Sergio Moro e o batismo de candidato
Filiado ao Podemos, principal nome da Lava Jato mira política - agora de forma oficial
O tom de terno escuro lembra o habitual preto. Mas o juiz monossilábico, que costumava responder de forma breve e com frases curtas, ficou para trás. É ao menos dessa forma que Sergio Moro oficializou a entrada na política três anos após deixar a magistratura. Candidato a um cargo ainda não bem definido, mas em campanha aberta à Presidência em 2022, o ex-ministro mostrou estar mais preparado para o grande público.
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Ao longo de 52 minutos, o mais novo filiado do Podemos mostrou, nesta 4ª feira (10.nov), ter uma nova versão. Moro está mais leve, como se estivesse em um fórum, com todos seus traquejos e elementos jurídicos. Mas ainda não é um político tradicional, pois mostra dificuldade em se conectar com a plateia e de fazer comentários espontâneos em eventuais intervenções de apoiadores, mesmo quando tentou brincar, logo no início, com ironia a própria dificuldade em se expressar.
Ainda que com o treinamento da política e dos palanques, o novo político precisou de um teleprompter para o discurso, e não o largou nem na hora de anunciar a filiação. O momento mais esperado poderia ter sido natural, mas veio com o uso de ênclise: "Resolvi entrar na vida política e filiar-me ao Podemos", o que mostra que ainda é necessário amadurecer a linguagem. Mas não se pode deixar de lado a evolução dos últimos 19 meses, desde que deixou o governo. Moro agora se apresenta com voz carregada e forte, sem sotaque paranaense.
Apesar de já ter afirmado diversas vezes, nos períodos como juiz e quando ministro, que nunca seria candidato, Moro chega a uma sigla com protagonismo. No evento, mal se via o nome do Podemos em cartazes e em discursos. Enquanto o do ex-ministro estampava outdoors dentro e fora do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília.
As fotos, tiradas em ângulos abaixo dos olhos - em plano fotográfico conhecido como contra plongée - normalmente utilizado quando se quer reforçar a ideia de poder, estavam em pôsteres no teto desde a entrada. Com as frases "Por um Brasil justo para todos" e "Juntos podemos". Sem logotipo do partido em ambos, Moro alternava entre sorrisos e um olhar para o horizonte, que representaria a intenção em apontar para o futuro.
A produção publicitária também estava no vídeo que antecedeu seu discurso, que narrava, sem necessidade, a trajetória do agora político. Conhecido em todo país pela atuação na operação Lava Jato e por ter deixado a magistratura para se tornar ministro da Justiça e da Segurança Pública, ele era conhecido, no fim de 2019, por ao menos 93% da população, segundo pesquisa Datafolha divulgada à época.
A imagem que o antecede, no entanto, foi bem aproveitada no discurso. Moro não citou diretamente Lula nem Bolsonaro, ou qualquer outro partido, mas se fez entender ao falar sobre mensalão, orçamento secreto e rachadinhas. E que atuaria para retomar a possibilidade de condenação em segunda instância, assim como ir contra a reeleição de cargos no Executivo.
Apesar de ter o combate à corrupção como mote, citada ao menos 19 vezes durante as suas falas, Moro apresentou uma série de propostas, expondo o pensamento de livre mercado, preocupação com causas ambientais e até citando temas relacionados à Educação. O ex-ministro também mencionou o respeito a mulheres, homossexuais e negros, sem aprofundamento em qualquer um dos comentários. Outras declarações destacaram o patriotismo. Seja em referência ao hino nacional, ao dizer que "este filho teu não fugirá à luta", ou para contar sobre a decisão de voltar do exterior para "nunca abandonar o Brasil".
Ao que parece, Moro aposta para ser uma terceira via, apresentando-se como um contraponto a Bolsonaro. As cores em verde e amarelo também devem ser apostas na trajetória do novo político. Seja em adesivos grafados nas cores da bandeira, ou em detalhes em paredes e até no chão do auditório onde discursou, a mensagem dada por ele foi clara: "Nós podemos". Uma possível lembrança ao "yes, we can" utilizado por Barack Obama na corrida presidencial dos Estados Unidos em 2008. Mas será que ele pode? Só o eleitor dirá.