Chuva, mortes e falta de dinheiro: janeiro acende alerta para novo governo
Um dos primeiros desafios de Lula em 2023 será responder ao risco de desastres
Bruna Yamaguti
O governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) começa, oficialmente, no próximo dia 1º. Um dos principais desafios a ser resolvido pelo novo governo logo no início do mandato será responder a uma demanda que volta à tona todos os meses de janeiro: as mortes causadas pelos desastres em decorrência das fortes chuvas.
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Nos últimos 10 anos, foram 1.756 mortes causadas pelo excesso de chuvas no Brasil. Só em 2022, foram 457 mortes, segundo levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM). Nos bastidores da administração pública, uma preocupação: não há dinheiro suficiente para obras de contenção de encostas, nem de prevenção de desastres no Orçamento de 2023, enviado pelo atual presidente Jair Bolsonaro (PL).
O alerta foi feito pelo grupo de trabalho (GT) que cuida do Desenvolvimento Regional na transição de governo. "De 2018 a 2022, o orçamento discricionário do Ministério [do Desenvolvimento] para obras de prevenção de desastres, ações da defesa civil e obras de segurança hídrica teve uma redução de 67%", disse Randolfe Rodrigues (Rede-AP), um dos integrantes do GT, em entrevista coletiva com a imprensa.
"Quero chamar atenção porque as chuvas vão se intensificar [...], então não ter a defesa civil é absolutamente inaceitável do ponto de vista de uma prioridade que é a proteção da vida", afirmou Aloizio Mercadante, coordenador dos GT's e cotado para presidir o Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES). "Estamos vendo um completo colapso orçamentário, desestruturação de políticas públicas e riscos crescentes para o governo que entra", ressaltou.
Levantamento feito pelo SBT News mostra que, em relação a 2014, o valor pago à gestão de riscos e prevenção de desastres, ou seja, para evitar que ocorram os acidentes, foi reduzido em quase 40% no Ministério do Desenvolvimento Regional. Nos últimos anos, os recursos para esse tipo de ação sofreram variações. Em 2016, 2018 e 2019, foram registrados os menores valores, como mostra o gráfico a seguir:
Segundo estudo da Confederação Nacional de Municípios (CNM), entre 1º janeiro de 2013 a 05 abril de 2022, os desastres naturais causaram R$ 341,3
bilhões de prejuízos em todo o Brasil. Nestes anos, 347.441.381 brasileiros foram afetados pelas consequências dos eventos.
Considerando-se o antes e o depois dos desastres, ou seja, desde as execuções orçamentárias de drenagem urbana, gestão de riscos, prevenção e preparação, até a resposta aos desastres, reabilitação e reconstrução de áreas danificadas e destruídas, a CNM concluiu que os valores autorizados pela União para os programas vêm sofrendo reduções significativas. No ano de 2022, foram autorizados somente R$ 1,2 bilhão para a pauta -- o que, considerando a inflação do período, deve ser o menor valor real destinado para o enfrentamento de desastres desde 2010.
Outro agravante, ainda de acordo com a confederação, é o percentual médio de execução do orçamento, que foi de 47% entre 2010 e 2021. Isso indica que a cada R$ 100 que o governo federal autorizou para ser destinado à prevenção ou resposta a desastre, apenas R$ 47 foram efetivamente gastos.
O drama das chuvas
Segundo a epidemiologista e pesquisadora da associação de pesquisa Iyaleta, Andrea Ferreira, os efeitos das mudancas climaticas têm-se agravado ao longo dos anos e, por isso, o aumento dos eventos climaticos extremos, como fortes chuvas em curtos espacos de tempo. "Esse é um cenário que tende a piorar, particularmente quando medidas preventivas e de adaptação frente às mudanças climáticas nao são adotadas pelos gestores em todos os niveis governamentais", explica.
"Muito mais que a falta de preocupação, existe a ausência de políticas e de um planejamento governamental que dê conta das mudanças climaticas e seus efeitos e impactos no território e na vida da população brasileira", destaca.
De acordo com pesquisa do Instituto Iyaleta, ao longo dos últimos anos, pôde-se observar desadaptação do Brasil em relação ao clima. Além disso, os impactos dos desastres são sentidos, com mais força, nas regiões Norte e Nordeste do país. "Isso porque as condições de acesso às políticas públicas de moradia, abastecimento de água, saneamento, e acesso a serviços de saúde tem impacto direto da vida das populações nos territórios urbanos desiguais", diz o estudo.
"Os dados trazidos no nosso estudo mostram como o governo tem sido ineficiente na adoção de medidas e ações que possam prevenir a perda de vidas e reduzir as perdas materiais associadas aos desastres climáticos no país", afirma Ferreira, uma das responsáveis pela pesquisa. "Somente traçando ações e estratégias concretas de adaptação frente a esta realidade será possível prevenir e reduzir os impactos adversos dessas mudancas", arremata.