CPI do MST termina sem votação do relatório de Ricardo Salles
Deputados vão entregar a Lira lista de projetos que endurecem penas contra invasores de propriedades
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do MST, da Câmara dos Deputados, terminou sem votar seu relatório final. O prazo de funcionamento do colegiado foi até 3ª feira (26.set).
+ Leia as últimas notícias no portal SBT News
Ontem, a comissão anunciou o cancelamento de uma sessão que estava marcada para a data para debater o documento, elaborado pelo deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), e pontuou: "A informação extraoficial é de que os trabalhos serão prorrogados até a próxima 5ª feira (28.set) para que se cumpra o prazo regimental de duas sessões em virtude do pedido de vista ao relatório final. Nesta ocasião será discutido e votado o relatório final". Entretanto, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não prorrogou.
Nesta 4ª feira (27.set), o presidente da CPI, deputado Zucco (Republicanos-RS), e o relator concederam uma entrevista coletiva, no Salão Verde da Câmara, para apresentar as conclusões da comissão. "Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer a todos os deputados e deputadas que estiveram ao nosso lado nesses quase quatro meses de convivência e muito trabalho. Deputados leais ao Brasil e aos brasileiros. Que procuraram ressaltar a importância não só do agronegócio, mas o respeito ao direito inalienável da propriedade privada. Ao deputado Ricardo Salles, o meu muito obrigado", disse Zucco na ocasião.
"Parceiro de primeira ordem, corajoso e preparado. Que mesmo com todas as dificuldades entregou um relatório denso e consistente, um verdadeiro legado para a nossa sociedade. Da mesma forma, meu muito obrigado a todos vocês jornalistas e imprensa que cobriram a CPI do MST. O trabalho de todos foi fundamental para que a sociedade brasileira pudesse tomar conhecimento sobre o que está acontecendo no Brasil".
Ele prosseguiu dizendo que "o instituto da propriedade privada, previsto na Constituição Federal, corre sérios riscos de desaparecer". "Estamos vendo isso acontecer na questão do Marco Temporal, onde milhares de produtores correm o risco de perder suas terras sem nenhuma indenização. Em outra frente, estamos testemunhando o avanço do MST sobre áreas produtivas, respaldados pelo Governo Federal e em decisões do nosso Judiciário".
De acordo com Zucco, "isso é um convite e tanto para os invasores". "Infelizmente, as informações que nos chegam é que uma vez encerrada esta CPI, haverá uma nova escalada de violência e terror no meio rural".
Ainda em suas palavras, "por meio de documentos, relatos de testemunhas e diligências em acampamentos, a CPI do MST descobriu uma verdadeira indústria de invasões de terra. Por trás dessa máquina de terror, existe uma organização criminosa, que se aproveita do fracasso do nosso modelo de reforma agrária para a prática dos mais variados tipos de crimes".
Ele afirmou acreditar que a CPI "conseguiu expor as vísceras do movimento para toda a sociedade brasileira. Aquela imagem do MST Robin Hood que tira dos ricos para distribuir aos pobres foi completamente desmascarada".
Mexer com o MST, disse, "é enfrentar forças poderosíssimas". "A CPI incomodou demais, avançou muitos sinais e foi pressionada a encerrar suas atividades quando convocou o ministro da Casa Civil, Rui Costa, ex-governador da Bahia, estado campeão nas invasões de propriedades rurais e urbanas, privadas e públicas. A convocação foi desfeita por um ato da Mesa Diretora que apontou inconsistência do requerimento".
Ele pontuou que sete membros titulares da comissão, mais "alinhados na defesa da propriedade privada", foram substituídos por perfis governistas. "Tudo isso em meio a negociações por cargos e espaços generosos na administração pública. Este Governo Federal joga baixo e cobrou a conta dos partidos governistas e dos cargos entregues", atacou.
"Isso prejudicou diretamente na aprovação do relatório, uma vez que tínhamos e temos os votos necessários para a aprovação do texto final. Para fazer frente a tudo isso que testemunhamos, estamos entregando ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, uma lista de projetos que endurecem as penas contra os invasores de propriedades, batizado de Invasão Zero. Esse pacote legislativo reúne propostas apoiadas pela Frente Parlamentar da Agropecuária".
Segundo Zucco também, nos próximos dias será lançada a Frente Parlamentar Invasão Zero. "Formada por deputados e senadores, o colegiado terá como objetivo a fiscalização e a tomada de providências para imediata desocupação de áreas invadidas", complementou.
Conforme Ricardo Salles, o trabalho da CPI será entregue nas mãos do procurador-geral da República, da Procuradoria-Geral Eleitoral e de "todas as autoridades", inclusive o Tribunal de Contas da União (TCU).
Salles ainda afirmou: "Entendo que o trabalho da CPI, de todos os aqui presentes, chegou a bom termo, ainda que, como disse o presidente Zucco, manobras regimentais e cooptação governamental tenham feito com que, do ponto de vista meramente formal, o relatório não tenha tido a votação para a sua aprovação".
Contraponto
Deputados governistas integrantes da CPI do MST deram uma entrevista coletiva hoje também para fazer um contraponto ao relator da comissão. Os presentes usavam bonés do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. "Nós estamos celebrando aqui o final da CPI do MST, uma CPI que foi criada, como foi denunciado por todos nós aqui desde o início dela, de ter sido instalada sem ter um fato determinado", disse Nilto Tatto (PT-SP) na ocasião.
"E, como ficou patente do próprio relatório apresentado pelo relator, que no final inclusive ele termina dizendo que o Brasil não precisa de reforma agrária, sabendo que hoje a gente tem cerca de 100 mil famílias cadastradas no Incra e aproximadamente 70 mil famílias acampadas, aguardando um lote para poder construir suas famílias, construir perspectiva de vida para essas famílias e contribui para os grandes desafios que o Brasil tem".
Ele prosseguiu: "Em especial enfrentar o desafio da fome, o desafio da inflação do preço dos alimentos e ajudar no desafio inclusive do próprio modelo da agricultura e que nós precisamos também produzir alimento saudável. Então é uma CPI que não tinha fato determinado e que foi criada justamente para criminalizar os movimentos que lutam pela reforma agrária, sabendo que lutar por direitos, não importa qual deles, tem garantido na própria Constituição, é do ponto de vista jurídico legal e é constitucional, em especial num Estado democrático".
Ainda na coletiva, ele citou a existência de um voto em separado e de um relatório paralelo ao de Salles elaborados com o apoio dele (Tatto) e de outros deputados governistas do colegiado. "Nesse voto em separado a gente denuncia as atrocidades cometidas pela direção da CPI. Para vocês terem uma ideia, eu estive acompanhando inclusive uma diligência. Como é que pode parlamentares desta Casa, envergonham esses parlamentares, adentrando um barraco de uma família sem ter mandado judicial, de uma família que está ali num barraco provisório aguardando um lote?".
Ainda de acordo com ele, deputados da CPI arrombaram cadeado de sede de associações sem mandado judicial e adentraram terra indígena sem ter a devida autorização da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) ou da comunidade indígena. "Trazendo para esta CPI denúncias vazias, sem a possibilidade e sem ir lá e conversar com a comunidade para verificar se aquelas denúncias têm algum fundamento. Enfim, não apurou nada, como já era previsto, porque nós estamos encerrando sem relatório. É a quinta CPI para tentar apurar crime dos movimentos que lutam pela reforma agrária, sabendo que nenhuma outra conseguiu apurar crimes", acrescentou.