Reforma tributária: fim de incentivo ao vale-refeição é alvo de críticas
Associação das Empresas de Benefícios se reuniu com relator e acredita que proposta final será alterada
Guilherme Resck
Entre as medidas incluídas pelo relator da segunda fase da reforma tributária -- deputado Celso Sabino (PSDB-PA) -- em seu parecer preliminar, uma das que mais vêm gerando discussões desde que o texto se tornou público, na última semana, é a revogação do incentivo fiscal para as empresas que, integrantes do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), oferecem por exemplo vale-refeição e vale-alimentação para seus funcionários. Diferentes entidades se manifestaram contrariamente ao trecho, citando os riscos de ele culminar em uma diminuição ou fim dos vales. Mas, agora, segundo a Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), o item tende a ser retirado do relatório final.
Em nota enviada ao SBT News, a ABBT afirma que o presidente do conselho da entidade, Alaor Aguirre, participou de uma reunião com Sabino na última 5ª feira (21.jul), em Brasília, e que, no encontro, o deputado demonstrou entender o PAT e seus benefícios como sendo importantes para os trabalhadores, principalmente os de baixa renda. Sabino teria se apresentado ainda como defensor do Programa e, portanto, deverá preservá-lo.
O PAT foi instituído pela Lei nº 6.321/1976 e regulamentado pelo Decreto nº 5/1991, visando a melhorar a situação nutricional e de saúde dos trabalhadores, com foco naqueles que recebem até cinco salários mínimos. Atualmente, de acordo com a ABBT, 22 milhões de empregados são beneficiados por ele, mas o número pode subir para 40 milhões se forem considerados seus familiares. Em entrevista ao SBT News, a diretora executiva da associação, Jéssica Srour, disse que acabar com o incentivo fiscal para o programa causaria impactos negativos na economia como um todo e na qualidade de vida dos beneficiários, porque "sem dúvida desincentiva as empresas que concedem o crédito".
Para as companhias de benefícios ao trabalhador, ou seja, que administram o sistema de tíquites, vales e outros meios de pagamento por alimentação ou refeição, os problemas financeiros, diz ela, seriam profundos e deveriam vir no médio ou longo prazo, quando venceriam os contratos já firmados com as empresas responsáveis por oferecer as quantias. Já a partir da perspectiva dos beneficiários, ela avalia que poderia ocorrer não só uma perda de renda, mas também "o desvio de finalidade do uso do crédito, porque o PAT, na verdade, está construído no que a gente chama de arranjo fechado".
"É como se o crédito lá fosse carimbado para alimentação. Do jeito que está vindo [com a reforma tributária], é como se fosse um arranjo aberto, então a possibilidade de desvio de finalidade de crédito é bastante elevada", completou. Essa mudança de objetivo, explica Jéssica, consiste na utilização do dinheiro para pagar por outros produtos que não alimentos, o que afetaria "diretamente inclusive no próprio restaurante e, por outro lado, na precarização da alimentação". "Porque assim 'ah, deixa eu utilizar esse crédito para outra finalidade e eu vou quebrar o galho, vou pegar uma marmita qualquer', e vai deixar a qualidade da alimentação para um segundo ou terceiro grau de prioridade."
Jéssica afirma ainda que a ABBT se surpreendeu ao tomar conhecimento do parecer preliminar do deputado Celso Sabino, pois vinha discutindo há seis meses com a Secretaria do Trabalho do Ministério da Economia (ME) formas de aprimorar o PAT, e o teor do texto apresentado pelo relator da reforma tributária é "bem diferente" do que Associação já havia conversado com o governo federal.
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT) são outras entidades que se posicionaram de forma contrária ao fim do incentivo fiscal relacionado ao PAT. Segundo a primeira, a medida impossibilitaria "que muitas empresas mantenham o auxílio, cujo principal objetivo é garantir a alimentação de qualidade aos trabalhadores de baixa renda". A FecomercioSP chegou a enviar um ofício ao relator com a manifestação e classificou o PAT como "uma forma bastante adequada do Estado, em parceria com as empresas, contribuir para que os trabalhadores tenham acesso à alimentação saudável".
Importância do PAT
De acordo com a diretora executiva da ABBT, a previsão de um possível desvio de finalidade do crédito após um eventual fim do PAT é fundamentanda, por exemplo, pelo resultado de uma pesquisa feita pela entidade no ano passado. "Perguntávamos 'se o crédito não for garantido para alimentação, para quais finalidades você utilizaria?', e aí aparece pagamento de dívida, Netflix, Spotfiy. É assim, uma série de coisas que vem antes da alimentação", pontuou.
De todo modo, nas conversas tidas com o governo nos últimos meses para aprimorar o Programa, a associação fez uma série de sugestões. Uma delas, fala Jéssica Srour, era que o PAT focasse mais em conscientizar os trabalhadores sobre a qualidade da alimentação, apontando com o que é mais saudável gastar os benefícios concedidos, em vez de na atual tabela de calorias que apresenta para servir de parâmetro a restaurantes.
Com a segunda fase da reforma tributária, afirma o governo, pretende-se corrigir "distorções históricas que contribuíram para transformar o sistema tributário brasileiro num dos mais injustos, complexos e ineficientes do mundo". Dessa forma, o SBT News entrou em contato com o gabinete do deputado Celso Sabino para questionar de como o fim do incentivo fiscal relacionado ao PAT poderia ser positivo, e não prejudicial, mas não obteve retorno até a mais recente atualização desta reportagem.