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Saúde

Quais foram os avanços no tratamento de tumores cerebrais no Brasil?

Segundo especialista, país vive um momento de revolução, impulsionado pela medicina de precisão; entenda

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Os avanços no tratamento de tumores cerebrais no Brasil | Freepik
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Novas abordagens e medicamentos inovadores estão mudando o cenário do combate aos tumores cerebrais e trazendo esperança para pacientes brasileiros.

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Nas práticas neurocirúrgica e oncológica, lidamos diariamente com um dos maiores desafios da medicina: os tumores do sistema nervoso central. O diagnóstico de um tumor cerebral carrega um peso emocional imenso para pacientes e suas famílias, e por décadas, nosso arsenal terapêutico, embora valioso, foi limitado.

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Hoje, no entanto, vivemos um momento de revolução, impulsionado pela medicina de precisão, que começa a trazer resultados concretos e esperançosos para a realidade brasileira.

O desafio do tratamento no cérebro

O tratamento de doenças neuro-oncológicas é singularmente complexo por duas razões principais. A primeira é a barreira hematoencefálica, uma estrutura de proteção natural do cérebro que impede a passagem de substâncias estranhas, incluindo a maioria dos medicamentos quimioterápicos. A segunda é a própria natureza do tecido cerebral: tumores crescem infiltrados em áreas responsáveis por funções vitais como a fala, o movimento e a memória. Portanto, o desafio sempre foi duplo: como atacar as células tumorais de forma eficaz sem danificar o tecido cerebral saudável ao redor? A cirurgia, a radioterapia e a quimioterapia clássica (como a temozolomida) formam o tripé do tratamento padrão, mas seus benefícios muitas vezes vêm acompanhados de limitações e toxicidade.

A medicina de precisão e os gliomas

A grande virada na neuro-oncologia veio com a nossa capacidade de entender a assinatura molecular de cada tumor. Descobrimos que tumores semelhantes ao microscópio podem ter comportamentos totalmente distintos devido a mutações genéticas específicas. Entre as mais relevantes estão as mutações nos genes IDH1 e IDH2, presentes em cerca de 80% dos gliomas de baixo grau e na grande maioria dos glioblastomas secundários. Essas mutações são não apenas marcadores de diagnóstico e prognóstico, mas também fatores determinantes para o crescimento do tumor. A lógica, então, tornou-se clara: se pudéssemos inibir esse mecanismo, poderíamos controlar a doença.

É neste contexto que surgem as terapias-alvo. Diferente da quimioterapia tradicional, que atinge todas as células de divisão rápida — saudáveis ou tumorais — as terapias-alvo são desenhadas para identificar e bloquear alterações moleculares específicas das células cancerígenas. Elas funcionam como “mísseis inteligentes”, atingindo o alvo preciso, de modo mais direcionado e, geralmente, com menos efeitos colaterais.

Vorasidenib: Um marco recente na neuro-oncologia brasileira

A recente aprovação do vorasidenib pela Anvisa é, sem dúvida, um dos marcos mais significativos dos últimos anos para a neuro-oncologia no Brasil. Esse medicamento oral foi desenvolvido especificamente para atravessar a barreira hematoencefálica e inibir as enzimas mutantes IDH1 e IDH2. Os resultados do estudo clínico INDIGO foram surpreendentes: o vorasidenib demonstrou retardar a progressão da doença em mais de 16 meses em relação ao placebo, adiando a necessidade de quimio e radioterapia.

Isso representa uma verdadeira mudança de paradigma. Para pacientes com gliomas de baixo grau IDH-mutados, a conduta de “observar e esperar” era frequentemente a única opção, gerando grande ansiedade diante da inevitável progressão do tumor. Agora, temos uma ferramenta para agir precocemente, controlando a doença em seu estágio inicial e preservando a qualidade de vida e as funções neurológicas dos pacientes por muito mais tempo.

Perspectivas para o Futuro

A aprovação do vorasidenib abre portas e alimenta a esperança. Olhando para o futuro, as perspectivas são animadoras e avançam em várias direções:

  • Combinação de terapias: O próximo passo será estudar o uso do vorasidenib em combinação com outras abordagens, como a radioterapia ou mesmo em tumores de grau mais avançado, para potencializar os resultados;
  • Outras terapias-alvo: Pesquisas continuam em busca de alvos em tumores que não apresentam a mutação IDH. Já há estudos promissores para outras alterações genéticas, como as mutações no gene BRAF e fusões no gene NTRK, que podem se beneficiar de terapias-alvo já utilizadas em outros cânceres;
  • Imunoterapia: Embora a imunoterapia — que “ensina” o sistema imunológico a combater o câncer — ainda enfrente desafios em tumores cerebrais, pesquisas com vacinas tumorais e células CAR-T modificadas geneticamente seguem avançando e despontam como uma fronteira de grande potencial;
  • Disponibilidade e Acesso: No contexto brasileiro, o maior desafio pós-aprovação é garantir que essas novas medicações cheguem aos pacientes, tanto na rede privada quanto no sistema público (SUS). É uma jornada que envolve gestão de custos, incorporação tecnológica e políticas de saúde.

Esperamos que este seja um sinal de que estamos deixando para trás uma era de opções limitadas e entrando em uma fase de tratamento personalizado e proativo. O caminho ainda é longo e a cura de todos os tipos de tumores cerebrais segue como um objetivo distante, mas cada avanço, como a liberação do vorasidenib, representa um enorme passo que nos enche de otimismo. A ciência está nos oferecendo as ferramentas, e nosso papel, enquanto comunidade médica e sociedade, é garantir que elas cheguem a quem mais precisa.

*Cesar Cimonari de Almeida é neurocirurgião e membro da Brazil Health credenciado pelo CRM 150620 / SP - RQE 66640

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