Topless é crime? Jurista vê abuso de autoridade em detenção no ES
Ex-namorada da atriz Camila Pitanga foi detida e algemada por estar com os seios à mostra
Ir à praia, relaxar, tomar banho de sol e não ter marquinhas de biquíni pode ser o sonho de muitas mulheres, desde pequenas criadas sob os moldes para usar a parte de cima do item e cobrir os seios.
Na última semana, a prática de topless virou pauta após a ex-namorada da atriz Camila Pitanga ser detida por estar com a mama descoberta na Praia de Itapoã, em Vila Velha, no Espírito Santo. Beatriz Coelho foi levada à delegacia com os pés algemados, onde permaneceu por mais de duas horas com uma amiga.
Na avaliação da jurista Soraia Mendes, a "ação vislumbra abuso de autoridade". Segundo a especialista, o uso da algema é permitido apenas em casos de resistência ou fuga de perigo à integridade física própria ou alheia, de acordo com súmula editada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2008.
Outro ponto sobre o uso do dispositivo é a justificativa por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar às autoridades ou agentes. O objetivo das restrições do uso do bracelete é impedir abusos e humilhações, tipificado desde 2019.
"O uso [das algemas] é sempre uma medida constrangedora, física e psicologicamente, mesmo em situações legítimas. Usá-las deve ser excepcionalíssimo", afirmou Mendes em entrevista ao SBT News, considerando a medida, quando aplicada de forma desproporcional, "além de vexatória, reprovável".
Liberada pelas autoridades, a produtora afirmou em postagem nas redes sociais haver um homem no mesmo local sem camisa, caracterizando a diferença de tratamento entre homens e mulheres. "O mais irônico é que ao meu lado na delegacia tinha um homem aguardando sem camisa. Nem dentro de uma delegacia um homem precisa estar vestido", relatou.
Após repercussão do caso, Camila Pitanga se pronunciou prestando solidariedade à ex-parceira, citando como motivações para a detenção o "machismo e homofobia".
No Brasil, frequentar locais públicos com os seios descobertos não é crime, mas a prática pode ser caracterizada como ato obsceno, conforme previsto no artigo 233 do Código Penal, com detenção de três meses a um ano ou multa.
As interpretações do crime e da prática do topless são confusas. A atitude indecorosa, ainda segundo o CP, "consiste na prática em local público, aberto ou exposto à população". Para a jurista, a infração é "considerada de menor potencial ofensivo. Ou seja, é um delito para o qual, embora prevista, não haverá aplicação de pena privativa de liberdade", enfatizando "não haver sentido no uso da força" em casos do tipo.
Na avaliação de Soraia Mendes, "não há nada, absolutamente nada, legalmente para proibir uma mulher de livremente expor seu corpo, seja em ambiente de lazer ou forma de protesto". A especialista, inclusive, pleiteia a inconstitucionalidade do crime de ato obsceno, normalmente utilizado nestes casos, no STF.
Topless em outros países: regras são diferentes em cidades e estados
Para Soraia, a situação com Beatriz é "hipócrita", dado o Brasil ser um dos países onde os cuidados com a saúde -- física e mental -- são frequentes. "Na verdade, vivemos com regras de conduta de gênero ditadas pela cultura patriarcal em relação ao controle dos corpos femininos e feminizados", considerando a violência da conduta à sociedade.
O Brasil não é uma exceção: a prática ainda não é benquista em vários países. Contudo, há praias onde é possível bronzear-se sem a parte de cima do biquíni. Por aqui, apesar da proibição, é permitido ficar sem roupa como na Praia do Abricó, no Rio de Janeiro.
Nos Estados Unidos, por exemplo, topless é proibido, mas algumas cidades têm leis próprias para a prática. Miami Beach é a exceção. Lá, as mulheres podem tirar a parte de cima da roupa na praia entre a 1ª Street e 16ª Street. Na cidade de Nova York é permitido desde 1992.
Já na França, Saint-Tropez é mundialmente conhecida pela liberdade às mulheres. Na Espanha, a prática é comum em Ibiza e Maiorca. Do outro lado do planeta, a Manly Beach, na Austrália, permite o ato.