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Suposto integrante do “gabinete do ódio” caiu em contradições ao depor na PF

Tercio Arnaud, cujo depoimento tornou-se público nesta sexta-feira (15), esteve próximo a Bolsonaro em momentos cruciais da suposta trama golpista

Suposto integrante do “gabinete do ódio” caiu em contradições ao depor na PF
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Ao longo de 41 páginas e 157 perguntas feitas pela Policia Federal, o assessor técnico do Partido Liberal Tercio Arnaud Tomaz confirmou que esteve perto do então presidente Jair Bolsonaro em momentos marcantes de uma suposta trama golpista. O depoimento - cujo sigilo foi retirado nesta sexta-feira (15) pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes - foi colhido pelos investigadores na sede da PF, em Brasília (DF), em 22 de fevereiro de 2024, data em que Bolsonaro também compareceu para depor, mas preferiu o silêncio.

Embora tenha negado envolvimento em qualquer tentativa de golpe, Tercio confirmou à Polícia Federal que esteve no Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência da República, em episódios cruciais sob investigação. Indagado sobre o que viu e ouviu enquanto frequentou o núcleo presidencial, esquivou-se. E foi auxiliado pelo advogado em momentos tensos do interrogatório, como as contradições que emergiram no depoimento. Um exemplo de saia justa em que o depoente se viu tem como pano de fundo o empresário argentino Fernando Cerimedo.

Live

Cerimedo trabalhou nas últimas eleições argentinas como estrategista da campanha que elegeu Javier Milei presidente. Mas tornou-se conhecido pelos brasileiros no dia 4 de novembro de 2022. Ele fez uma transmissão, pelo YouTube, cinco dias após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva, com questionamentos sobre as urnas eletrônicas. O conteúdo da live, segundo a Justiça Eleitoral brasileira, baseou-se em premissas falsas, com o intuito de fomentar a insurgência popular contra o resultado do pleito.

Perguntado se conhecia Cerimedo, o depoente negou. Questionado se sabia sobre algum pagamento feito a Cerimedo por ter feito a live, declarou desconhecer o assunto. Negou também ter dado qualquer tipo de suporte técnico, tampouco ter contribuído com parte do conteúdo abordado na transmissão. Tercio alegou sequer ter assistido à live, e afirmou não saber se as falas de Cerimedo embasaram um “Relatório de Fiscalização do Sistema Eletrônico de Votação”, apresentado pelo Ministério da Defesa no dia 9 de novembro de 2022.

Respondidas as perguntas, a Polícia Federal colocou Tercio contra a parede. Mostrou ao depoente um diálogo por WhatsApp, entre ele e o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, minutos após o encerramento da live de Cerimedo. Na ocasião, Tércio compartilhou com Mauro Cid, via nuvem, o arquivo com a gravação da live.

Conforme registros de entrada e saída do Palácio da Alvorada, Tercio esteve na residência oficial do então presidente no mesmo dia da transmissão. A Polícia Federal perguntou, então, se Bolsonaro ou o filho Carlos Bolsonaro haviam encomendado a gravação da live. O depoente respondeu que o fez por vontade própria. Entretanto, ao mesmo tempo, afirmou não se lembrar se alguém pediu para ele acompanhar ou editar a live. Por fim, declarou que fez a gravação por receio de que o conteúdo fosse retirado do ar, deduzindo que seria de interesse do “pessoal”.

Tercio foi questionado ainda sobre o motivo de ter ido ao Palácio da Alvorada no dia 12 de novembro de 2022, um sábado. Nessa data, oficiais de alta patente das Forças Armadas reuniram-se em um apartamento da Asa Sul, em Brasília, no mesmo prédio onde morava o então Ministro da Defesa, Paulo Sérgio de Oliveira.

Para contextualizar, a Polícia Federal apontou elementos do que seria a pauta do encontro, no qual estaria em debate o questionamento das eleições. Os policiais cercaram Tércio com perguntas que poderiam indicar a participação de Bolsonaro por videoconferência na reunião.

Tercio afirmou não se lembrar de detalhes. Minimizou o fato de ter ido ao Alvorada nesse dia, e disse que tinha livre acesso ao Palácio. Afirmou que “era normal” ir à residência oficial, a pedido do presidente, mesmo nos fins de semana. E acrescentou que costumava almoçar com Bolsonaro nessas ocasiões.

Hacker

A Polícia Federal perguntou se Tércio participou da fatídica reunião entre o então presidente Jair Bolsonaro e ministros de Estado, em 5 de julho de 2022. Na ocasião, conforme conteúdo gravado e tornado público pelo STF, Bolsonaro orientou os participantes a questionarem publicamente as urnas eletrônicas, além de difundir a narrativa de possíveis fraudes nas eleições.

“O declarante informa que não se recorda de haver participado dessa reunião, que não se recorda de ter recebido essa ordem e que, portanto, não a cumpriu”, registrou a policia, no termo de depoimento.

Tomaz foi questionado ainda se conhecia o hacker Walter Delgati Netto, que declarou publicamente ter agido a pedido da deputada Carla Zambelli para desacreditar o Poder Judiciário. Trazido ao seio do Poder Executivo pela parlamentar, o hacker participou de uma reunião no Ministério da Defesa e até se encontrou com Bolsonaro no Palácio da Alvorada, em 10 de agosto de 2022. Questionado se participou desses encontros com a presença do hacker, Tomaz negou.

“O declarante afirma que nunca conheceu pessoalmente Walter Delgati Netto; que nunca esteve no mesmo ambiente; que nunca participou de reuniões em que Walter estivesse presente; que o declarante apenas veio a saber da existência de Walter Delgati Netto por meio da imprensa”, anotou a PF no depoimento.

Quem é Tercio?

As três primeiras perguntas do interrogatório traçam um resumo da trajetória oficial de Tercio junto a Bolsonaro. Ele respondeu ter exercido o cargo de “assessor especial da assessoria especial da Presidência da República, durante todo o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro”. Afirmou ter se licenciado somente entre julho e outubro de 2022, quando candidatou-se a suplente de senador pela Paraíba, tendo retornado ao cargo após a derrota na eleição. Com o fim do governo Bolsonaro, Tercio foi realocado no Partido Liberal.

A suspeita, no entanto, é que Tercio tenha integrado o chamado “gabinete do ódio”, onde teriam sido gestadas e implementadas estratégias de milícia digital. Essa hipótese segue sob investigação da Polícia Federal.

Tércio Arnaud é de Campina Grande, na Paraíba. Foi descoberto por Carlos Bolsonaro entre 2013 e 2014 após a página “Bolsonaro Opressor” no Facebook ter ganhado visibilidade. Ele a usava para publicar elogios a Jair Bolsonaro, além de atacar, com memes, os adversários do então deputado federal.

O perfil pessoal de Tercio no Instagram, atualmente com 29,4 mil seguidores, não está muito longe disso. Quase todas as publicações se dividem entre favoráveis a Bolsonaro e contrárias ao presidente Lula. Pouco ou quase nada sobre o próprio dono do perfil.

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