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Guerras e violência já deixam mais de 83 milhões de refugiados em todo o mundo

Número cresceu significativamente após crise no Afeganistão e deve aumentar com ofensiva russa na Ucrânia

Guerras e violência já deixam mais de 83 milhões de refugiados em todo o mundo
Cerca de 85% dos refugiados do mundo vêm de países pobres ou em desenvolvimento | Sérgio Utsch/SBT
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Entre todos os motivos que forçam parte da população de um determinado país a pedir refúgio em outra nação, o desejo de fugir de conflitos militares ou civis está em primeiro lugar. De acordo com dados da Agência das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), o número de deslocados por combates armados em todo o mundo ultrapassou 82 milhões em 2021 e já aumentou mais de 1,6 milhão apenas no começo deste ano devido à violência em regiões africanas e ao confronto militar entre a Rússia e a Ucrânia.

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Ao todo, cerca de 50% dos refugiados e pessoas deslocadas são procedentes de quatro países: Síria (6,8 milhões), Sudão do Sul (2,3 milhões), Mianmar (1,1 milhão) e República Democrática do Congo (864,5 mil). Diante do fim da operação militar norte-americana no Afeganistão em agosto do ano passado, o país também entrou para o ranking, com mais de 5,7 milhões de deslocados acolhidos por países vizinhos. Esse número, no entanto, continua aumentando à medida que a crise econômica e humanitária cresce no território, que agora é governado pelo grupo Talibã.

Já no continente africano, a região Sahel registrou mais de 800 ataques violentos em 2021, o que levou quase 500 mil novos cidadãos a deixarem suas casas. O deslocamento interno atingiu 2,1 milhões, um aumento superior a 10 vezes desde 2013. Na Etiópia, 20 mil pessoas tiveram que fugir dos confrontos na região noroeste do país em fevereiro deste ano. O local, que fica perto das fronteiras com o Sudão e o Sudão do Sul, segue presenciando conflitos de grupos armados não identificados e forças federais. 

Um pouco mais distante, a região de Darfur, também no Sudão, vem registrando aumento significativo de refugiados devido à alta de casos de violência. Diversos grupos armados e criminosos continuam operando no local e os conflitos resultam em destruição de vilas, roubo de cabeças de gado e casos de violência sexual. Até o fim de 2021, quase 10 mil pessoas já tinham fugido de Jebel Moon, localizada na zona oeste de Darfur. Destes, cerca de 2 mil, a maioria mulheres e meninas, foram buscar refúgio no Chade. A Acnur estima que ao menos 6,2 milhões de pessoas em Darfur precisem receber ajuda humanitária em 2022, número que representa metade da população do local.

A situação não é muito diferente no Haiti, no Caribe, onde a forte violência continua agravando a vulnerabilidade dos cidadãos. Em 2021, o país registrou o assassinato do presidente Jovenel Moïse e o aumento de sequestros de mulheres e crianças por grupos criminosos. Segundo um levantamento do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), 71 mulheres e 30 crianças foram sequestradas de janeiro a agosto do ano passado para serem utilizadas como moeda de troca em fronteiras. Isso fez com que 15 mil adultos e jovens fossem forçados a fugir de suas casas.

Segundo Marcelo Haydu, mestre em Ciências Sociais e diretor executivo do Instituto de Reintegração do Refugiado - Brasil (Adus), cerca de 85% dos refugiados do mundo vêm de países pobres ou em desenvolvimento. "A grande tragédia nesse sentido, é das pessoas que vão aos países mais próximos, já que, muitas vezes, migram a pé durante semanas em trajetos complexos, sem alimento ou água e precisam depender da boa vontade dos nacionais daquele determinado país. Além disso, essas pessoas também enfrentam riscos constantes, como condições climáticas adversas", explica Haydu.

Ele ressalta que as travessias pelo Mar do Mediterrâneo, que liga o norte da África ao continente europeu, estão entre as mais perigosas, uma vez que os refugiados embarcam em botes pequenos e frágeis em mar aberto. Sabendo dos ricos, organizações como SOS Mediterrâneo e Médicos sem Fronteiras, por exemplo, trabalham na região para resgatar e tentar promover vistos provisórios para os grupos, que geralmente saem da Tunísia, Líbia e Argélia. Neste ano, a Organização Internacional para Migrações (OIM) voltou a reforçar o aumento no número de mortes e desaparecimentos durante as travessias no Mediterrâneo Central.

Apesar de muitos países possuírem boas políticas de acolhimento, o número de refugiados no mundo continua aumentando. Com a invasão da Rússia ao território ucraniano, mais de 1,3 milhão de pessoas já cruzaram a fronteira do país para fugir dos conflitos militares em apenas 10 dias. A maioria procura abrigo em nações como Polônia e Hungria, enquanto outros ucranianos se deslocam para Eslováquia, Romênia, Moldávia e, até mesmo, regiões da Rússia. Tais locais já vinham registrando grande quantidade de pedidos de refúgios em 2021 por conta do impasse geopolítico entre Belarus, aliada da Rússia, e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

Em pronunciamento nesta semana, o chefe do Acnur, Filippo Grandi, disse que o número de refugiados pode ultrapassar 4 milhões já nas próximas semanas e que o fluxo pode ser o maior já registrado no século na Europa.

"Muitas vezes, essas pessoas chegam com apenas a roupa do corpo e sem condições para se manterem por dias, quem dirá meses", diz Haydu. Segundo ele, é de grande importância que o país de destino esteja estruturado com políticas de integração local que atendam as necessidades básicas, como espaço de residência provisória, centros de alimentação, aulas de idiomas e acesso à serviços públicos e jurídicos. Além disso, o papel das autoridades e organizações sem fins lucrativos é primordial para que os refugiados consigam empregos adequados e conquistem autonomia econômica, deixando de depender de doações e auxílios governamentais.

Tal processo, no entanto, pode ser demorado e, muitas vezes, desafiador. Para Valéria Derminio, assistente de Responsabilidade Social no Programa de Apoio para a Recolocação dos Refugiados (PARR), grande parte das pessoas em situação de refúgio pode se sentir afetada pela falta de integração social e desenvolver perda de autoestima, bem como de identidade, uma vez que o país de destino possui costumes e culturas diferentes da nação de origem. 

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"Muitos profissionais, mesmo que bem qualificados e com um nível de escolaridade alto no país de origem, acabam tendo dificuldade de se inserir no mercado de trabalho local, principalmente se levarmos em consideração vagas de um nível hierárquico mais elevado. Assim, esses trabalhadores se veem diante de oportunidades de serviços gerais e operacionais, por vezes, até mesmo se inserindo no mercado informal a fim de pagar suas contas e de enviar dinheiro à parentes em seu país de origem. Essa situação afeta o ambiente familiar como um todo, pois gera insegurança a  longo prazo e acaba impedindo, por vezes, esses profissionais de se aprimorarem e se capacitarem com cursos, pois a instabilidade em sua rotina não os permite assumir compromissos mais longos", explica. 

Já no caso das crianças, Valéria diz que a integração acontece de forma diferente. Ela cita que, pelo menos no Brasil, é necessário que os menores de idade estejam matriculados no sistema de ensino nacional para conseguirem dar continuidade aos estudos. Tal processo facilita a integração do grupo à sociedade e aumenta, ainda, o aprendizado do idioma local. "Em alguns núcleos familiares, as crianças são as principais responsáveis pela comunicação dos pais ou responsáveis, o que pode acabar por colocar, ocasionalmente, um peso extra em seu desenvolvimento."

A afirmação de Valéria é reforçada por Haydu, que salienta, ainda, a importância de políticas públicas estruturadas e o auxílio do governo e organizações locais ou internacionais no período inicial para que os refugiados tenham as ferramentas necessárias para "caminhar e dar os próximos passos". Esse suporte, que já era primordial, ficou ainda mais necessário diante da crise provocada pela pandemia de covid-19, que fez com que os processos de documentação demorassem mais, levando cerca de quatro a cinco meses. Para Haydu, a integração das crianças só é possível a partir da inclusão estruturada dos pais na sociedade.

"Não é apenas receber o refugiado, é desenvolver estímulo e apoio também. O governo pode e deve olhar para essa causa, além de como uma questão humanitária, como uma situação estratégica e ver de que maneira essas pessoas podem contribuir para o crescimento e desenvolvimento do país. Geralmente, muita mão de obra boa e qualificada é desperdiçada", pontua o membro do Adus.

Frentes básicas para a integração local de refugiados:

  • Documentação;
  • Espaços de acolhimento;
  • Cursos de idiomas;
  • Cursos profissionalizantes;
  • Orientações trabalhistas;
  • Elaboração de currículos;
  • Integração no mercado de trabalho;
  • Integração no sistema de ensino.

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