Proteger o planeta ou uma dúzia de petroleiras; para que serve uma COP?
Especialistas criticam líderes mundiais, seduzidos pela riqueza do petróleo enquanto o planeta pede socorro
Pablo Valler
Quando Dubai foi escolhida para sediar a 28ª Conferência do Clima da ONU, gerou desconfiança. "Acho que tem uma tentativa de captar esses países para uma debate pró-pessoas, pró-meio ambiente. Mas, isso não vai fazer esses países migrarem posições. Se a gente quiser falar sobre desenvolvimento sustentável, tem que partir de um debate minimamente sério, baseado em ciência. Começar uma COP ouvindo que 'não há ciência que justifique o fim dos combustíveis fósseis' é de doer", diz Paulo Guerra, diretor de gestão pública da Fundação Dom Cabral. A indignação é com o presidente da COP, Ahmed al-Jaber, que comentou a falácia à imprensa internacional. Ele também é presidente de uma petroleira, mais um motivo de desconfiança.
Desse jeito, o receio foi se confirmando enquanto o evento acontecia, entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro desse ano. Outra situação dúbia foi a presença recorde de representantes do setor petrolífero. Quase 2.500 pessoas. Se fosse uma delegação, seria maior do que aquela montada pelos países vulneráveis, com cerca de 1300 integrantes.
De fato, a COP28 chamou pouca atenção para os desastres naturais e os impactos na sociedade. A não ser quando lançou o esperado Fundo de Perdas e Danos, que captou pouco mais de US$ 700 milhões, valor muito aquém do que as nações em desenvolvimento precisam. Somente o Paquistão, teve mais de US$ 3 bilhões com enchentes e secas no ano passado.
Paulo critica: "Se não resolvo a adaptação do mundo, esse Fundo não vai ser suficiente. Porque a quantidade de dano é muito superior à capacidade dos estados de trazerem recursos. Então, eu preciso trabalhar novamente a questão da adaptação e a questão da resposta aos danos que são causados. Tem que ser um trabalho em paralelo".
Em contrapartida, os países petroleiros conseguiram causar aquele impasse previsto. O relatório final não ficou pronto antes da cerimônia de encerramento. Tudo por conta da falta de consenso sobre alguns termos, como "eliminar" ou "substituir" ou, mais espec "diminuir subsídios da indústria petroleira". Para a doutora em negócios sustentáveis, Mel Girão, "o problema é uma questão de narrativa. Não é negacionismo nem ignorância. É um debate de narrativas de quem quer ganhar tempo ou não quer abrir mão de receita. É estratégico mesmo".
O Brasil na COP
De novo, poucos países foram coerentes em um evento sobre mudança climática. Inclusive, o Brasil, que chegou assumindo a função de liderança. Trouxe dados que comprovam diminuição do desmatamento. Lançou mais um fundo de investimentos para recuperação, o Florestas Tropicais para Sempre. Apresentou, por meio do Sebrae, 250 projetos para desenvolver a bioeconomia. Entretanto, em meio ao evento, o mesmo Brasil aceitou o convite para fazer parte da Opep+, grupo dos maiores produtores de petróleo. "O Brasil adotou uma postura preocupante. Em um dia fizemos discursos lindos, cobrando com razão. No dia seguinte, assinamos o ingresso na Opep+. Causou um reboliço gigantesco aqui na COP, de manifestantes cobrando o governo", alerta Paulo.
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