Estratégia de Galípolo no BC deve ser conciliadora, dizem economistas
Economista Luiz Belluzzo defende a indicação: "Claro que é política"
Guto Abranches
A ida de Gabriel Galípolo para o Banco Central é um investimento de longo prazo. Investimento do governo Lula 3. Se não há consenso entre os economistas e agentes de mercado sobre qual será o efeito - imediato - da aceitação de Galípolo para ocupar a diretoria de Política Monetária, que é provavelmente a de maior visibilidade entre as diretorias, de outro lado não se pode menosprezar a chegada do indicado de Fernando Haddad para o posto. A nomeação só sai depois da aprovação do nome pelo Senado, mas ninguém acha que a indicação corra qualquer risco de ser barrada.
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Da porta de entrada do Banco Central -- e das reuniões do Comitê de Política Monetária, o Copom, que decide como ficam as taxas de juros -- o que acontece, na prática, com Galípolo a postos? Para o economista Alexandre Schwartsman, a movimentação pode causar dúvidas.
"A grande verdade é que todo mundo vai entrar com pé atrás, diante da chegada do Galípolo", dispara o ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, de 2003 a 2006. Ele não dá voltas para admitir que vê ação política na opção por Galípolo. Se não para implicar em mudanças imediatas, mas no médio e longo prazo. "Ele está lá para fazer o que o Lula mandar. Não é nenhum custo pessoal, é só o curso do processo no qual ele já está envolvido. Agora [...] a meta de inflação é o trabalho a ser feito, não obedecer o presidente. Isso é desvio de função", arremata Schwartsman.
A postura do atual Secretário Executivo do Ministério da Fazenda - número dois da pasta comandada por Fernando Haddad - logo em seguida à indicação de seu nome pelo ministro, mostra que o viés político está assumidamente presente. Foi o próprio Galípolo quem afirmou: "Estou à disposição de Lula para jogar na posição que for mais adequada".
Claro que é política
"Mas que indicação haveria de ser? Claro que é uma indicação política. Até porque o Banco Central segue fazendo parte do âmbito das instituições republicanas", pontua o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, interlocutor de Galípolo há mais de vinte anos. Escreveram três livros juntos pela editora Contracorrente, entre eles "Manda quem pode obedece quem tem prejuízo", de 2017. A obra conta com riqueza de detalhes e fina ironia como é o funcionamento do mercado financeiro e a influência da política sobre a economia e vice-versa.
A parceria e a convivência com Galípolo conferem a Belluzzo confiança na atuação do novo homem da Política Monetária. Além de moral e intelectualmente preparado, na opinião do ex-secretário de Assuntos Econômicos da Fazenda e fundador da Facamp - Faculdades de Campinas -, Galípolo carrega a experiência do dia a dia do meio financeiro, por ter sido presidente do Banco Fator por quatro anos. " O BC é de Estado, tem que ter interlocução também com o mercado", aponta Belluzzo.
Para ele, Galípolo é um estudioso, um observador frequente e próximo da condução da política monetária. As restrições que pode haver quanto a seu nome se darão por ele não ter a "visão binária da economia que tanta gente tem", aponta Belluzzo. E outra característica joga a favor, ele diz.
"Ele tem ótima interlocução com o Roberto Campos Neto. Ele pode até não concordar com o Roberto, mas as conversas serão boas. Não vai haver trombada: divergências sim, mas conflitos não." - Luiz Gonzaga Belluzzo, economista.
Quanto e quando
As críticas pesadas aos juros altos - de parte até do presidente Lula - e até à pessoa de Roberto Campos Neto, não deixam dúvida quanto ao rumo que o governo espera ver a política monetária tomar: o governo quer juros mais baixos o mais rápido possível. Do ponto de vista dos elementos técnicos, o IGP-DI (FGV) em abril trouxe deflação de 1,01%; em março já tinha sido de 0,34%; o IPCA aponta um patamar de maior resiliência calcado em itens como transportes (do grupo dos preços administrados) que devem observar o rumo da política de preços da Petrobras, que promete reduções. Há, sim, a resistência dos núcleos de inflação de determinados segmentos, a jogar contra a ideia de um corte na Selic na reunião de junho. Mas o conjunto da obra deixa algo a se pensar, ao menos para o segundo semestre.
A troca na diretoria do Banco Central, essa sim é assunto imediato. Deixam a instituição Paulo Souza, de Fiscalização, e Bruno Serra, diretor de Política Monetária. Nas vagas deles entram Ailton Aquino, que é servidor de carreira, e Gabriel Galípolo. Ao final do ano outros dois diretores serão substituídos. E o mandato do próprio presidente do BC termina no final de 2024. "Este é o pote de ouro no final. Que é tornar-se [Galípolo] presidente do Banco Central no lugar do RCN, daqui dois anos", aponta Alexandre Schwartsman.
Situação inédita
O ex-presidente do Banco Central, economista Gustavo Loyola, sócio da Tendências Consultoria, considera que um diretor do BC candidato a presidente da instituição não é um acontecimento comum. Ele acredita que Gabriel Galípolo vá adotar uma atitude mais discreta, mesmo quando argumentar eventualmente contra as posições correntes no Copom. E olha que questionamentos ele tem de sobra.
"Ele é partidário da teoria monetária moderna, tem manifestado que os juros no Brasil são altos demais, que independe da questão fiscal, uma série de manifestações que são bastante contrárias a direção da política monetária hoje e contraria o pensamento dominante hoje nos mercados financeiros", examina Loyola. Mas ele espera que o novo diretor aposte numa estratégia conciliadora no trato com os demais diretores e com Roberto Campos Neto. Tem certo que Galípolo não vai chegar chegando.
"Isso não seria um atitude inteligente da parte dele, de colocar o Roberto Campos Neto em situação mais difícil. Porque tem uma questão de reputação; você é presidente do BC, na sua gestão a inflação saiu dos trilhos, isso marca. Mas a gente vai ter que ver as atitudes dele ao longo do tempo, pra ver como ele pensa e age." - Gustavo Loyola, ex-pres. Banco Central
Loyola conhece o ambiente interno ao BC e convive com o meio empresarial e político faz tempo. Sabe que cada passo dado, cada ação assumida, cada posição manifestada numa instância tão elevada quanto a direção de uma das mais importantes instituições de governo não passa despercebida. E muito menos é adotada sem uma ideia por trás. E faz sua aposta. "O Haddad disse que o nome do Galípolo quem sugeriu foi o Roberto Campos Neto. Duas possibilidades: o Haddad quis prestigiar o Roberto Campos Neto para criar um clima mais positivo. Ou, Campos Neto percebendo que podia ter candidatos piores, pensou 'qual do PT pt é mais razoável?. É o Galípolo. Ele vacinou o Banco Central. Se querem escolher alguém mais na linha próxima ao comando do PT, que seja o Galípolo", completa.
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