Cálculo da energia pode reduzir inflação ao consumidor, diz consultoria
Com os reservatórios cheios e energia "a custo zero", mudança baixaria peso sobre a inflação em 0,32 pp

Guto Abranches
A colaboração das chuvas abundantes dos últimos meses, os reservatórios com água como não acontecia há mais de uma década -- Cantareira, em São Paulo, está com 70% da capacidade -- não só garantem que a energia não receberá bandeiras tarifárias adicionais, como obrigam a uma discussão: já se pode falar em alguma medida que reduza o custo e, consequentemente, faça baixar a inflação ao consumidor? Um estudo da GO Associados, capitaneada pelo economista Gesner Oliveira, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), afirma que sim.
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Tudo passa pelo PLD - Preço de Liquidação das Diferenças, um parâmetro para a formação do valor cobrado pela energia no mercado livre. É a este mercado que as empresas recorrem quando precisam, por exemplo, comprar energia além do que já têm contratado no mercado regulado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Quem dispõe deste recurso para adquirir a energia de que necessita são as empresas de todos os setores. O que equivale a dizer que, uma indústria de alumínio, uma distribuidora de água, acabam colocando no mercado um produto ou serviço que tem, entre seus componentes de preço, o custo da energia que decorre do PLD. É aí que mora o perigo, diriam os especialistas.
"A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) estipula o PLD mínimo levando em conta aspectos que, em sua maioria, têm a ver com o mercado externo e menos com nosso cenário doméstico", esclarece Gesner de Oliveira.
Um dos exemplos mencionados pelo economista é o peso dos parâmetros associados à usina hidrelétrica de Itaipú: a binacional destina cerca de 85% da sua produção anual de energia (67.897.008 megawatts-hora em 2022) para o mercado paraguaio, e 8,5% para o consumidor nacional. Na definição de Gesner Oliveira, é dado um peso excessivo a um fator que não reflete o custo doméstico, no caso de Itaipu; o PLD mínimo é definido levando em conta uma tarifa específica da energia da usina, que tem o dólar como referência. Daí, oscila com frequência diária, carrega um efeito-desvalorização do real já refletido numa cotação amplamente desfavorável [R$ 5,20 nesta 5ª feira (02.mar)] à moeda brasileira e evidencia a distância do interesse do consumidor doméstico da realidade da cobrança.
Conta feita
O resultado é visível. Pelos critérios da ANEEL, o PLD mínimo para o ano de 2023 é de R$ 69,04 o MWh; mas poderia ser quase quatro vezes (3,85...) menor. A sugestão do economista Gesner Oliveira e sua equipe é usar uma média ponderada das tarifas de todas as hidrelétricas, inclusive o pedaço brasileiro destinado por Itaipu. Se fosse assim, o PLD mínimo hoje seria de R$ 17,90 o MWh.
Levando-se em conta o que o economista classifica como "dolarização da energia", o peso das oscilações do câmbio implica em reações de política econômica que poderiam ser evitadas ou, ao menos, em muito diminuídas. Exemplo acabado é o combate à inflação - que tem parcela calcada na alta do dólar - via política monetária. Em tradução branda, parte dos juros que permanecem elevados - a Selic está em 13,75% ao ano desde agosto/22 - depende dessa conta feita para a energia.
" O impacto sobre a inflação é inegável: no IPCA [ Índice de Preços ao Consumidor Amplo] ele responde sozinho por 0,32 ponto percentual. É praticamente 10% da meta de inflação para o ano [ 3,25% para 2023]" - Gesner Oliveira, GO Associados
Negócio de oportunidade
E o momento é propício para a mudança nas contas, de acordo com os consultores da GO Associados. É que neste início de ano, São Pedro se livrou plenamente de ser culpado pela ausência da benção líquida que literalmente cai do céu e da qual a vida cotidiana de cidades imensas como São Paulo depende: tem chovido e muito.
"As chuvas abundantes deste ano encheram os reservatórios das usinas hidrelétricas do país, e o custo de geração de energia hoje é literalmente zero. O Brasil está diante de uma enorme oportunidade de canalizar essa energia barata (e limpa) para o setor produtivo, contribuindo para a tão desejada reindustrialização da economia do país, que trará consigo crescimento econômico, geração de emprego e renda para a população", avalia Gesner.
Uma mudança feita, agora, em meio a este cenário, seguramente teria duração até o encerramento do ano, calculam os economistas. O bolso do consumidor - e até São Pedro - agradecem.
Veja a seguir a íntegra da entrevista com Gesner Oliveira, sócio da GO Associados ao SBT News.
*A produção do SBT News entrou em contato com a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) a respeito da reportagem, mas não obteve retorno.
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