Atos de junho: policiais se infiltraram entre black blocs durante protestos
Imagens inéditas, gravadas pelos espiões, foram guardadas pela PM de São Paulo por 10 anos

Emanuelle Menezes
Fabio Diamante
A Polícia Militar de São Paulo colocou espiões entre manifestantes adeptos da tática black bloc, durante os protestos de 2013 -- que tomaram as ruas da capital pela revogação do aumento da tarifa do transporte público e depois se transformaram em uma revolta generalizada contra a corrupção e gastos com a Copa do Mundo de 2014.
Imagens inéditas, guardadas nesses 10 anos pelo Serviço Reservado da PM paulista, mostram a ação dos policiais infiltrados. Um deles gravou o momento em que um Fusca, que tentava furar uma manifestação, pegou fogo.
O caso aconteceu em 25 de janeiro de 2014, em um ato contra a realização da Copa do Mundo no Brasil. O serralheiro Itamar Santos dirigia o veículo pela Rua da Consolação, que estava tomada por manifestantes que faziam barricadas com fogo. Nesse momento, um colchão em chamas se prendeu ao Fusca e ele foi consumido pelo fogo. Nas imagens, gravadas pelo policial espião, é possível ver uma criança de 5 anos sendo retirada do banco de trás do carro.
Nesse mesmo dia, as imagens do PM infiltrado mostram um grupo de manifestantes tentando virar uma viatura da Guarda Civil Metropolitana. O agente se comunica com alguém, a quem chama de "chefe", e avisa: "Praça Roosevelt, bem em frente à Praça Roosevelt, estão tentando virar a viatura!"
A Praça Roosevelt, no centro de São Paulo, foi usada como uma espécie de sala de aula dos manifestantes, que se reuniam no local para planejar os atos. Os agentes infiltrados fizeram dezenas de gravações para tentar identificar líderes entre os black blocs e prendê-los antes do quebra-quebra -- o que era muito difícil porque a grande maioria usava máscaras.
O movimento que tomou as ruas de São Paulo há dez anos também não tinha uma coordenação. A única coisa certa era a violência que acontecia dos dois lados. O comandante-geral da PM à época, coronel Benedito Roberto Meira, conta que a polícia paulista nunca havia enfrentado nada parecido. E que a ação dos chamados black blocs surpreendeu a corporação.
"Nós tivemos um grupo de pessoas, todas vestidas de preto, que depois nós sabíamos que eram os black blocs, que eles têm uma tática, uma ação de anarquismo, sem partido político, que não tem hierarquia entre eles. Aquilo nos surpreendeu", disse Meira.
A tática black bloc tem como alvo os chamados "símbolos do capitalismo". As agências bancárias e concessionárias de veículos eram depredadas quase que diariamente. E os espiões estavam ali, gravando tudo.
Os policiais infiltrados também tentavam identificar os manifestantes por meio das gravações. Em uma delas, o agente filma um encontro, dentro de um restaurante, no meio da noite. Em outra imagem, o PM foca em mascarados, que se concentravam no vão livre do MASP, na Avenida Paulista, antes do início de um protesto, na tentativa de encontrar algum detalhe que o ajudasse no reconhecimento dos integrantes do grupo.
Os espiões também ajudavam nas prisões de suspeitos, que geralmente aconteciam no final dos atos. Em uma gravação, é possível ver o cerco a mais de 50 manifestantes, dentro do Hotel Linson, na Rua Augusta, que também aconteceu no protesto de 25 de janeiro de 2014. Na época, os policiais foram acusados de usar bala de borracha e bombas de gás lacrimogênio dentro do estabelecimento. Um jovem teve o maxilar quebrado.
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