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Uma passarinha em São Paulo

"O primeiro ano em SP foi um divisor de águas na minha vida"

Imagem da noticia Uma passarinha em São Paulo
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A primeira vez que vi São Paulo do alto tinha 8 anos. Julho. Férias. Parte da minha família paterna sempre morou aqui. "Que cidade maluca. Que coisa gigantesca. Quantos aviões pousando no mesmo aeroporto. Tem muito espaço para voar", pensei. 

Voltei para Belém e falei para minha mãe sobre uma vontade que surgiu. Voar para longe, para lá, para aquele lugar onde eu "caberia". Ela apenas sorriu. 
Sempre fui uma passarinha destemida. Meus pais sabiam disso e nunca cortaram minhas asas, nem sufocaram meus sonhos. Mas também sabiam que a menina intensa e ansiosa não conhecia os ventos e tempestades do caminho.

Bom, foram muitas tentativas até o sonho da passarinha se concretizar. Todos os caminhos "fáceis" falharam. Não cheguei aqui com um emprego, estabilidade, casa e comida. Cheguei com a saúde mental prejudicada, prestes a me jogar num abismo sem paraquedas. Com sonhos reduzidos a migalhas de pão, alimentavam apenas pombos famintos que voavam baixo. Não reconhecia mais minha coragem de pássara. Saí de casa perdida. 

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O primeiro ano em SP foi um divisor de águas na minha vida. Aposentei a fantasia de ave por um tempo para vestir a de leoa-mãe. Aprendi a cuidar da cria para depois voltar a cuidar de mim.  Em meio às dificuldades, fui aprendendo lições que não estavam nos livros. Deus me ensinou sobre o amor e a humildade. Moldou a base do vaso para as próximas primaveras e voos. 

No final de 2016 voltei a trabalhar. Senti o mesmo frio na barriga do pássaro saindo do ninho pela primeira vez. O mesmo medo da menina de 17 anos, que estava começando na profissão. Recomecei. Tirei a fantasia de pássara do armário, coloquei acessórios da leoa e fui, com mais vontade do que nunca. 

As ruas de São Paulo foram a minha segunda casa por 3 anos. Dos bairros mais afastados e periféricos, aos gabinetes de autoridades. Dos acidentes de trânsito, sirenes de polícia e bombeiros, incêndios, aos restaurantes de toda sexta-feira. Me lambuzava no prato e nos fatos.

Aprendi a respeitar tantas diferenças de classe, de gênero, a ter compaixão com tantas injustiças que presenciei de perto. 

A rua é uma escola gigante e hostil, mas eu queria ser a sua melhor aluna. Acordava às 4 da manhã para fazer o que nasci para fazer. E assim, a naturalidade com que eu levava a vida e o trabalho, fizeram as coisas acontecerem pra mim. De repente explodi. Por dentro e por fora. Para cada vez mais olhares, bondosos e maldosos. Não seria assim se não estivesse em São Paulo. 

A cidade que me escolheu antes mesmo de conseguir entender o motivo das minhas próprias escolhas. Cada passo aqui me leva hoje para um sonho maior que desisti de tentar prever. São Paulo não acreditou em mim de primeira. Nem de segunda, nem de terceira. Mas eu venci. No cansaço e no talento. Na resiliência e na fé. Tudo que essa cidade exige.

O aniversário dessa terra já passou, mas o meu não. Que nos próximos anos aqui eu continue aprendendo e vestindo mais fantasias de bicho nessa selva. E vivendo como eles. E que vocês sejam testemunhas disso. 

O cenário pode nem ser tão bom assim, mas a felicidade é nossa mente quem cria. São Paulo também ensina isso.

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