Racismo: 1 em cada 3 pessoas negras relata discriminação no acesso a produtos e serviços
Pesquisa revela que supermercados, varejo e shoppings são os principais espaços onde consumidores negros enfrentam abordagens seletivas

Juliana Tourinho
Mais de 30% da população negra no Brasil já passou por algum episódio de racismo no momento de consumir produtos ou serviços.
Seja de forma sutil ou explícita, o preconceito segue presente nas relações de compra e atendimento no país. É o que mostra uma pesquisa nacional apresentada nesta segunda-feira (10), em São Paulo, durante o Fórum Brasil Diverso.
No comércio, os efeitos são visíveis. Lilian Bonfim da Silva, bacharel em Direito, foi impedida de circular com sua própria bolsa dentro de um supermercado. “Olhei ao redor e vi várias senhoras com bolsa. Falei: ‘Por que eu tenho que guardar? Você está achando que eu vou roubar alguma coisa?’”, relatou. Lilian decidiu sair do estabelecimento e adotar uma postura que muitos consumidores negros também têm adotado: não gastar onde não se sente acolhido.
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Casos semelhantes se repetem. Uma assistente social foi revistada indevidamente na saída de uma loja e precisou provar que não havia cometido furto. Já Noemi, que trabalhou em uma rede de farmácias, venceu na Justiça após sofrer discriminação logo no primeiro dia de trabalho, quando foi constrangida diante de colegas.
Alguns episódios chegam ao extremo da violência. Em 2020, João Alberto Freitas foi espancado até a morte por seguranças em um supermercado de Porto Alegre, após ser retirado do local sob a alegação de mau comportamento. A repercussão do caso evidenciou o impacto do racismo estrutural dentro de ambientes de consumo.
A pesquisa divulgada no Fórum Brasil Diverso mostra que 34,8% das pessoas negras sofreram discriminação ao tentar acessar produtos ou serviços no último ano. Entre os espaços mais citados estão lojas de varejo (41%), supermercados (28%) e shoppings (19%). O levantamento também identifica que o preconceito pode ocorrer mesmo em empresas que promovem ações de diversidade internamente.
Para Maurício Pestana, presidente do Instituto Data Raça, o problema está no atendimento e no comportamento de quem representa a marca. “Se a empresa não treina bem quem está no balcão, essa pessoa acaba trazendo o racismo estrutural de casa para dentro do ambiente de trabalho. Isso se reflete diretamente no atendimento ao consumidor negro”, afirma.
A pesquisa aponta ainda uma mudança no comportamento de parte dos consumidores: muitos têm optado por compras online para evitar constrangimentos. “No virtual, ninguém está te olhando, julgando seu corpo ou sua cor”, afirma Pestana.
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Apesar da violência e do constrangimento vividos por muitos, o levantamento também destaca a força econômica desse público: a população negra movimenta R$ 1,9 trilhão por ano no Brasil. Entre os entrevistados, 64% defendem mais representatividade positiva na mídia, a presença de pessoas negras em cargos de liderança e uma postura clara de combate ao racismo por parte das empresas.
“Quando você cria oportunidades e valoriza a diversidade, você reduz desigualdades e melhora ambientes. Além disso, inclusão também dá retorno financeiro”, afirma Pestana.






