Cloroquina, falta de O2 e de vacinas: por que Pazuello não quer falar
Após decisão do STF, relator mudará estratégia de perguntas e focará em contradições do ex-ministro
Gabriela Vinhal
Atraso na aquisição de vacinas, ampliação do uso da cloroquina, alta no número de mortes por covid, crise no Amazonas e colapso no Sistema Único de Saúde. Esses são os temas que assombram o ex-ministro da Saúde general Eduardo Pazuello na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid. Quase dois meses após sua saída do governo, ele é considerado peça chave na investigação sobre as causas do Brasil ter se tornado epicentro da doença. Mas, na 4ª feira (19.mai), só poderá responder perguntas relacionadas a terceiros, e terá o direito de ficar em silêncio sobre sua conduta à frente da pasta.
Isso porque o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski atendeu a um pedido de habeas corpus feito pela Advocacia-Geral da União (AGU), que pedia que o ex-ministro pudesse não responder perguntas sobre ele próprio, uma vez que já é alvo de um inquérito no Ministério Público Federal no Amazonas. A oitiva do ex-ministro era a mais aguardada pelos parlamentares, principalmente pelo relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), uma vez que Pazuello ficou por 10 meses no cargo e é próximo ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
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Cinco requerimentos que pediam a convocação do general foram apresentados ao colegiado. Um, inclusive, por Eduardo Girão (Podemos-CE), senador independente, mas alinhado ao Palácio do Planalto. O depoimento dele foi remarcado para 4ª feira (19.mai), após ser reagendado. Inicialmente, Pazuello falaria em 5 de maio, mas alegou ter tido contato com pessoas diagnosticadas com covid. Nos bastidores, aliados do governo alegavam que o ex-ministro temia ser preso em flagrante pela CPI, instalada para apurar a conduta do governo no enfrentamento ao coronavírus.
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Até o momento, já foram ouvidas seis testemunhas na comissão, que contribuiram para a lista de indagações que serão feitas ao general. Por exemplo, a última oitiva, com o gerente-geral da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo, evidenciou a falta de empenho do ex-ministro na aquisição de vacinas. Seis ofertas foram recusadas -- e algumas sequer respondidas -- até que o governo concluísse o contrato, em 8 de março. Na ocasião, o Brasil enfrentava o início da segunda onda da covid-19 e registrou, em 24 horas, 1.389 mortes pela doença.
Perguntas sobre terceiros
Com a decisão do Supremo, Calheiros e os parlamentares independentes e da oposição, que compõem o "G7", irão mudar a estratégia das perguntas, pois, segundo a decisão da Corte, Pazuello poderá ficar em silêncio apenas sobre ele, mas não sobre terceiros, como a respeito de orientações de Bolsonaro nas medidas de combate à pandemia. O grupo aposta em eventuais contradições do ex-ministro e, com isso, avanço nas investigações.
Aliados do emedebista afirmam que, ainda assim, será usado como base das perguntas, além das informações já reunidas nos depoimentos passados, o documento feito pela Casa Civil com acusações atribuídas ao governo durante a pandemia. A lista foi disparada aos ministérios logo após a instalação da CPI. Entre os principais pontos estão: a falta de campanhas para prevenção da covid; o tratamento precoce; a negligência na crise no Amazonas; o disparo de fake news; o atraso na vacinação; a indicação de gestores não especializados à frente da Saúde e a falta de testes e do "kit intubação".
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O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), lamentou a decisão de Lewandowski e disse que tira a oportunidade de os senadores esclarecerem os motivos para o atraso nas vacinas. "O Supremo que ordenou que o Senado abrisse a CPI é o mesmo que tira a oportunidade de um ex-ministro da Saúde esclarecer os fatos. E justamente o que mais tempo ficou no Ministério da Saúde durante a pandemia, que poderia ter ordenado a compra de vacinas", afirmou.
Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente do colegiado e um dos autores do requerimento de convocação de Pazuello, afirmou que recebeu a decisão do Supremo "com tranquilidade" e que "é assim que funciona a democracia". "Mas esperamos que ele tenha ciência de que seu depoimento não é o único meio que buscaremos para elucidar essa tragédia que ocorre no país", completou.
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