Mercado financeiro testa prós e contras de Haddad na Fazenda
No primeiro pregão pós Copom e PEC da Transição no Senado, Ibovespa cai 1,67% aos 107.249 pontos; dólar sobe
Ao fechar negócios no primeiro pregão pós-Copom -- com Selic mantida nos 13,75% a.a. até o fechamento de 2022 --, o mercado financeiro, de novo, passou o dia monitorando mais a política do que propriamente os desígnios dos números frios da economia. Não que não faça diferença o tamanho da liberalidade presente na PEC da Transição -- aprovada em dois turnos no Senado, a caminho agora da Câmara --, mas o mercado quer mais.
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O próprio comunicado do Banco Central, após decisão sobre os juros, apontava um aumento da preocupação com o que virá pela frente em termos de desafios e de arcabouço fiscal no governo Lula -- dado que o Teto de Gastos é tido como coisa do passado pelos analistas. Ao final, a proposta aprovada no Senado abre espaço para gastos ao redor de R$ 200 bilhões se somados os R$ 145 bi em gastos fora do teto, mais recursos adicionais se houver excedente de arrecadação e, ainda mais, o emprego de recursos do PIS/PASEP não retirados. Houve até alguma surpresa, sim, quanto à folga com que a PEC passou no Senado: o governo eleito e aliados faziam contas iniciais de 55 votos a favor da proposta, mas, na alta temperatura da votação, o texto obteve 64 votos favoráveis, bem acima da expectativa.
Na Câmara, o embate promete ser mais aguerrido, e é considerado o primeiro grande teste para a base de apoio de Lula -- antes mesmo do início do governo. Seja como for, quem participa das negociações ou observa o cenário com atenção, acredita que é possível que a PEC vá adiante no Legislativo. Isso até já estaria "nos preços" discriminados pelo mercado. "Ainda que na Câmara haja alguma resistência ao texto, com potenciais movimentos de supressão a pontos específicos da matéria vinda do Senado, é pouco provável que encontre entraves maiores para sua aprovação de maneira célere", analisa Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos.
Onde pega
É sobre a nova âncora fiscal a ser defendida pelo governo eleito que os investidores não têm segurança; julgam que, até agora, Lula ainda não sinalizou com um mínimo de transparência como será a condução da política que é a responsável pelo equilíbrio das contas públicas. E de incertezas o mercado não gosta. Digerindo essas dúvidas e a perspectiva de que Fernando Haddad, tido como favorito a assumir a Fazenda, seja efetivamente nomeado por Lula para o cargo nesta 6ª feira (9.dez), o mercado reforçou os questionamentos: quer saber mais o que Haddad pensa para a economia, quer ao menos pistas críveis sobre o que vai referenciar a política fiscal na arrancada do governo eleito. Sem respostas até o momento, o Ibovespa desceu 1,67% até os 107.249 pontos. No câmbio, dólar em alta de 0,20% cotado para venda a R$ 5,21.
Meio termo
Mas nem tudo é dúvida ou má notícia no terreno político-econômico. Na véspera de sua provável nomeação, Fernando Haddad se reuniu com o atual ministro da Economia, Paulo Guedes, num encontro classificado pelo petista como "excelente". À parte o conteúdo possível da conversa e até o estabelecimento de uma "rotina de trabalho a partir da semana que vem", como reportou Haddad, o contato com Guedes neste momento tem outro peso: fica indelével a sinalização de que o homem de Lula para a pasta, seu representante no setor, deve mesmo ser o ex-prefeito de São Paulo.
Na mesma direção tem ido a leitura do mercado sobre a sondagem a Roberto Campos Neto para um novo mandato à frente do Banco Central do Brasil (BCB). Eventos que, somados, levam especialistas a enxergar um viés mais "ao centro" para a condução da economia no mandato petista. Nada de arroubos pouco ortodoxos.
"É público e notório o esforço de Lula em empoderar Haddad e fazer deste seu sucessor direto já em 2026, uma vez que a idade avançada do presidente deve frustrar a perspectiva de um segundo mandato", aposta o economista André Perfeito. Com este fim, arriscar além da conta na agenda econômica pode queimar a aposta do PT para resgatar o protagonismo num governo repleto de nomes, legendas e alianças, o caldo políticamente temperado na medida para apontar herdeiros vorazes pela paternidade dos bons resultados -- se eles vierem.
"Corrobora com essa percepção notícia de hoje (8.dez) que o atual presidente do BCB, Campos Neto, foi sondado para um eventual segundo mandato. Se for confirmada a sondagem, é mais um sinal do centrismo econômico de Lula e mais uma vez sugere receios exagerados do mercado. Ao que tudo indica Lula já está jogando uns quatro anos na frente"
André Perfeito, economista
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