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Política

Em sete anos, Justiça Militar julgou 7,6 mil crimes no país em 1ª instância e no Superior Tribunal Militar (STM)

Levantamento obtido pelo SBT News revela que 23% dos processos tratam de infrações envolvendo drogas. Punições chegam a 57% dos casos. Números, entretanto, escondem drama social

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Sede do STM, em Brasília
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A Justiça Militar julgou 7,6 mil processos nos últimos sete anos. A maior parte (23%) dos crimes está relacionada a drogas - tráfico, posse ou uso de entorpecentes. Levantamento exclusivo obtido pelo SBT News relaciona informações da 1ª instância e do Superior Tribunal Militar (STM), de 2017 a 2023.

Por que isso importa: em setembro do ano passado foi sancionada a atualização do Código Penal Militar. Entre as alterações está o aumento de pena para tráfico de drogas para 15 anos, até então tal período era de 5 anos. Também foi alterada a regra para punição ao militar que se apresentar para o serviço sob efeito de substância entorpecente. Neste caso a pena caiu de 5 para 4 anos. Os números, entretanto, escondem um drama social.

Os dados da Justiça Militar apresentam inconsistências por causa de mudanças dos sistemas de informática ao longo do tempo. A partir de um levantamento à parte, entretanto, é possível saber que envolvidos com drogas nos quartéis são punidos em 57% das vezes - não está relacionado entretanto se as penas estão ligadas ao tráfico, à posse ou ao uso de entorpecentes.

Perfil dos julgados: por ser a maior Força em número de integrantes, o Exército teve 347 casos julgados entre 2018 e 2022 envolvendo drogas entre soldados e cabos. A Marinha, por sua vez, teve 37 casos entre marinheiros, cabos e suboficiais. A Aeronáutica, 39, incluindo oficiais superiores (1), oficiais intermediários (1), suboficiais (2) e sargentos e soldados (34).

Para lembrar: um dos casos mais emblemáticos do tráfico de drogas na Forças Armadas envolveu um sargento da Aeronáutica, condenado em fevereiro de 2022 por auditoria militar por ter sido flagrado com 37kg de cocaína em Sevilha, Espanha. Ele foi preso ao desembarcar de uma aeronave militar usada oficialmente pelo governo brasileiro.

O drama social: a questão da insignificância é tratada na Justiça comum mas não tem aplicabilidade na Justiça Militar, o que causa um problema para dependentes. Um recruta, mesmo que dependente químico, que tenha sido condenado por uso de drogas, dá baixa com a "ficha suja".

Longe do equilíbrio: por mais que seja condenável o consumo de drogas por quem está armado, especialistas defendem uma solução para dependentes. Como o serviço militar é obrigatório, um jovem que deixa o quartel com 19 ou 20 anos terá dificuldade de se integrar social e profissionalmente.

Para aprofundar: em entrevista ao SBT News, a ministra do STM Maria Elizabeth Rocha afirma que a recente promulgação do novo Código Penal Militar representa avanço legislativo e repercute positivamente. "Vários conteúdos legais anacrônicos datados de 1969 foram atualizados, adequando-se à Constituição de 1988, e consagrando conquistas sociais relevantes", disse. "Porém, no tocante ao art. 290 que trata do tráfico, da posse ou do uso de entorpecentes ou substância de efeito similar, a modificação ficou aquém do desejado. Isso porque, se por um lado elevou-se a pena de reclusão para até 15 anos para o tráfico de drogas no interior dos quarteis, medida correta, por outro quedou silente o legislador quanto à condição do réu, dependente químico."

Pano de fundo: segundo a ministra, o álcool e a utilização de entorpecentes são incompatíveis com o porte de armas letais por aqueles que são "investidos do monopólio da força legítima pelo Estado". A questão é como tratar os dependentes.

O que está em jogo: a Lei nº 11.343/06, que rege a matéria no direito penal, comum prevê políticas públicas para a reinserção dos usuários e dependentes de drogas que vão desde as atividades de prevenção, tratamento e acolhimento até a sua reinserção social e econômica. "Nada mais correto, afinal trata-se de pessoa vulnerável, acometida de patologia grave, nomeadamente os adictos. Para a legislação penal ordinária trata-se de questão de saúde pública, e não, criminal. Lamentavelmente, porém, neste ponto, o legislador falhou com o direito militar. Esqueceu-se que, também nos quartéis, existem praças e uns poucos oficiais, adoecidos pelos entorpecentes, que mereceriam a atenção do Estado, e deixou de prever qualquer medida que pudesse ampará-los - nem internação compulsória, nem tratamento ambulatorial, nada - estabeleceu somente a punição: reclusão de até 5 anos."

O que se disse: "No final desta tragédia estão majoritariamente jovens conscritos, que omitem no alistamento obrigatório sua adição para poderem servir nas FFAA. Se condenados por crime impropriamente militar perdem a primariedade penal. Jovens, hipossuficientes, que serão estigmatizados socialmente e discriminados no mercado de trabalho. Triste, para dizer o mínimo, que a missão cívica de servir à Pátria acabe frustrando os seus propósitos na vida destes condenados."

"Como magistrada castrense, acredito que o Congresso Nacional perdeu uma grande chance, ao apenar a morbidade, de possibilitar ao Poder Judiciário Militar fazer justiça àqueles que mais precisam", diz a ministra Maria Elizabeth Rocha.

Sem dizer adeus: o segundo crime com mais casos é o de deserção com 17%. A infração é caracterizada pela ausência do servidor do trabalho por mais de oito dias e prevista no art. 187 do Código Penal Militar (CPM). Neste caso, a grande maioria dos casos está na 1ª instância, com apenas 234 recursos ao STM.

Os mais mais: depois de infrações envolvendo drogas e deserção, aparecem na lista dos mais recorrentes crimes julgados pela Justiça Militar estelionato (8,4%); furto (5,7%); abandono de posto (3,4%); furto qualificado (3,2%); uso de documento falso (2,7%); lesão leve (2,5%) e falsidade ideológica (2%).

Crime contra o Sistema Nacional de Armas: os crimes envolvendo armamentos são um capítulo à parte. Em outubro deste ano 21 metralhadoras foram roubadas no Comando Militar do Sudeste, em Barueri (SP) - 19 delas acabaram recuperadas. Os crimes não são incomuns. Só na 1ª instância foram julgados 20 casos desde 2017. No STM, chegaram 5 recursos.

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