Associações médicas do Brasil vão enviar manifesto sobre péssima qualidade do ar para Marina Silva e Conama
No Brasil, a poluição atmosférica mata mais de 50 mil pessoas por ano, eleva o número de internações hospitalares e gera custos ao sistema público de saúde, diz pesquisa
Derick Toda
A Associação Médica Brasileira (AMB), a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) e pelo menos mais 15 associações e federações, em um movimento intitulado Médicos pelo Ar Limpo, vão lançar um manifesto sobre a qualidade do ar e se reunir com o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), na próxima segunda-feira (04) e terça-feira (05), em Brasília.
Com exclusividade ao SBT News, o manifesto direcionado à ministra do Meio Ambiente e Mudança dos Clima (MMA), Marina Silva, e aos integrantes do Conama clama pela definição de padrões seguros e prazos para alcançar a qualidade do ar, visando assegurar a defesa constitucional da saúde pública. Confira a íntegra do manifesto no final da reportagem.
No Brasil, a poluição atmosférica mata mais de 50 mil pessoas por ano, eleva o número de internações hospitalares e gera custos ao sistema público de saúde, segundo um estudo coordenado pela World Resources Institude (WRI), publicado em 2021.
Reivindicação
O movimento cobra ao Conama e o ministério a revisão da Resolução 491/2018, que estabeleceu os padrões de qualidade do ar no país.
Segundo os Médicos pelo Ar Limpo, a resolução, além de ter fixado parâmetros permissivos, pecou ao deixar de estabelecer prazos para metas gradativas às Diretrizes da Qualidade do Ar da Organização Mundial de Saúde (OMS).
A Procuradoria Geral da República (PGR), com apoio do Grupo de Trabalho de Qualidade do Ar do Ministério Público Federal (MPF), judicializou o caso, alegando que a Resolução não garantia de maneira satisfatória o direito fundamental à saúde e ao meio ambiente.
O Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu a ação, mas solicitou ao Conama a revisão da resolução em até 24 meses, que se encerra em agosto, visando promover as garantias mínimas e respeitar a OMS.
Para a diretora do Instituto Ar e embaixadora da iniciativa, Evangelina Araújo, a resolução ficou em discussão durante sete anos no Conama e foi aprovada em 2018 sem a devida proteção à saúde. “Agora, em 2024, após 6 anos em vigor, não avançou em nenhuma meta, justamente porque não há prazos. Essa é a prova de que a norma atual é ineficiente para a salvaguarda da saúde”, protesta.
O que diz o MMA
Em nota ao SBT News, o MMA afirmou que " a revisão da Resolução nº 491/2018 é prioridade máxima da pasta após paralisação no governo anterior. A proposta de inclusão de revisão da Resolução foi enviada pelo Ministério e prontamente admitida pelo Comitê de Admissibilidade do Conselho Nacional do Meio Ambiente em 2023, que encaminhou a matéria para a Câmara Técnica de Qualidade Ambiental. Em sua primeira reunião, a Câmara decidiu criar um Grupo de Trabalho dedicado à revisão da 491/2018.
Coordenado pela Secretaria Nacional de Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental, o GT é composto por especialistas do governo federal, estadual, municipal, academia, setor privado, Ministério Público e sociedade civil.
Nos últimos dois meses, o GT já se reuniu três vezes. A quarta e última reunião será nos dias 4 e 5 de março, no MMA. A expectativa é concluir a minuta de resolução 491/2018 para ser enviada à Câmara Técnica de Qualidade Ambiental para deliberação ainda em março de 2024. O objetivo é que o tema entre na pauta do Conama para aprovação em agosto, antes do prazo estabelecido pelo Supremo para a revisão da resolução 491/2018".
Manifesto
Carta aberta à Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima e aos integrantes do Conselho Nacional do Meio Ambiente
Assunto: Revisão da Resolução Conama nº 491/2018 e a necessidade do estabelecimento de prazos para o atingimento dos padrões nacionais de qualidade do ar segundo índices recomendados pela OMS, bem como a atualização dos episódios críticos de qualidade do ar.
Excelentíssima Senhora
Marina Silva
Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima
Brasília, 4 de março de 2024.
Somos os Médicos pelo Ar Limpo. Juntamo-nos pela defesa da qualidade do ar no embate à maior ameaça à saúde global enfrentada pela humanidade: a mudança do clima. A poluição do ar e a mudança do clima, juntas, foram elencadas como a primeira entre as 10 emergências globais em saúde da Organização Mundial de Saúde. Assim, devemos enfrentá-las para garantir a saúde e o bem-estar dos brasileiros, bem como a preservação do meio ambiente em todo o território nacional.
Neste momento, enquanto o Conselho Nacional do Meio Ambiente discute a revisão da Resolução CONAMA 491/2018, que estabelece os padrões de qualidade do ar no país, viemos clamar pela definição de padrões seguros e protetivos e prazos para alcançá-los, bem como a atualização dos episódios críticos, visando assegurar a defesa constitucional da saúde de nossa população o mais rapidamente possível. Após sete anos de debate e aprovada em 2018, a Resolução encontra-se diante de uma oportunidade ímpar de aprimoramento. A Ação de Inconstitucionalidade (ADI 6148/2019), proposta pela Procuradoria Geral da República ao Supremo Tribunal Federal e julgada em 2022, resultou na determinação de revisão da Resolução no prazo de 24 meses, com o objetivo de garantir a efetividade dos direitos fundamentais. Acreditamos que essa decisão só pode ser plenamente alcançada com a inclusão de prazos claros e bem definidos para atingirmos os níveis mais seguros de qualidade do ar, como recomenda a OMS.
Vale ressaltar que, segundo dados do Instituto Ar, em comparação com 12 outros países, o Brasil ocupa o 3º pior lugar no ranking de padrões de qualidade do ar atuais para material particulado (MP2,5) na atmosfera, ao lado da Índia. Apenas China e Argentina apresentam legislações mais permissivas à poluição. É crucial destacar que embora a maioria dos países analisados ainda apresentem padrões nacionais elevados, em suas legislações vigentes já definem prazos para o aprimoramento gradual dos padrões, com o objetivo final de alcançar as diretrizes da OMS. Nosso país está defasado nesse quesito, com uma legislação superior apenas à de países asiáticos.
Ademais, os níveis de concentração de poluentes considerados episódios críticos de alerta, atenção e emergência - fundamentais para informação e tomada de ações imediatas e protetivas à população - encontram-se defasados em relação a seis países pesquisados, que incluem, além dos EUA, França e Canadá, os da América Central, como Chile, Colômbia e México.
Acreditamos que a revisão da Resolução CONAMA 491/2018 é uma oportunidade histórica para o Brasil dar um passo significativo contra a poluição do ar e a mudança do clima, e garantir um futuro mais saudável para todos. Contamos com o firme compromisso de Vossa Excelência para que essa oportunidade seja aproveitada ao máximo.