Câmara aprova Projeto de Lei que regulamenta o mercado de carbono
Prioridade do governo no Congresso, texto retorna agora para análise do Senado
Guilherme Resck
O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta quinta-feira (21.dez), o Projeto de Lei (PL) que regulamenta o mercado de carbono no país. Foram 299 votos a favor do texto-base, 103 contrários, uma abstenção e seis obstruções. Após essa votação, os deputados deliberaram sobre um destaque apresentado pelo Psol. Acabou rejeitado, com apenas 81 votos a favor do destaque e 301 contrários.
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O PL é uma das proposições que o Governo Federal tem como prioridades neste semestre, na relação com o Congresso Nacional. Ele retorna agora para análise do Senado.
O relator do projeto, deputado Aliel Machado (PV-PR), realizou modificações na versão que chegou à Casa após ser aprovada no Senado, em outubro. Entre as principais mudanças, está a criação de um fundo para estimular a descarbonização do país e a busca por uma economia mais sustentável, com fomento de pesquisa e desenvolvimento para soluções tecnológicas; a definição das titularidades dos créditos de carbono a serem comercializados com a preservação e restauração de florestas; e um reforço da autonomia das comunidades indígenas e povos tradicionais e garantia de um percentual mínimo para eventuais projetos que estas comunidades e povos decidam fazer em seus territórios.
Em entrevista ao SBT News no mês passado, a bióloga e engenheira ambiental sanitarista Marta Camila Carneiro, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV), explicou o que é o mercado de carbono.
Segundo a especialista, trata-se de "uma forma de 'punir' as empresas que, de alguma maneira, não desenvolvem estratégias para evitar a emissão de gases do efeito estufa na atmosfera". "Gás carbônico, gás metano, etc. Como evitar a emissão de gases? Implementando estratégias de tecnologias limpas, na transição energética, evitando desmatamento, pensando numa produção sustentável, pensando em sistemas agroflorestais, fazendo essa transição energética do uso de combustíveis fósseis para o uso de energias limpas, etc.".
Empresas que não investem nisso, disse a professora, "acabam tendo que comprar créditos de carbono de empresas e governos que investiram e que diminuíram as suas emissões de gases". E é isso o mercado de carbono, ressalta. Ou seja, ele consiste na compra de créditos de carbono por pessoas físicas/jurídicas ou governos para compensar a não redução de uma emissão de gás do efeito estufa por parte deles próprios, de outras ou outros que fizeram a diminuição.
Comprar crédito de carbono significa pagar por aquilo que não se conseguiu deixar de emitir de gases. "Você está pagando por isso. Então, para que você fique bonito na fita, perante a sociedade, você está compensando, por meio de um valor financeiro, aquilo que você não conseguiu deixar de emitir", complementou Marta Camila.
Atualmente, no Brasil, o mercado de carbono não é regulado, mas ocorre de forma voluntária, conforme elucida a professora. Esse mercado voluntário, explica, "é destinado tanto para organizações, empresas, como para pessoas físicas. Tipo eu. Eu posso ir lá e comprar o meu crédito de carbono se eu quiser".
Emendas acatadas
Entre as emendas ao Projeto de Lei que regulamenta o mercado de carbono apresentadas por deputados federais e acatadas por Aliel Machado, está uma que "incorpora ao texto dispositivo segundo o qual as unidades de tratamento e destinação final ambientalmente adequada de resíduos serão consideradas a partir do seu potencial transversal de mitigação de emissões de gases de efeito estufa, não estando sujeitas aos limites de emissão de que trata a lei, quando comprovadamente adotarem sistemas de tecnologias para neutralizar tais emissões".
Outra adiciona um "artigo ao projeto prevendo obrigação de compensar emissões veiculares por meio de aquisição de ativos ambientais de empresas credenciadas em órgãos de trânsito que receberam 30% da receita oriunda da aquisição desses créditos".
Críticas
Entre os parlamentares que criticaram o projeto durante a discussão dele no plenário da Câmara, esteve Marcel van Hattem (Novo-RS).
"Nós temos uma opinião de que ele não vai resolver o problema. Um projeto que não ataca o principal problema, aliás, que é o desmatamento, que o PT e o Lula disseram tanto que ia combater e está aumentando. É um projeto que vai prejudicar a economia, com um viés arrecadatório, e vai inviabilizar a comercialização internacional a partir do Brasil dos créditos de carnono. Então nós temos vários motivos para ser contra", afirmou o parlamentar.
Eli Borges (PL-TO) também criticou o texto. "Inicialmente, essa questão do inoportuno mercado interno, essa questão do carbono, ela é uma defesa que faz os países ricos em detrimeto dos países pobres. De fato, os paises ricos, que já desmataram, que já prejudicaram o meio ambiente, que já fizeram o que não deveria fazer, ficam o tempo todo usando os países que não conseguiram ainda ser muito ricos e, portando, fazendo a busca nesta questão sem nenhuma devolução financeira a priori, mas para que eles continuem poluindo o nosso ar, para que eles continuem poluindo esse nosso espaço terrestre, mas nunca fazendo a devida correspondência com relação a essa questão do mercado de carbono, essa questão da poluição", pontuou.
Defesa
Pouco antes da votação, no plenário, Aliel Machado disse que apresentou "o melhor texto". "Que é aquele que vai cumprir com suas obrigações e que não, em nenhum momento aqui, agride o direito à propriedade, a nossa industrialização, o crescimento econômico, e principalmente que protege o nosso meio ambiente, na lógica do mercado, que é o que propõe o projeto".
Bate-boca
Durante a apreciação da matéria no plenário da Câmara, Marcel van Hattem bateu boca com o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Lira interrompeu o deputado para dizer que ele estava desviando-se da questão em debate, ao usar a palavra sobre a proposição em discussão, o que o regimento interno veda. O parlamentar do Novo disse que Lira não poderia interrompê-lo. O presidente da Câmara, porém, falou que podia, sim, e que devolveria seu tempo de fala na sequência.
Logo depois, porém, Marcel van Hattem pontuou: "Vossa excelência não pode interromper o parlamentar na tribuna de forma autoritária como vossa excelência tem resolvido questões aqui. É tirania da mesa, senhor presidente, e eu não tolero, não admito. Vossa excelência acha que pode, e pode muito, mas não pode tudo. E muito menos constranger e ameaçar parlamentares aqui". Lira, então, cortou o microfone e chamou o próximo orador. Porém, Marcel continuou falando.
"Vai aprender a respeitar o regimento, deputado Marcel van Hatten", provocou Lira. Posteriormente, quando o microfone foi retomado, o deputado do Novo declarou: "Eu passo para a deputada Julia [Zanatta], mas lamento a covardia de um tirano nesta Casa". Ele se referia a Lira. A fala foi aplaudida por outros deputados. Assim, Lira afirmou: "Essas brincadeiras no plenário vão acabar, deputado".