"Não tinha direito nem de me proteger", diz médico que trabalhou na Prevent
À CPI da Covid, Walter Souza Neto confirma que empresa não exigia o uso de máscara
SBT News
O depoimento de Walter Correa de Souza Neto, ex-médico da Prevent Senior, à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid traz a denúncia de que o plano de saúde não permitia a autonomia médica para definição de tratamentos aos pacientes. Ambiente de trabalho hostil, hierarquia rígida e assédio moral são outros elementos presentes no dia a dia dos funcionários da rede de saúde, de acordo com o depoente.
"Fui bombeiro militar e policial civil e não havia hierarquia tão rígida como o que acontecia na Prevent Senior. Se voltar contra qualquer orientação do seu superior poderia resultar em represálias importantes e até perder o seu trabalho", disse.
O médico, que ajudou na elaboração de um dossiê entregue à CPI com denúncias sobre a Prevent, relatou que, no início da pandemia, houve ordens para que os profissionais não usassem máscaras, mas, depois, a empresa providenciou estoques com os itens de proteção.
"Houve um caso que eu tive, é exemplar. Já tinha estourado um surto de covid numa das unidades. Eu cheguei pra trabalhar na unidade e já estavam alguns colegas indo pra intubação, eu fiquei com medo da doença. Falei: 'Vou pegar uma máscara'. Coloquei uma máscara N95 e fui trabalhar com a máscara N95 no consultório. A coordenadora entrou no consultório e falou: 'Ó, você precisa tirar a máscara'. Aí eu falei: 'Pô, mas como eu vou tirar a máscara? Pra mim é proteção. Eu não posso ficar sem máscara'. 'Não, você precisa tirar máscara'. Eu falei: 'Mas já estou com a máscara, já peguei.' 'Não, não. Não pode. Não pode, porque vai assustar os pacientes.' Então, assim, a falta de autonomia é tanta que você não tem autonomia pra proteger a sua própria vida. Então, o que vale é manter a engrenagem da empresa girando. Se aquilo ali atrapalhar de alguma forma o jogo, a sua vida pouco importa. Então, eu tive que tirar a máscara e continuar trabalhando sem máscara", explicou o médico.
Além disso, Walter Correa confirmou que a organização interna da empresa era baseada em uma hierarquia rígida, com os líderes denominados "guardiões". Um hino corporativo, que deveria ser cantado pelos funcionários, também era entoado nas reuniões com os líderes.
"Houve um hino, também. Os chefes de plantão basicamente se chamavam, durante um bom tempo, de guardiões. Esses chefes de plantão tinham reuniões que, às vezes, eram mensais, e tinham esse hino pra poder cantar. Eu participei uma única vez de uma reunião dessas e, sim, a gente teve que ficar de pé, com a mão no peito, cantando o Hino dos Guardiões. Foi uma coisa meio constrangedora, de fato", contou à CPI.
A Prevent Senior é acusada de ocultar mortes de pacientes por covid-19 e de pressionar médicos para prescreverem medicamentos sem eficácia científica comprovada contra o coronavírus.
Saiba mais: