Contribuição do Brasil para conter crise climática é mais do que significativa
Frear desmatamento e reduzir emissões devem estar entre principais objetivos do governo
Camila Stucaluc
A volta do Brasil na pauta ambiental acontece em meio aos últimos alertas sobre o avanço da crise climática, fazendo com que o governo precise entregar, mesmo que a longo prazo, resultados significativos. Isso porque a Amazônia é classificada como papel-chave na segurança climática e, portanto, coloca o país em um dilema, já que o território brasileiro é o sexto maior emissor de gases de efeito estufa no mundo, sendo que a grande maioria é produzida por mudanças no solo da terra: desmatamento.
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Depois de um resultado positivo em janeiro, a devastação na Amazônia voltou a crescer. Segundo dados do Imazon, foram derrubados 325 km² de floresta em fevereiro, área equivalente ao tamanho de Belo Horizonte, por exemplo. Para Stela Herschmann, especialista em política climática do Observatório do Clima, a atual promessa do governo de enfrentar e zerar o desmatamento até 2030, caso cumprida, será uma das medidas essenciais para conter o aumento da temperatura em 1,5ºC.
Isso porque, apenas no ano passado, a devastação do bioma foi responsável por 50% das emissões brasileiras, auxiliando no avanço do aquecimento global. "É interessante avaliarmos que essas emissões, diferente das emissões de outros países, são uma produção que não gera riqueza para a população. Então, na verdade, o Brasil produz hoje menos PIB (Produto Interno Bruto) para o país com mais emissões, indo na contramão do que o mundo está fazendo", avalia Stela.
O mesmo é dito por Rodrigo Jesus, porta-voz de Clima e Justiça do Greenpeace Brasil, que reforça que a Amazônia "não é a mesma de 20 anos atrás" e, consequentemente, os impactos da devastação são maiores. Para conter as atividades, ele sugere políticas públicas de monitoramento da área, bem como melhores medidas de fiscalização das atividades agropecuárias - grande responsável pela destruição no bioma. A demarcação de terras indígenas também é priomordial, uma vez que dificulta o garimpo ilegal.
A matriz energética é outro ponto que precisa ser melhorado no Brasil. Apesar do país estar investindo e crescendo no setor de energia renovável, muitas infraestruturas ainda apelam para a queima de combustíveis fósseis. Um exemplo disso é a Eletrobras, que, após ser privatizada, prometeu a construção de novas termelétricas, o que pode acabar gerando emissões desnecessárias para o futuro, contribuindo para o efeito estufa.
"Outro ponto relevante é que o Brasil precisa encarar e colocar como prioridade as medidas de adaptação. O Plano Nacional de Adaptação Climática (PNA), elaborado em 2016, precisa ser revisado e implementado com recurso alocado, garantindo ampla participação popular na sua elaboração, execução e avaliação. O plano é a principal medida para diminuir os impactos com os eventos extremos que já estamos presenciando no país, como enchentes, deslizamentos de terra, secas, vendavais e friagens", diz Rodrigo.
Quanto mais rápido o governo adotar medidas eficazes contra a crise climática, maior serão as chances de ter resultados. Isso porque, como sede da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) em 2025, o Brasil precisará apresentar o avanço da agenda ambiental, mesmo que inicialmente. Segundo Stela, o evento será de extrema importância para o país recuperar a credibilidade internacional, uma vez que, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), muitas metas ambientais foram deixadas de lado.
Impactos atingem população mais vulnerável
Considerada uma "bomba relógio" pela Organização das Nações Unidas (ONU), a temperatura global já está 1,1ºC acima da era pré-industrial - um sinal de atenção. No início da semana, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) fez um novo alerta para o avanço da emergência climática, reforçando que, caso a temperatura atinja 2ºC, mesmo que temporariamente, os riscos de perda de biodiversidade, extinção de espécies e dano de ecossistemas aumentarão significativamente.
O cenário impactará, sobretudo, a população mais vulnerável - atualmente quase metade dos habitantes globais. No Brasil, segundo os especialistas consultados pelo SBT News, os principais atingidos serão negros, pessoas que moram em periferias, mulheres chefes de família, ribeirinhos, comunidades tradicionais e povos indígenas, que, no contexto urbano, já vivem em áreas de risco. Animais pertencentes à Amazônia também estão na lista, já que o bioma pode registrar impactos irreversíveis.
"Se não tivermos medidas para limitarmos a temperatura global em 1.5ºC enfrentaremos riscos cada vez mais altos e mais cedo do que imaginávamos com a crise climática, e não estamos preparados para suas consequências, algo que está nos custando vidas. O aumento de incêndios, enchentes, vendavais, secas e outros eventos extremos ficarão mais intensos e frequentes. Podemos e devemos reduzir pela metade as emissões globais até 2030. Esta é uma realidade preocupante, mas há esperanças", afirma Rodrigo.
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