29 de janeiro: Dia Nacional da Visibilidade Trans
Data celebra o orgulho, existência e resistência da comunidade transgênero no país
Em 2004, o Brasil instituiu do dia 29 de janeiro como Dia Nacional da Visibilidade Trans. A data foi criada para celebrar o orgulho, existência e também resistência da comunidade transgêreno no país. É ainda um momento para reflexão sobre os direitos, políticas públicas e segurança dessa parcela da população.
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O Dossiê Assassinatos e Violências Contra Travestis e Transexuais Brasileiras feito pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) com apoio de universidades como a Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Federal de São Paulo (Unifesp) e Federal de Minas Gerais (UFMG) aponta que no ano passado, foram registrados 140 assassinatos de pessoas trans no Brasil. Deste total, 135 tiveram como vítimas travestis e mulheres transexuais e cinco vitimaram homens trans e pessoas transmasculinas.
Apesar do número menor do que em 2020, quando foram registrados 175 assassinatos de pessoas trans, o Brasil continua sendo o país onde mais pessoas trans são assassinadas em todo o mundo. São Paulo foi o estado com mais homicídios (25), seguido por Bahia (13), Rio de Janeiro (12), além do Ceará e Pernambuco (11). Também houve dois casos de assassinatos de brasileiras trans em outros países, um na França e outro em Portugal.
Mesmo com todos os esforços, os dados coletados não permitem traçar perfis completos das vítimas. Dos assassinatos com informações sobre a idade - 100 casos -, 53% tinham entre 18 e 29 anos; 28% entre 30 e 39 anos; 10% entre 40 e 49 anos; 5% entre 13 e 17 anos e 3% entre 50 e 59 anos. Quanto à raça, 81% das vítimas se identificavam como pretas ou pardas, enquanto 19% eram brancas.
Profissionais do sexo são as principais vítimas - 78% das pessoas mortas identificadas no estudo. Segundo a Antra, esse perfil majoritário das vítimas revela que elas são "empurradas para a prostituição compulsoriamente pela falta de oportunidades, onde muitas se encontram em alta vulnerabilidade social e expostas aos maiores índices de violência, a toda a sorte de agressões físicas e psicológicas", aponta a pesquisa.
Outra constatação é que pessoas trans estão entre as mais impactadas pela pandemia de covid-19. Esse grupo enfrenta muitas dificuldades acesso a auxílios governamentais e para conseguir emprego. No Dia da Visibilidade Trans, a CUT (Central Única dos Trabalhadores) informou o ingresso da entidade no projeto PRIDE "Promovendo Direitos, Diversidade e Igualdade no mundo do Trabalho", uma parceria com a OIT. A Organização Mundial do Trabalho (OIT) define como direito ao trabalho decente aquele "adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, capaz de garantir uma vida digna".
Transfobia
O estudo da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) aponta ainda para a falta de ações dos governos no combate à violência contra trans. No Brasil, a transfobia é um crime de racismo.
Para Bruna Benevides, coordenadora do dossiê, "quaisquer atitudes inferiorizantes, degradantes ou humilhantes que pode ou não incluir agressões físicas, verbais, simbólicas, materiais, patrimoniais e/ou psicológicas manifestadas com o intuito de violar direitos, negar acesso ou dificultar a cidadania, coibir a livre expressão de gênero, assim como a de negar o reconhecimento da autodeclaração de gênero de travestis, transexuais e demais pessoas trans, quando sua identidade de gênero for um fator determinante para essas violências ou violações, seja por ação direta ou por omissão", são considerados comportamentos transfóbicos.
Suporte
De acordo com o levantamento, em 2021, foram registrados 12 casos de suicídio, sendo 2 casos entre homens trans/transmaculinos e 10 travestis/mulheres trans. O número pequeno é reflexo da subnotificação. Muitas vezes as famílias não respeitam a identidade de gênero e as mortes de pessoas trans por suicído não são informadas corretamente.
O processo de exclusão social, a marginalização, discriminação e estigmatização que se concretiza no dia a dia, como as tentativas de homicídio e a violação de direitos humanos, muitas vezes, leva ao suicídio, aponta o estudo da Antra. Por isso, é cada vez mais importante promover o suporte emocional às pessoas trans.
O psicólogo Rafael Frantz explica que "normalmente pessoas trans se encontram em lugares de vulnerabilidade social, dentre outros espaços, que acabam por comprometer a saúde, não só fisica mas psíquica também. O primeiro suporte emocional, que teoricamente viria da familia, muitas vezes acaba sendo negado, o que afeta diretamente a saúde mental desses individuos. O que atualmente acontece, é a existencia de alguns espaços, ainda pouco difundidos, que fazem o acolhimento, de forma não julgativa, inclusiva, o que acarreta em um conforto mínimo, possibilitando uma melhora na saúde integral dessas pessoas", explica.
Rafael Frantz ressalta, ainda, a "necessidade de cada vez mais os indivíduos se permitirem ter um olhar diferenciado para si, primeiramente, estendido ao outro, ratificando o respeito pelas individualidades e ainda um maior espaço de fala aos ainda invisíveis sociais, enaltecendo aquelas pessoas que já conquistaram seu espaço, com muita resiliência, determinação, e resistência, pessoas essas que já configuram lugares no meio politico, artistas, escritores, sobreviventes até aqui", afirma.
Recomendações
O dossiê traz várias recomendações o poder público para enfrentar o cenário de violência contra a população trans. Entre elas, sugere a promoção de mutirões em órgãos de assistência social para emissão de documentos e inclusão em programas para população LGBTQIA+ e também defende o reconhecimento pelos órgãos estatais da autodeclaração de gênero, o que inclui a acolhida nos abrigos públicos.
Outra recomendação é criar condições para que a população trans consiga enfrentar a fome, como a distribuição de alimentos e itens de higiene e de proteção contra a covid-19. Em relação à segurança pública, o dossiê indica a criação de protocolos policiais para combater a violência contra a população LGBTQIA+, a formação e sensibilização dos agentes e a sistematização dos dados sobre assassinatos e violências.