ou a terceiros.
Nesse caso, em exemplos práticos, poderia ser aquele empregado que favorece determinado fornecedor, que utiliza conhecimento técnico naquela unidade de negócio para desviar itens ou mesmo obter informações sensíveis que poderão ser utilizadas em seu benefício próprio.
Nesses últimos 10 anos, as empresas muito evoluíram e investiram em suas áreas de Integridade ou Conformidade, com a realização de comunicação, treinamentos, bem como a implantação de canais de denúncia.
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Afinal, além de prevenir os ilícitos, os bons Programas de Integridade também são capazes de detectar atividades fraudulentas dentro dos ambientes corporativos, resultando em diversos casos no desligamento dos colaboradores envolvidos.
Apesar de toda a evolução trazida até este momento, não há subsídios legais sancionadores eficientes na legislação atual, quando falamos em corrupção privada.
Por diversas vezes, após um árduo trabalho de investigação interna corporativa, a empresa tem ao seu dispor apenas o desligamento do colaborador autor da corrupção.
Assim, ainda que por diversas vezes tal desligamento seja realizado pela modalidade da “justa causa” e o ilícito ser tipificado em diversos outros tipos penais, o agente fraudador pode, em poucos meses, estar inserido novamente em outra empresa, repetindo a mesma conduta.
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Vale ressaltar que a prática da corrupção privada encarece o produto final de uma empresa, atrapalhando seu desenvolvimento, impactando diretamente na geração de emprego.
Os países europeus já discutem o tema, mais precisamente, desde o ano de 2003, quando a União Europeia determinou que a prática de corrupção privada fosse considerada crime.
Estamos mais do que atrasados na matéria, lesando empresas que, em sua essência, já sofrem com outros problemas sistêmicos do país, como a altíssima carga tributária e demais dificuldades burocráticas.
Em março deste ano, ganhou força na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 4436 de 2020, que tipifica o crime de corrupção privada sujeitando seus autores a penas de até quatro anos e multa.
Tal medida, ainda que inicial, necessita de total apoio da sociedade e os parlamentares para avançar, adicionando um horizonte promissor para a integridade corporativa, corroborando para que os próximos 10 anos tragam avanços para as empresas, população e sociedade.
*Integridade e Desenvolvimento é uma coluna do Centro de Estudos em Integridade e Desenvolvimento (CEID), do Instituto Não Aceito Corrupção (INAC). Os artigos têm publicação semanal.